Um vídeo que circulou pela internet na semana passada mostra o presidente americano, Donald Trump, sendo preso por agentes do FBI, em uma cena digna de Hollywood, com a versão de Matt Monro para “From Russia With Love” como trilha sonora. Representando a vontade de muitos americanos em ver o presidente afastado, as imagens não passam de uma montagem sobre cenas da série “Demolidor”. A brincadeira está longe de se tornar realidade, mas a prisão de Paul Manafort, ex-chefe de campanha de Trump, e a delação de George Papadopoulos, membro do time de assessores do presidente, mostram que o cerco começa a se fechar.

Responsável pela campanha de Trump entre junho e agosto de 2016, Manafort é acusado de conspiração contra os Estados Unidos, lavagem de dinheiro e outros 10 crimes. Ele teria defendido os interesses do então presidente ucraniano Viktor Yanukovych, aliado da Rússia, e feito lobby com congressistas americanos contra sanções à Ucrânia. Seu sócio, Rick Gates, teria ajudado Manafort a esconder dinheiro em contas espalhadas pelo mundo. Todas as acusações não têm ligação com Trump, e ambos alegam inocência.

FBI fecha o cerco
LOBISTA Manafort é acusado de agir de acordo com os interesses do então presidente da Ucrânica, aliado da Rússia (Crédito:CHIP SOMODEVILLA)

INVESTIGAÇÃO EM CURSO

Os indiciamentos são os primeiros resultados concretos de uma investigação independente criada para apurar as denúncias contra a campanha de Trump. O promotor Robert Mueller, diretor do FBI entre 2001 e 2013, está à frente da investigação. Mesmo sem respingar diretamente no presidente, as ações contra Manafort e Gates deixam o cenário tenso. A história ficou ainda mais complicada. Documentos divulgados na segunda-feira (20) revelam que George Papadopoulos, ex-assessor do presidente, declarou-se culpado de ter dado um falso testemunho para o FBI. Ele mentiu sobre a duração e a natureza de suas interações com “certos estrangeiros”, pessoas próximas a dirigentes russos.

Donald Trump recorreu a sua conta no Twitter para criticar o indiciamento de Manafort. “Desculpe, mas isso aconteceu há anos, antes de Manafort fazer parte da campanha de Trump”, escreveu ele. O presidente americano ainda zombou da delação de Papadopoulos. “Poucas pessoas conheciam o jovem voluntário de baixo escalão conhecido como George, que já havia provado ser um mentiroso”. Para Trump, todas as notícias sobre sua relação com a Rússia são uma conspiração dos democratas, uma “caça às bruxas”, como escreveu. Por enquanto, a investigação é apenas um incômodo a Trump. “Casos como o de Manafort dependem muito mais do clima político para se converterem em processo de impeachment”, afirma Cristina Pecequilo, professora de Relações Internacionais da Universidade Federal de São Paulo.

Embora esteja longe de acontecer, a saída de Trump da Casa Branca poderia ser benéfica para os EUA. Durante sua campanha, o empresário criticou a taxa de crescimento da economia durante o governo de Barack Obama. Uma projeção divulgada pelo Banco Mundial indica que o crescimento americano pode ser ainda menor com Trump. O plano de corte de impostos proposto pelo presidente poderia ser benéfico a longo prazo, mas suas decisões controversas, como a vontade de tirar o país do Nafta, o acordo de livre-comércio entre EUA, Canadá e México, dariam início a uma série de retaliações que seriam prejudiciais à economia. “Existe uma expectativa de que uma eventual saída de Trump poderia ser benéfica devido a sua política unilateral e agressiva”, diz Cristina.

Ódio e xenofobia

FBI fecha o cerco
VÍTIMAS Atentado em Nova York alimenta o radicalismo de Trump contra imigrantes (Crédito:BRENDAN MCDERMID)

Na terça-feira 31, um ataque deixou oito mortos e 11 feridos em Manhattan, Nova York. Um homem, identificado como Sayfullo Saipov, de 29 anos, usou uma van alugada para atropelar ciclistas. Após atingir um ônibus escolar, ele desceu do veículo e foi baleado por policiais. Até o fechamento desta edição, estava internado no hospital, em estado crítico. Natural do Uzbequistão, Saipov chegou aos Estados Unidos em 2010 e tinha visto de permanência. Policiais que participaram de sua captura afirmam que ele gritou “Deus é grande”, em árabe, ao sair correndo do furgão.

Imediatamente após o ataque, o prefeito de Nova York, Bill de Blasio, afirmou que as autoridades tratavam o caso como um “ato de terror”. Investigadores disseram ter encontrado notas em árabe que sugerem ligação do autor do ataque com o Estado Islâmico. O grupo extremista pode também ter apenas servido como inspiração. O governador Andrew M. Cuomo afirmou que a ação foi um caso isolado e não sugere um esquema maior. Ainda não se sabe a motivação de Saipov.

O fato de Saipov ser uzbeque e ter uma suposta conexão com o Estado Islâmico alimentou a xenofobia do presidente americano. No Twitter, Trump defendeu um processo de imigração “baseada em mérito”, e afirmou que pretende acabar com a loteria do Green Card, que fornece vistos aleatoriamente para pessoas espalhadas pelo mundo, todos os anos. “Temos que ser mais duros”, escreveu. Na quarta-feira 1º, o presidente conversou com jornalistas e disse que considera enviar Saipov a Guantánamo. O uzbeque seria o primeiro homem capturado em solo americano a ser enviado à prisão.