A paisagem da praia da Cacimba do Padre, em Fernando de Noronha, mudou temporariamente com a realização da etapa do QS, a Divisão de Acesso do Circuito Mundial de Surfe. Mas por ser uma região que agrega uma Área de Proteção Ambiental (APA) e uma Parque Nacional Marinho, tudo tem sido feito com muito cuidado para não prejudicar o ecossistema local.

“A gente tem uma conversa muito contínua com o ICMBio, colocamos toda a infraestrutura que iria ter, respeitando a altura mínima dos palanques por causa do período de desova das tartarugas marinhas. Assim, quando elas saírem do mar para desovar, elas vão conseguir passar por baixo dos palanques e não ficarão presas”, conta Patricia Dias, secretária da Associação de Surf de Fernando de Noronha.

Em um dia normal, a praia é bem tranquila e a quantidade de pessoas é pequena. Mas até domingo, data para a qual está previsto o encerramento do Oi Hang Loose Pro Contest, muitas pessoas vão passar por lá em um período de desova das tartarugas. “Por isso é preciso respeitar o horário de encerramento do evento, que é às 17h, para que não tenha luz e barulho, o que impediria que elas pudessem desovar”, continua.

Outro fato importante é que, no final da tarde, a presença de tubarões no mar é maior, pois é um horário que eles costumam se alimentar dos cardumes que ficam na arrebentação da onda. Um incidente ocorreu na última sexta-feira, quando um surfista caiu em cima de um tubarão e acabou sendo mordido por ele. Precisou tomar 83 pontos, mas já teve alta do hospital.

Para além da fauna local, outra medida é evitar o uso de materiais descartáveis. O evento está com o lema “Plástico Zero” e tem usado os locutores oficiais para orientar o público. “Não podemos agredir a natureza. Tivemos uma conversa com a usina de tratamento de lixo, para eles estarem aqui diariamente. A preocupação é não deixar nada de lixo na praia”, explica Patricia. “A preocupação é realmente deixar a praia nas condições que a gente encontrou ou até melhor”, continua, lembrando que tem muitas lixeiras espalhadas pelo local.

Além de não poder fazer fogueira ou ficar na praia à noite, um dos aspectos mais importantes para a realização do evento foi que a salsa, vegetação nativa na faixa de areia, não fosse arrancada. Por isso, o palanque do evento precisou ficar em um espaço delimitado para não prejudicar a vegetação.

Para além de todo debate ecológico, os surfistas locais esperam corresponder às expectativas. “A gente ficou seis anos sem o Hang Loose na ilha, a comunidade toda em Fernando de Noronha está muito feliz em trazer esse evento de volta. A gente chama aqui de Havaí brasileiro. Temos ótimos surfistas locais e é uma honra muito grande ter uma etapa tão importante de um campeonato internacional aqui. Eles costumam competir aqui, mas nem todos têm condições de viajar para competir”, revela.

LOGÍSTICA – Toda a estrutura para a montagem do palanque viajou milhares de quilômetros por terra e mar. “Fazer um evento em Noronha é uma operação de guerra para trazer tantas pessoas, comissão técnica e organizar a chegada de todos os atletas. Para se ter uma ideia, o palanque saiu de Santos, foi de caminhão até Recife, lá foi colocado em um barco, desembarcou no porto de Noronha e aí o material foi transportado até a praia da Cacimba do Padre, na estrada de barro, escorregadia, para ser montado dentro de uma área ambiental cheia de restrições”, afirma Alfio Lagnado, um dos organizadores do evento.

“Realmente é uma operação muito delicada, mas tudo isso é pago pelas condições do mar e pelo astral dos surfistas que amam competir aqui. O próprio evento, nível 6 estrelas, consegue atrair campeões e grandes surfistas, porque eles amam esse lugar, que é especial e paradisíaco. Nós conseguimos 136 inscritos, de ponta, isso mostra a força que esse evento de ondas tubulares muito boas tem”, finaliza Alfio.

A etapa em Fernando de Noronha foi iniciada nesta terça-feira com a disputa de 17 das 24 baterias da primeira fase.