A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu aceitar nesta quinta-feira, 11, a denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal (MPF) contra o governador afastado do Rio, Wilson Witzel (PSC), na esteira da Operação Tris in Idem. Com o resultado do julgamento, o ex-juiz foi colocado no banco dos réus por corrupção ativa, passiva e lavagem de dinheiro.

Na mesma sessão, os ministros ainda vão decidir sobre a renovação do afastamento do cargo, que se encerra no fim deste mês. O governador também está afastado por determinação do Tribunal Especial Misto que conduz o processo de impeachment.

O julgamento foi aberto com a sustentação oral da subprocuradora-geral da República, Lindôra Araújo, que detalhou novamente a denúncia e as provas colhidas no curso da investigação. “Usaram a pandemia em benefício próprio. Talvez seja a coisa mais terrível nesse momento de calamidade”, criticou.

Na sequência, o advogado do governador afastado, Roberto Podval, voltou a dizer que não há provas das acusações contra Witzel. O defensor afirmou que a denúncia foi subsidiada exclusivamente pela delação premiada do ex-secretário de Saúde, Edmar Santos, cujos anexos não foram integralmente compartilhados com a defesa.

“Eu não posso vir aqui fazer uma defesa do não recebimento de uma denúncia que está baseada em uma delação premiada sem que eu tenha acesso à delação premiada. Isso me parece básico, é uma questão de Justiça, de igualdade entre as partes”, criticou.

O advogado afirmou ainda que o governador afastado saiu da magistratura em busca de um ‘sonho’. “Talvez Witzel possa ter confiado na pessoa errada, talvez possa ter escolhido mal seu secretário, talvez possa ter governo mal o Rio de Janeiro, mas bandido ele não é”, disse.

Os ministros acompanharam, por unanimidade, o voto do relator, Benedito Gonçalves, que considerou que os investigadores reuniram provas suficientes para embasar as acusações e justificar o recebimento da denúncia. “Os elementos, considerados no conjunto, e não isoladamente, constroem um lastro probatório necessário à instauração da ação penal”, observou.

Votam na sessão os ministros Raul Araújo, Paulo Severino, Isabel Gallotti, Marco Aurélio Belizzi, Sérgio Kukina, Joel Paciornik, Francisco Falcão, Nancy Andrighi, Marisa Thereza de Assis Moura, Og Fernandes, Luís Felipe Salomão e Mauro Campbell.

Denúncia

No final de agosto, na ocasião da Operação Tris in Idem, a Procuradoria-Geral da República denunciou o governador afastado Wilson Witzel e mais oito pessoas em razão de pagamentos feitos por empresas ligadas a Mário Peixoto, preso na Lava Jato, e à família do ex-prefeito de Volta Redonda, Gothardo Lopes Netto, ao escritório de advocacia da primeira-dama Helena Witzel. A suspeita é a de que a banca tenha sido usada para lavar propinas pagas em troca do direcionamento de contratações.

O sinal de alerta veio quando Witzel revogou a desqualificação da organização social Instituto Unir Saúde, suspeita de irregularidades em contratos firmados com a Secretaria de Saúde fluminense. O despacho do governador afastado, assinado em março do ano passado, derrubou uma resolução administrativa e permitiu que a OS pudesse voltar a contratar com o Poder Público – embora tivesse sido excluída do rol de prestadoras aptas em razão de irregularidades na prestação de serviços em ocasiões anteriores.

VEJA TODOS DOS DENUNCIADOS:

Wilson Witzel, governado afastado do Rio;

Helena Witzel, advogada e esposa do governador afastado;

Gothardo Lopes Netto, ex-prefeito de Volta Redonda;

Lucas Tristão, ex-secretário de Desenvolvimento Econômico do Rio;

João Marcos Borges Mattos, ex-subsecretário de Educação;

Mário Peixoto, empresário;

Juan Elias Neves de Paula, sócio de Mário Peixoto;

Alessandro Duarte e Cassiano Luiz, apontados como operadores dos pagamentos.

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça decidiu apenas sobre as acusações contra Witzel. O cabimento do recebimento das denúncias contra os demais acusados ainda será analisado. Em uma derrota para a Procuradoria Geral da República, por oito votos a seis, os ministros decidiram desmembrar o caso e processar no STJ somente as acusações ao governador afastado.

Operação Tris in Idem

A ‘Tris in Idem’ é um desdobramento da Operação Placebo, que trouxe à tona as suspeitas de irregularidades no governo do Rio em maio do ano passado. Na ocasião, a Polícia Federal fez buscas em endereços do Executivo fluminense e na antiga casa de Witzel para investigar um possível esquema de corrupção envolvendo a instalação de hospitais de campanha para atender pacientes com covid-19.

No curso das investigações, a Procuradoria-Geral da República chegou a pedir exclusividade na condução das apurações de compras e contratações emergenciais firmadas pela Secretaria Estadual de Saúde do Rio sob argumento de que as provas colhidas ‘claramente colocavam o governador Wilson Witzel no vértice da pirâmide’.

