Não há registro de convivência artística entre o italiano radicado em São Paulo Alfredo Volpi (1896-1988) e Ione Saldanha (1919-2001), gaúcha de Alegrete que se fixou no Rio de Janeiro. As cores e a representação de elementos arquitetônicos do casario urbano popular do Brasil da primeira metade do século passado aproximam os dois pintores – e isso poderá ser visto na mostra “Alfredo Volpi e Ione Saldanha: O Frescor da Luminosidade”, que a Galeria de Arte Ipanema abre nesta segunda-feira, 24.

Reunindo 66 obras de Volpi e 20 de Ione, de colecionadores particulares do Rio, São Paulo e Minas, a exposição traz reflexões sobre estes e outros pontos de conexão entre os artistas: a economia de meios, a precisão, o pincel leve, a capacidade de imediata comunicação com o espectador, até o método artesanal de preparo dos suportes utilizados.

“Em ambos existe um fundo quase impressionista, uma vibração que fraciona a luz e faz pulsar uma musicalidade ininterrupta”, aponta o texto de apresentação do curador Paulo Venancio Filho. São “dois coloristas francos”, define – os verdes, azuis e laranjas imprimem uma “luminosidade meridional” que resultam numa experiência de “alegria saudável” no panorama da arte brasileira.

Foi Venancio Filho quem propôs o diálogo entre as bandeirinhas e as fachadas de Volpi e também os exemplares de sua fase concreta, com os bambus e ripas que melhor representam a obra tridimensional de Ione.

Ele imagina que não tenha havido contato pessoal entre os dois, mas acha pouco provável que a pintora não tenha acompanhado a trajetória de Volpi, que tinha mais projeção. “As cores são usadas num espaço muito aéreo e aberto. Eles partem de uma experiência comum, mas não houve uma influência direta”, disse o curador ao jornal O Estado de S. Paulo.

Para ele, Volpi inventou a alegria na pintura brasileira, e o mesmo bem-estar é proporcionado pela poética de Ione. “O arquiteto português Álvaro Siza, autor do projeto da Fundação Iberê Camargo, me disse uma vez que o Brasil tinha introduzido a alegria na arquitetura moderna. Com o Volpi me vem a mesma ideia”, comparou o curador, estendendo a análise à pintora.

A data da exposição remete aos 30 anos de morte de Volpi e aos 15 desde sua última individual realizada pela galeria, e se aproveita do movimento esperado na cidade em decorrência da ArtRio – a feira começa no próximo dia 27, na Marina da Glória. As obras são dos anos 1950, 1960 e 1970; parte está à venda, por valores que vão de R$ 250 mil a R$ 4 milhões, no caso de Volpi. As de Ione ficam em torno de R$ 150 mil.

Volpi está no código genético da Galeria de Arte Ipanema, aberta em 1965, no Hotel Copacabana Palace, e considerada a mais antiga do Brasil ainda em atividade. Aos 24 anos, o então estudante de Engenharia e já operador do mercado financeiro Luiz Sève tinha uma tia interessada em arte que o ajudou a estruturá-la.

A primeira obra adquirida pelo jovem foi uma Madona do pintor. A relação se estreitou com os anos, a galeria passou a representá-lo e Sève transformou-se num fornecedor de tintas e de queijo pecorino comprado em Paris, além de um colecionador privilegiado (hoje, tem 30 Volpis, dos quais 22 estarão na mostra).

“Ele era uma figura apaixonante, muito simples, apesar de sofisticado. Uma criança grande, um coração que não se pode imaginar”, contou Sève. Ione também seria representada pela galeria. A casa, na esteira das comemorações de seus 50 anos ininterruptos de trabalho, abriu sede nova num imóvel moderno na Rua Aníbal de Mendonça, na quadra da praia de Ipanema, no ano passado. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.