31/05/2019 - 9:30
O país assistiu na última quinta-feira 30 a mais uma jornada de protestos. Pela terceira vez em duas semanas, o Brasil ficou em suspenso para debater as ações e propostas do governo. O clima de conflagração dificulta pautas importantes que deveriam ser viabilizadas. A economia está estagnada, o desemprego é brutal, os investimentos estão em baixa, caminhamos para mais uma década perdida e agendas essenciais para o país como a Reforma da Previdência, a reforma tributária e a desburocratização seguem a duras penas no Congresso. A queda da confiança na retomada econômica foi um componente importante para o baque do Produto Interno Bruto registrado pelo IBGE no primeiro trimestre, de 0,2%. É o primeiro recuo trimestral da economia desde 2016.
Em meio ao cenário desalentador, na quinta passada, na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, a Força Nacional foi chamada para cobrir o Ministério da Educação após pedido do titular da pasta, Abraham Weintraub, que temia depredações e acusava professores de coagirem alunos. Foi a segunda manifestação – e em dimensão menor – contra os cortes na educação, convocada em todo o país por entidades estudantis e sindicatos de professores. O ato teve a participação de centrais sindicais contrárias à Reforma da Previdência, como a Central Única dos Trabalhadores (CUT), apesar de a União Nacional dos Estudantes (UNE) e a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES) terem declarado que ele não foi contrário ou favorável ao governo, mas em defesa do ensino
As manifestações são insufladas pelo governo, de alguma forma, pelo apoio de sua claque — como aconteceu no último domingo 26 —, ou por ameaçar — implicitamente ou abertamente — áreas essenciais para o país, como a educação. No dia 15, o primeiro protesto contra os cortes na educação foi turbinado após declarações desastradas do titular da pasta, que criticou universidades federais e não soube explicar a motivação da redução das verbas federais – justificada depois como contingenciamento. Não houve interlocução e nem negociação para justificar a diminuição de recursos para todas as etapas de ensino, da educação infantil à pós-graduação. Logo depois, teve que voltar atrás em parte dos cortes.
Tentação populista
Apoiar-se nas ruas para driblar dificuldades inerentes ao exercício do poder é uma velha tentação populista. Não causa surpresa, mas espanta que se recorra a essa estratégia em menos de cinco meses de gestão. Foi o que aconteceu no domingo 26. Em dificuldades no Congresso e sem vocação para articular projetos prioritários, o governo e seus apoiadores, incluindo as milícias virtuais, reagiram com manifestações pró-governo. Foi com a ajuda de governistas de bom senso e do núcleo não ideológico do governo que se evitaram as palavras de ordem para a defesa de reformas, e não para atacar o Congresso ou o Supremo Tribunal Federal (STF) – temas que atraem o bolsonarismo radical. Na última semana, a massa a favor de Bolsonaro recuou das bandeiras autoritárias. Mas como será quando o governo estiver com a popularidade ainda mais fragilizada, a retomada econômica não se viabilizar ou escândalos incontornáveis atingirem o entorno presidencial?
As repetidas ameaças de paralisação de caminhoneiros, categoria que na última greve teve o apoio explícito de Bolsonaro, apontam novos riscos no horizonte. Há outros. O governo não está cumprindo seu papel de promover a conciliação e o diálogo. Para enfrentar a ruína econômica, equacionar o déficit público, atrair investidores e apostar realmente em educação — o verdadeiro motor do desenvolvimento —, o momento é de articulação, de angariar apoios e construir consensos. O clima plebiscitário permanente, ao contrário, afasta aliados e é contraproducente.
Governo não está cumprindo seu papel de promover a conciliação e o diálogo. Momento é de articulação e de angariar apoios
Viabilizar um plano de governo significa enfrentar o contraditório e se submeter ao sistema de pesos e contrapesos da democracia. Mais que isso, representa ampliar o arco de alianças e arbitrar interesses conflitantes. Porém, o governo tem sido inepto – ou muitas vezes hostil — às tentativas de negociação com o Congresso e ao diálogo com os partidos favoráveis a uma agenda reformista. Atacar desafetos e minorias e investir na instabilidade como regra é uma atitude antidemocrática — após as manifestações do dia 15, o presidente respondeu aos protestos chamando os estudantes de “idiotas úteis” e “massa de manobra”. O dissenso só pode ser vencido com argumentos e a razão. A população que anseia a diminuição do desemprego não pode ficar refém de uma guerra panfletária de versões para se descobrir qual manifestação foi maior ou quem consegue fazer mais barulho nas redes sociais.