A volta do protagonismo dos militares ao primeiro plano da política nacional se caracteriza não só pela provável presença de Jair Bolsonaro (PSL) no segundo turno da eleição presidencial e de outras 113 candidaturas de membros das Forças Armadas a deputado, senador e governador. Ela também se manifesta por meio de declarações de generais que reafirmaram, segundo seu ponto de vista, a disposição de manter “a lei e a ordem no País”.

Nesse cenário, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, desponta como a garantia do Alto-Comando do Exército contra ameaças de ruptura. Esse não é um tema fácil para os oficiais – a maioria dos ouvidos pelo Estado não quis se identificar. O papel de Toffoli no segundo turno, no qual devem se enfrentar Bolsonaro e Fernando Haddad (PT), é considerado fundamental para o equilíbrio do pleito.

O ministro deu aos militares três “sinais importantes”. Um integrante do Alto-Comando os enumerou: a decisão de não pôr em votação a prisão em segunda instância, o veto à entrevista de Luiz Inácio Lula da Silva, preso e condenado pela Lava Jato, e o pronunciamento na Faculdade de Direito do Largo São Francisco, em São Paulo.

Toffoli disse, na segunda-feira (1), que não chamava a derrubada do governo João Goulart, em 1964, nem de golpe nem de revolução, mas de movimento. E expôs a opinião de que, há 54 anos, tanto a esquerda quanto a direita contribuíram para a radicalização e a quebra da ordem institucional. No mesmo dia, proibiu que Lula fosse entrevistado e, na Quinta-feira (4), discursou de novo: “Nunca mais fascismo; nunca mais comunismo”.

Antes de assumir o STF, Toffoli tomou a iniciativa de encontrar o comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas. Pediu que lhe indicasse um nome para sua assessoria. Villas Bôas assentiu, e o ministro levou para o tribunal o general Fernando Azevedo e Silva, ex-chefe do Estado-Maior.

“No Alto-Comando, não temos ideia de quebra do estado democrático de direito. Por que o ministro Toffoli solicitou ao Villas Bôas que indicasse um general de Exército? Tem aí várias respostas a essa pergunta”, disse um comandante.

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Temor

Se há um mês oficiais temiam eventuais manobras para a soltura de Lula ou que visassem a acabar com a Lei de Anistia – o que seria interpretado como quebra do respeito à lei e à ordem -, o quadro mudou com as ações de Toffoli. A situação era diferente em abril, quando, na véspera do julgamento do habeas corpus de Lula no STF, Villas Bôas se manifestou em “repúdio à impunidade”.

Hoje, a preocupação não é apenas com o “processo tapetão” para livrar Lula. Com Bolsonaro e mais de uma centena de candidatos militares, os generais dizem que os comandantes devem estar atentos para não deixar a política entrar nos quartéis.

De 1945 a 1960, o País sempre teve candidatos militares à Presidência. Desde 1989, houve só um oficial: o brigadeiro Ivan Frota, em 1998. Para os generais, não é possível “ideologizar” as Forças Armadas. Eles lembram a defesa do PT de mudanças nas promoções e nos currículos militares. “Não há risco de Bolsonaro interferir nas promoções”, disse o general Roberto Peternelli Junior, candidato a deputado federal.

Outro temor nas Forças Armadas é de que haja algum tipo de radicalização após a eleição. Embora os generais afirmem que trabalham com o cenário de pacificação do País, possíveis reações a uma vitória de Bolsonaro preocupam. “Até o Bolsonaro, que fez aquela declaração infeliz (dizendo que não reconheceria o resultado da eleição se perdesse), voltou atrás. Não há nada a fazer se ele perder. Eu conheço essa peça (Bolsonaro) desde a escola preparatória”, afirmou um general.

Durante o ano, o apoio ao candidato do PSL se consolidou nas Forças Armadas – generais que tinham dúvidas sobre ele agora o apoiam. As resistências eram antigas, desde a época em que o capitão foi acusado de planejar atentados. Eleito deputado, chegou a ser proibido de entrar em quartéis.

Gradativamente, ele venceu as resistências. Diz o general Alberto Cardoso, ex-ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional do governo Fernando Henrique Cardoso: “O sucesso dele surgiu pela formação, pelo que encarna, uma esperança que surge com a desesperança com o político tradicional”.

