O diagnóstico de superdotação profunda de Lulu, de 4 anos de idade, revelado por seus pais, Maju Mendonça e Arthur Luis Cardoso, há menos de uma semana, não foi uma surpresa para boa parte dos seguidores da pequena influenciadora digital. Isso porque a garotinha faz o maior sucesso nas redes sociais há mais de dois anos por sua desenvoltura em frente às telas.

Cheia de pose e com trejeitos de uma pessoa adulta, a menina arranca gargalhadas de quem assiste aos seus vídeos “vendendo” produtos super inflacionados ao paizinho – como ela chama o radialista carinhosamente – ou “fazendo” as unhas da mamãe no seu salão de beleza imaginário.

Tamanho desembaraço nos diálogos que sustenta com a família, ou até mesmo com o porteiro do prédio onde mora, em Brasília (DF), a menina levanta a curiosidade dos seguidores, que ficam impressionados com as expressões que ela solta espontaneamente (como “versátil”, “abdômen” e “esteticista”), frases de efeito que ela repete com facilidade e piadas que ela dispara no momento ideal da brincadeira.

Embora muita gente tenha suspeitado desde o início de que Lulu é uma criança com facilidade de aprendizado, a condição de superdotação não é simples de ser avaliada, muito menos diagnosticada.

Em entrevista exclusiva ao site IstoÉ Gente, os pais de Lulu e a médica que cravou o diagnóstico explicaram em detalhes como e quando a família buscou por conhecimento, e destacaram a importância de analisar as crianças em todas as fases da vida.

Superdotação: pais de Lulu, fenômeno na internet, explicam importância de diagnóstico
Reprodução/Instagram

Diagnóstico

Arthur contou quando foi o momento em que ele e a esposa perceberam que Lulu era diferente. “Foi quando ela, ainda pequena, começou a fazer perguntas e comentários que mostravam uma grande memória e um raciocínio elaborado”, inicia.

“Além disso, ela tinha uma capacidade impressionante de comunicação e se interessava muito por se expressar e interagir com outras pessoas de uma forma não típica para crianças de sua idade. A partir daí, começamos a pesquisar mais a fundo e buscar orientação profissional”, completa a jornalista.

O pai da garotinha destacou ainda que a ajuda profissional veio quando Lulu atingiu a idade de começar a frequentar a escola.

“Queríamos entender qual seria a melhor forma de educá-la, então entramos em contato com especialistas em desenvolvimento infantil para ter uma avaliação mais completa. Foi um processo gradual, que envolveu observação e testes, até que recebemos o laudo confirmando a superdotação profunda”, frisa.

“Ela já estuda e estamos sempre atentos para entender qual é a melhor abordagem para a educação dela. É um tema delicado, pois queremos que ela tenha um ambiente que estimule seu desenvolvimento, mas que também respeite o seu tempo e espaço como criança”, pondera Maju, citando que Lulu conta com o acompanhamento de uma equipe multidisciplinar para ajudá-la, que inclui pedagoga, psicopedagoga, preparadora física, aulas de inglês e, recentemente, Libras.

“Tudo isso é feito respeitando a condição cognitiva e intelectual dela, lembrando que ela é uma criança de apenas 4 anos”, reitera Arthur.

A Lulu sabe da condição dela?

Ao ser questionada sobre a pequena ter conhecimento do seu diagnóstico, Maju afirma que sim e revela a forma como a notícia foi dada a ela.

“Já conversamos com ela de forma lúdica e respeitosa. Explicamos que ela tem uma facilidade especial para aprender e pensar, mas que isso não a torna melhor do que ninguém, e também que isso traz algumas responsabilidades e desafios”, destaca.

“Imaginamos que ela ainda não entenda tudo completamente, mas percebemos que ela encara com naturalidade e até faz perguntas que mostram que ela já percebe essa diferença. Nós estamos sempre por perto para garantir que ela se sinta confortável e saiba que, independentemente de qualquer diagnóstico, o mais importante é ser feliz e curiosa”, complementa.

Sucesso na web

A jornalista contou que compartilhar os vídeos de Lulu nas redes sociais aconteceu de forma despretensiosa: “Começamos de maneira muito orgânica. Era apenas um jeito de registrar os momentos dela crescendo e compartilhá-los com amigos e familiares. Só mais tarde vimos que aquilo estava cativando muita gente. A naturalidade da Lulu é o que mais conquistou as pessoas”.

Um dos vídeos que mais “bombou” nas redes sociais é o que ela diz que não pode deixar o pai “lindo” porque não faz milagre. Sobre isso, Maju reconhece que a filha captou com maestria a expressão que ela costuma usar em momentos descontraídos.

“Eu uso muitas vezes. Nós ficamos muito espantados não só pelo fato de ela ter guardado a expressão, mas também por ter utilizado no contexto certo, de uma maneira tão natural. Isso realmente impressiona e mostrou como ela consegue captar e reproduzir o que escuta de um jeito muito próprio e assertivo”, afirma.

Lulu também mandou um recado aos fãs durante a entrevista: “Obrigada por gostarem de mim. Continuem assistindo aos vídeos e brincando junto”.

Superdotação: pais de Lulu, fenômeno na internet, explicam importância de diagnóstico
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O que é superdotação profunda?

