21/07/2024 - 7:01
Antes dos 10 anos de idade, o hoje universitário Antônio Moraes já vendia balas na escola. Na adolescência, aprendeu a programar e, por hobby, passou a personalizar blogs. Na pandemia, desenvolveu um aplicativo que o ajudou a perder 20 quilos em seis meses. Hoje, no terceiro ano de Ciência da Computação, o jovem de 24 anos transformou suas ideias em negócio e já tem o apoio da Microsoft para escalar a plataforma de venda de ingressos para eventos que criou com a ajuda dos ensinamentos aprendidos no Instituto de Tecnologia e Liderança (Inteli), faculdade idealizada por André Esteves e Roberto Sallouti, sócios do BTG.
A startup Qual é Boa, com 3 mil usuários, é um dos primeiros “filhotes” do Inteli, iniciativa criada em 2019 pelos banqueiros para ajudar a diminuir a carência de profissionais de tecnologia no País. A primeira turma, de 2022 com 155 alunos, se forma no fim do próximo ano e, além de empreendedores como Moraes, levará ao mercado jovens líderes às principais empresas do País. Cerca de 230 alunos já estão em estágios em companhias como Uber, Amazon, Ifood e o próprio BTG.
A faculdade foi concebida a partir de uma doação de R$ 200 milhões da família Esteves, com a ambição de criar um time de ponta na intersecção entre tecnologia e negócios, uma espécie de “MIT brasileiro”.
“Nossa meta é sermos reconhecidos como uma das melhores faculdades de computação da América Latina”, diz o presidente do BTG, Roberto Sallouti. Mensalmente, Sallouti participa de apresentação do projeto para empresários, executivos e interessados em conhecer e “adotar” um aluno em sua jornada.
A ideia da faculdade veio da constatação de uma carência de profissionais qualificados em tecnologia no Brasil a partir das interações dos executivos do BTG com empresários. Dos 8 milhões de alunos matriculados no ensino superior, somente 1,8% estão cursando engenharia ou ciência da computação, entre os quais 53% abandonam a graduação no meio do caminho.
Os resultados que começam a ser colhidos vão, aos poucos, deixando claro o que isso significa. No currículo do Inteli, além dos 300 protótipos desenvolvidos pelos alunos com o mercado, já há ao menos três startups criadas e 15 artigos científicos registrados. Mais recentemente, saiu o registro da primeira patente: um projeto desenvolvido pelos alunos reduziu de seis meses para dois meses a implementação de um sistema de gestão (ERP) em médias e pequenas empresas.
Os projetos são o centro de tudo na metodologia de ensino. A cada dez semanas, os alunos estudam um caso em parceria com o mercado. Os do segundo ano de engenharia da computação desenvolveram para a Gerdau, por exemplo, um robô para avaliar estruturas em ambientes confinados. Para a Dell, uma equipe criou um game voltado ao treinamento do novo modelo de negócios.
“Nos projetos que havia feito era apenas eu fazendo tecnologia com outras pessoas. No Inteli, a cada dez semanas eu tenho oportunidade de trabalhar com um grupo de diferente de pessoas e fazer um projeto do início ao fim. Sei como isso é importante no mercado”, afirma Moraes.
Seleção
Para que seja possível fazer isso desde o primeiro ano, o processo de seleção tenta mapear quem já tenha uma “história” de vida para contar, o que inclui honras e méritos obtidos pelo caminho, além de uma abordagem para identificar conquistas de forma relativa, ou seja, não só onde se está isoladamente, mas quanto se caminhou para chegar até ali. A prova seletiva é 90% focada em habilidades relacionadas à área de exatas, com exceção de uma prova de redação.
A relação hoje é de 10 candidatos por vaga. E a régua alta na entrada já dá o tom do peso que haverá na saída. “No Inteli, não é que a gente dá aula de liderar. Eles estão muito acostumados a trabalhar em equipe, fazer pitch, apresentação e montar projetos. Acabam já saindo prontos para liderar, para entrar no mercado jogando, sem precisar de aquecimento”, afirma Maira Habimorad, presidente do Inteli.
O espírito de “entrar jogando” subverteu até a previsão curricular original. A ideia era que as lições de empreendedorismo se desenvolvessem a partir do quarto ano apenas, mas a criação das startups mostra que os alunos não quiseram esperar. Apesar da antecipação, o Inteli ainda prepara um reforço para adensar o lado empreendedor dos alunos, com uma fase de incubação para quem quiser começar o seu próprio negócio ali mesmo.
Já há conversas também com financiadores para participarem da evolução empreendedora dos alunos. Entre os fundos de venture capital (participação empresas) em negociação estão nomes como Y Combinator e ACE. Fora as perspectivas de interação com o BoostLab – o braço de apoio a startups do BTG – e, com grande chance, alguns pitacos de apoio dos próprios sócios do banco. “Eles adoram se envolver”, diz Maira. “Quiseram conhecer recentemente umas startups de lá do Inteli e adoraram o que viram.”
Pós-graduação
O projeto da faculdade começa a amadurecer por outras frentes, não só pelo resultado dos alunos. Com a recente criação do curso Adm Tech, que combina as duas frentes centrais do Inteli (negócios e tecnologia), as opções de graduação subiram para cinco no total: completam a lista Ciência da Computação, Engenharia da Computação, Engenharia de Software e Sistema de Informação.
Até o primeiro trimestre de 2025 deve ser lançada a primeira pós-graduação, de cibersegurança, em parceria com o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), dono do prédio que abriga o Inteli, na Cidade Universitária. O curso terá duração de 15 meses e não exigirá bagagem técnica prévia.
“Estava faltando um curso que falasse de cibersegurança com foco em negócios”, afirma a presidente do Inteli. “Profissionais de tecnologia nos dizem que a mesma dificuldade que se tinha para encontrar programadores há cinco anos é vista hoje para a cibersegurança.”
Segundo ela, o tema é recorrente nos cafés da manhã que Saloutti faz para líderes e o mercado conhecerem o Inteli. Nos encontros, é o próprio presidente do BTG que recebe os convidados logo cedo pela manhã e que conduz o tour pelo prédio após a apresentação. Na visita feita pela reportagem do Broadcast, estavam presentes gestores e a presidente de uma grande empresa de saúde.
Ao final, os participantes são convidados a apoiar o projeto, principalmente por meio de doações para bolsas – o suporte individual ao aluno é de cerca de R$ 119 mil por ano, o que contempla desde a mensalidade até auxílios como transporte, aulas de inglês e computador. Entre os doadores há nomes que como o Instituto MRV, Gerdau e a Fundação Telles, além do próprio BTG. Mais da metade dos alunos são bolsistas, de 95 cidades do Brasil.