Hoje, quatro integrantes do Alto-Comando são colegas de turma do capitão na Academia das Agulhas Negras. Oito dos 15 integrantes passaram pelo Comando de Operações Especiais. Formam uma confraria.

“Aqui o que mais se ouve é Aço e Selva”, contou outro general, referindo-se às saudações à tropa de origem operacional da maioria do Alto-Comando. “Não há a menor chance de ruptura. Quem espalha isso quer desagregar. Bolsonaro não é radical. Ele é um democrata”, disse o general da reserva Augusto Heleno Ribeiro.

Comandantes procuraram candidatos

Para incluir assuntos de defesa na pauta das discussões das eleições, os comandantes do Exército e da Marinha abriram suas agendas para receber os candidatos ao Planalto e apresentar os projetos estratégicos das Forças e a necessidade de recursos para mantê-las em funcionamento. A Aeronáutica não se reuniu com os candidatos, mas deve convidar os dois que forem ao segundo turno.


O pioneiro nesta iniciativa foi o general Eduardo Villas Bôas, comandante do Exército, que recebeu os principais candidatos em seu gabinete, em Brasília, ou falou com eles em viagens a São Paulo, como no caso de Ciro Gomes (PDT) e Geraldo Alckmin (PSDB). Na conversa com todos, o general ofereceu assessoria para temas militares.

Alckmin chamou para sua campanha o general da reserva João Camilo Pires de Campos, e Alvaro Dias (Podemos), o general da reserva Adriano Pereira Júnior. Ciro levou para seu staff o general Décio Brasil, seu primo, que pediu para ser dispensado após o pedetista atacar Villas Bôas.

Nem Marina Silva (Rede) nem Fernando Haddad (PT) foram assessorados. No caso de Jair Bolsonaro (PSL), quatro generais fazem esse papel: Hamilton Mourão, Augusto Heleno Ribeiro, Oswaldo Ferreira e Ribeiro Souto.

O comandante da Marinha, almirante Eduardo Bacelar Leal Ferreira, recebeu Henrique Meirelles (MDB), Álvaro Dias e, do PT, a senadora Gleisi Hoffman. Leal Ferreira delegou ao chefe do Estado Maior da Armada, almirante Ilques Barbosa Junior, a missão de receber Marina e de visitar Bolsonaro no hospital. Para todos foram entregues dois documentos sobre a Marinha. / T.M.

5 perguntas para o Ministro da Defesa Gal. Joaquim Silva e Luna

1. O protagonismo dos militares nas eleições é em razão de Jair Bolsonaro?

O protagonismo dos militares tem a ver, sim, com o fato de um dos candidatos bem posicionados, o deputado Jair Bolsonaro, ser oriundo das Forças Armadas e defender valores fundamentais para os militares como ética, moral, honestidade, respeito às pessoas, às leis e à família. Também tem a ver com o fato de as pesquisas de opinião mostrarem que as Forças Armadas têm alto grau de confiabilidade. Há um grande número de militares disputando as eleições. Vale lembrar que o comandante supremo das Forças Armadas é o presidente da República, eleito democraticamente pelo povo, não importando seu partido ou origem.

2. Há manifestações de preocupações com a possibilidade de ruptura institucional. Há esta possibilidade?

Não existe a menor chance de haver ruptura institucional. Até porque, uma das missões que a Constituição atribui às Forças Armadas é a garantia às instituições.

3. Bolsonaro ameaça a democracia ou significa a volta do governo militar?

Não existe isso. Jamais. Bolsonaro é um político. Está na sua sétima legislatura. Toda a sua atuação é política e continuará sendo.

4. Os militares da ativa das Forças Armadas em um eventual governo Bolsonaro poderão ter uma participação direta no governo?


Também não. As Forças Armadas têm suas atribuições definidas na Constituição. O convite a uma participação de militares no governo é uma escolha do presidente da República e dependerá da aceitação do convidado. Ele terá de preencher os requisitos legais para o cargo. E mais: ele teria de deixar o serviço ativo e ir para a reserva.

5. Em uma eleição tão polarizada há preocupação de que a política possa voltar a entrar nos quartéis?

Os futuros comandantes das três Forças terão de estar atentos para que se mantenham as linhas de hoje, de serem instituições apolíticas, que funcionem como instituição de Estado. É preciso manter a política fora dos quartéis. A Constituição é o nosso farol. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.


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