O país assistiu na última quinta-feira 30 a mais uma jornada de protestos. Pela terceira vez em duas semanas, o Brasil ficou em suspenso para debater as ações e propostas do governo. O clima de conflagração dificulta pautas importantes que deveriam ser viabilizadas. A economia está estagnada, o desemprego é brutal, os investimentos estão em baixa, caminhamos para mais uma década perdida e agendas essenciais para o país como a Reforma da Previdência, a reforma tributária e a desburocratização seguem a duras penas no Congresso. A queda da confiança na retomada econômica foi um componente importante para o baque do Produto Interno Bruto registrado pelo IBGE no primeiro trimestre, de 0,2%. É o primeiro recuo trimestral da economia desde 2016.

Em meio ao cenário desalentador, na quinta passada, na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, a Força Nacional foi chamada para cobrir o Ministério da Educação após pedido do titular da pasta, Abraham Weintraub, que temia depredações e acusava professores de coagirem alunos. Foi a segunda manifestação – e em dimensão menor – contra os cortes na educação, convocada em todo o país por entidades estudantis e sindicatos de professores. O ato teve a participação de centrais sindicais contrárias à Reforma da Previdência, como a Central Única dos Trabalhadores (CUT), apesar de a União Nacional dos Estudantes (UNE) e a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES) terem declarado que ele não foi contrário ou favorável ao governo, mas em defesa do ensino

PRÓ-BOLSONARO Em resposta ao primeiro protesto contra os cortes na educação, manifestantes a favor do governo saíram às ruas no domingo 26. Bandeiras contra o Congresso e o STF viraram propostas propositivas em defesa das reformas (Crédito:Fabio Rodrigues Pozzebom)

As manifestações são insufladas pelo governo, de alguma forma, pelo apoio de sua claque — como aconteceu no último domingo 26 —, ou por ameaçar — implicitamente ou abertamente — áreas essenciais para o país, como a educação. No dia 15, o primeiro protesto contra os cortes na educação foi turbinado após declarações desastradas do titular da pasta, que criticou universidades federais e não soube explicar a motivação da redução das verbas federais – justificada depois como contingenciamento. Não houve interlocução e nem negociação para justificar a diminuição de recursos para todas as etapas de ensino, da educação infantil à pós-graduação. Logo depois, teve que voltar atrás em parte dos cortes.

Tentação populista

Apoiar-se nas ruas para driblar dificuldades inerentes ao exercício do poder é uma velha tentação populista. Não causa surpresa, mas espanta que se recorra a essa estratégia em menos de cinco meses de gestão. Foi o que aconteceu no domingo 26. Em dificuldades no Congresso e sem vocação para articular projetos prioritários, o governo e seus apoiadores, incluindo as milícias virtuais, reagiram com manifestações pró-governo. Foi com a ajuda de governistas de bom senso e do núcleo não ideológico do governo que se evitaram as palavras de ordem para a defesa de reformas, e não para atacar o Congresso ou o Supremo Tribunal Federal (STF) – temas que atraem o bolsonarismo radical. Na última semana, a massa a favor de Bolsonaro recuou das bandeiras autoritárias. Mas como será quando o governo estiver com a popularidade ainda mais fragilizada, a retomada econômica não se viabilizar ou escândalos incontornáveis atingirem o entorno presidencial?

As repetidas ameaças de paralisação de caminhoneiros, categoria que na última greve teve o apoio explícito de Bolsonaro, apontam novos riscos no horizonte. Há outros. O governo não está cumprindo seu papel de promover a conciliação e o diálogo. Para enfrentar a ruína econômica, equacionar o déficit público, atrair investidores e apostar realmente em educação — o verdadeiro motor do desenvolvimento —, o momento é de articulação, de angariar apoios e construir consensos. O clima plebiscitário permanente, ao contrário, afasta aliados e é contraproducente.

Governo não está cumprindo seu papel de promover a conciliação e o diálogo. Momento é de articulação e de angariar apoios

Viabilizar um plano de governo significa enfrentar o contraditório e se submeter ao sistema de pesos e contrapesos da democracia. Mais que isso, representa ampliar o arco de alianças e arbitrar interesses conflitantes. Porém, o governo tem sido inepto – ou muitas vezes hostil — às tentativas de negociação com o Congresso e ao diálogo com os partidos favoráveis a uma agenda reformista. Atacar desafetos e minorias e investir na instabilidade como regra é uma atitude antidemocrática — após as manifestações do dia 15, o presidente respondeu aos protestos chamando os estudantes de “idiotas úteis” e “massa de manobra”. O dissenso só pode ser vencido com argumentos e a razão. A população que anseia a diminuição do desemprego não pode ficar refém de uma guerra panfletária de versões para se descobrir qual manifestação foi maior ou quem consegue fazer mais barulho nas redes sociais.