Segundo a *Dra. Olzeni Ribeiro, médica de Lulu, a superdotação é uma neurodivergência e uma condição do neurodesenvolvimento, e não um transtorno ou patologia, além de ser um fator genético e hereditário. No vídeo em que revelam o diagnóstico da menina, os pais ressaltam exatamente isso – que Arthur tinha comportamentos parecidos quando era da idade dela.

Apesar disso, mesmo existindo um conjunto de características que são comuns à condição, todo superdotado é único em seu desenvolvimento.

Por esta razão, se trata de um “espectro”, esse termo não é usado somente no autismo, como muitos pensam erroneamente.

Quais os níveis de superdotação?

É possível ter superdotação leve, moderada ou profunda. Entretanto, de acordo com a médica, para que o diagnóstico seja feito de forma correta, é necessário prestar atenção nos seguintes fatores:

  • Intensidade emocional: “Lulu é muito sensível no aspecto emocional, também por ser impactado por seu perfil sensorial”;
  • assincronias no desenvolvimento: “ela tem idade desenvolvimental que extrapola 7 anos e 11 meses, os marcos de desenvolvimento” (emocional, social, motor, cognitivo e intelectual são assíncronos, ou seja, desiguais, não se desenvolvem em harmonia como em crianças não superdotadas – esta é uma característica inerente à condição);
  • capacidade cognitiva (esta é medida pelos testes de inteligência), nos quais ela obteve índices altíssimos: QI Total 147 e percentil 99%;
  • capacidade intelectual: “esta é observada na notável capacidade de Lulu se expressar verbalmente, improvisar criando textos fluentes com coerência e coesão, compreender a realidade com níveis de maturidade excepcionais, fazer abstrações com extrema coerência e agilidade de pensamento, capacidade extraordinária de raciocínio, entre outras características dela”;
  • marcos de desenvolvimento muito superiores a crianças da mesma idade cronológica: “no IDADI (Inventário Dimensional de Avaliação do Desenvolvimento Infantil), ela obteve, no domínio Cognitivo e Socioemocional, escores 139.6 e 134.1, respectivamente, classificados como muito acima do esperado, sobretudo no socioemocional, que requer níveis de maturidade significativos, já que este domínio mostra a capacidade de a criança compreender sentimentos e emoções nela e nos outros e inclui habilidades, já muito desenvolvidas na Lulu, para apego; empatia; regulação emocional; regulação do comportamento; capacidade de estabelecer e manter relacionamentos sociais”.

Quais os sinais de superdotação profunda?

Olzeni destaca que os sinais são, principalmente, na alta capacidade de entender grandes volumes de informações concretas e abstratas, além de dar um contexto muito rico a qualquer experiência, sentimento, pensamento, relacionamento, ideia ou objeto:

“Lulu faz isso brilhantemente através da comunicação. São pessoas capazes de ver conexões lógicas complexas entre tipos muito diferentes de informações, e são capazes de organizar esses dados em matrizes maiores que eles próprios constroem mentalmente e que ficam então disponíveis para uso em futuras ações, reflexões, análises e resolução de problemas”.

A profissional aproveitou para negar as especulações de que os pais de Lulu a treinam para que ela tenha essa postura em frente às câmeras.

“Isso é absolutamente impossível – ensinar a uma criança, ainda mais como ela, que já é assim desde muito novinha. Nem o melhor professor do mundo consegue ensinar a uma criança o que Lulu faz e outras que estão por aí surpreendendo por algo que não é passível de ensinar. Isso faz parte dela, é genético, ela nasceu assim, tudo que se vê na Lulu surpreende da maneira como ela faz, exatamente porque ela está sendo ela mesma, tudo vem de quem ela é e não do que alguém, nem os pais, possam ensinar”, reforça.

“Não existe treino para se desenvolver superdotados. Eles se desenvolvem naturalmente (só precisam de um ambiente acolhedor, menos estressante e hostil, que respeite seu funcionamento e que não os rejeitem pelo seu modo de ser), e, os superdotados profundos, dão saltos mentais extraordinários, que, muitas vezes assustam as pessoas que não acreditam que não foram ensinados, mas não foram”, completa.

Superdotação: pais de Lulu, fenômeno na internet, explicam importância de diagnóstico
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Quais as dificuldades da superdotação profunda?

“Desajuste de expectativas na escola, na universidade e na sociedade, muitas vezes até dentro da família. Por terem um nível excepcionalmente alto de proeza intelectual somado a intensidade emocional, eles, geralmente, se escondem, “camuflam” essa capacidade, porque percebem que não são compreendidos, sofrem de isolamento social, problemas nas relações com os pares da mesma faixa etária, já que os interesses e temas de conversa seguem em linhas opostas, sentem-se solitários”, diz Olzeni.

“No Brasil, se identifica o superdotado como se fosse uma padrão único de funcionamento para todos, e este é um dos atrasos danosos perante essas pessoas”, lamenta.

*Dra. Olzeni Ribeiro, PhD em Educação de Superdotados, Especialista em Superdotação, Criatividade e Expertise Neuropsicopedagoga Clínica e Educacional, Registro SBNPp Nº 9932. Experiência na rede pública e particular de ensino, há 46 anos atuando nesta área e na área da Educação.