O inquérito ganhou fôlego depois que o ex-secretário estadual de Saúde do Rio, Edmar Santos – preso em uma das operações sobre desvios na Saúde fluminense, a Mercadores do Caos – fechou delação com o Ministério Público Federal. Em seus relatos, citou diferentes integrantes da cúpula do governo fluminense e ainda apontou a existência de contratações em organizações sociais por indicações de parlamentares.

Com o aprofundamento das investigações, a PGR concluiu que as irregularidades não se limitaram aos contratos na área da Saúde. De acordo com a denúncia, havia um esquema de loteamento de contratos e cargos entre três grupos ocultos instalados na máquina pública e coordenados pelo próprio Witzel.

Destino de Witzel

Além da Operação Tris in Idem, Witzel foi denunciado em mais duas investigações do Ministério Público Federal. O andamento das denúncias deve influenciar o processo de impeachment, que pode levar à perda definitiva do mandato.

COM A PALAVRA, A DEFESA DE MÁRIO PEIXOTO

A sessão da Corte Especial do Tribunal de Justiça (STJ), que aceitou a denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o Governador afastado Wilson Witzel em 11/02, deixou clara a enorme separação que existe entre as duas Ações Penais: a APN 976 – que acusa Mário Peixoto e Gothardo Lopes Netto, entre outros, de pagamento de honorários indevidos à Helena Witzel -, e a APN 977 – que apura os esquemas de desvios no âmbito da Secretaria Estadual de Saúde nas compras emergenciais para Covid-19, hospitais de campanha, contratação de OSs para as UPAs e hospitais, e restos a pagar de governos anteriores, que envolvem o Pastor Everaldo, Edson Torres, Edmar Santos, Vitor Hugo e outros.

A Corte Especial decidiu que a APN 976 deve ser remetida para a Justiça Estadual do Rio de Janeiro, pois não envolve desvios de recursos da Saúde, que teriam o interesse da União.

Na análise do relator da Ação Penal, Ministro Benedito Gonçalves, ficou claro que o que existe são indícios mínimos, que permitem aceitação da denúncia, e que, mais à frente, serão analisados os argumentos da defesa.

As provas apresentadas no episódio da requalificação da UNIR foram: notas fiscais, planilhas, recibo de depósito e troca de e-mail entre Alessandro de Araújo Duarte e Juan Elias Neves de Paula. Não havendo nada de irregular, pois, de fato, a contratação existiu, e estes documentos só comprovam isso.

Quanto ao distrato da Quali Clínicas, encontrado na residência de Lucas Tristão, uma cópia do alvará de 2016 rasgado, encontrado na casa de Cassiano Luiza da Silva, além de uma anotação de despesa com o nome COOTRAB, não demonstram qualquer tipo de indício de crime e muito menos comprova qualquer vínculo entre Mário Peixoto e as empresas citadas.

O único momento em que Mário Peixoto é vinculado ao episódio da contratação do escritório de Helena Witzel e a requalificação da UNIR é a escuta de 20/03/2020, na qual Luiz Roberto fala: “Diz o Mario que acertou com o Governador, eu estava comprando isso de outro cara…”.

Ocorre que, em outra escuta, ele diz para Nelson Bornier: “Você tem parte da paternidade pela requalificação…”

Ainda em outra escuta, essa de 01/04/2020, portanto dez dias após a primeira, o mesmo Luiz Roberto afirma: “O cara que eu paguei lá de dentro da Secretaria pela requalificação da UNIR queria me colocar esses dois ai, mas isso é obra do 01 da Saúde e dos Deputados querendo grana.”

Diante do exposto, ficou óbvio que o suposto “Mario”, da primeira escuta, não se trata de “Mário Peixoto”; que a paternidade da requalificação é de Nelson Bornier; e que se houve irregularidade no episódio da requalificação da UNIR, ela foi praticada por um servidor da Saúde com a anuência do próprio Edmar Santos.

Não existe absolutamente nenhuma prova que justifique a tese de que Mário Peixoto seja dono da UNIR, que tenha exercido qualquer papel no episódio da requalificação ou ainda que tenha qualquer envolvimento na contratação do escritório de advocacia de Helena Witzel.

O Ministério Público do Rio de Janeiro já afirmou que Mário Peixoto não é dono da Unir. Mário Peixoto não tem absolutamente nada a ver com os desvios na Saúde no governo do Estado do Rio de Janeiro. O MPF, a PGR e o próprio MPERJ (Operação Filhote de Cuco) já identificaram todos os envolvidos em tais desvios; e eles não acusam Mário Peixoto desses crimes. Cabe ressaltar que a Operação Filhote de Cuco é fruto de uma investigação de 4 anos da GAECO sobre a OS UNIR e nenhuma menção a Mário Peixoto foi feita.

Não existe absolutamente nenhuma prova que justifique a tese de que Mário Peixoto seja dono da UNIR ou que tenha exercido qualquer papel no episódio de sua requalificação.