Centenas de estudantes da prestigiosa Universidade de Pequim protestaram contra as medidas mais severas anticovid, um gesto de desafio incomum neste estabelecimento ultrassensível aos olhos do poder chinês.

A capital chinesa é cenário de rigorosas medidas de controle sanitário desde o início de maio, com testes de triagem quase diários e fortes incentivos ao trabalho de casa. Restaurantes e estabelecimentos comerciais não essenciais estão fechados e muitas residências foram colocadas em confinamento.

Mesmo que a metrópole de mais de 20 milhões de habitantes tenha registrado apenas mil casos nas últimas semanas, o regime comunista continua comprometido com sua política de “covid zero”, apresentada como um sucesso diante das milhões de mortes contabilizadas no resto do mundo.

Porém, mais de 300 estudantes, confinados em seus dormitórios há uma semana, protestaram na noite de domingo dentro do campus de Wanliu, segundo vários alunos que pediram anonimato por medo de punição.

Em vídeos cujo conteúdo foi verificado pela AFP, os alunos repetem slogans e gritam com um funcionário da universidade. Os estudantes tinham acabado de derrubar uma barreira que a Universidade havia erguido para impedi-los de sair de suas residências e pedir refeições.

“Todo mundo ficou muito chateado quando a barreira foi instalada”, afirmou nesta segunda-feira um estudante.

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Um vice-reitor da universidade finalmente se dirigiu aos manifestantes usando um megafone, pedindo-lhes que “voltassem a (seus) dormitórios em paz”, de acordo com um vídeo transmitido por um estudante.

As autoridades universitárias prometeram permitir que os alunos fossem ao campus principal e a entrega de refeições.

“Você tem que fazer o que o governo diz e permitir que todas as suas liberdades lhe sejam tiradas”, comentou um estudante à AFP.

Contactada, a direção da “Beida”, como é apelidada a Universidade de Pequim, negou a qualificação de “protesto”, evocando simplesmente que “alunos manifestaram suas reivindicações”.

A prestigiosa universidade foi em 1989 o berço das manifestações de Tiananmen pela democracia, que terminariam em um banho de sangue na noite de 3 para 4 de junho. Como tal, permanece vigiada pelo poder.

“Hoje vimos a tradição de protesto dos estudantes de Beida renascer das cinzas”, escreveu um usuário da rede social Weibo, em um comentário prontamente censurado.

O descontentamento também é notável em Xangai, a cidade mais populosa do país, cujos 25 milhões de habitantes estão em quarentena desde o início de abril.

Tentando dar alguma esperança à população, as autoridades anunciaram no domingo uma reabertura “passo a passo” dos negócios – uma perspectiva que não muda nada para milhões de pessoas ainda confinadas em suas casas ou em centros de quarentena.

“Não tenho a menor esperança” de reabrir em breve, disse um dono de restaurante à AFP sob condição de anonimato. “Por que as pessoas ainda acreditam nessas coisas? Desde 1º de abril, recebemos piadas todos os dias”.

Depois de superar 25.000 casos diários no final de abril, Xangai reduziu este dado para menos de mil nesta segunda. A capital econômica chinesa também registrou quase 600 mortes desde meados de março.

Mesmo que esses números permaneçam ínfimos em comparação com o resto do mundo, o regime comunista permanece fiel a sua estratégia, apesar do peso econômico e de sua crescente impopularidade.



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