Prestes a completar um ano à frente do Carrefour Brasil, Stéphane Maquaire, CEO do grupo, disse ao Estadão/Broadcast que a companhia acredita na capacidade de expandir as atividades no Brasil e que “não é uma frase que vai mudar tudo”. O questionamento veio depois de o ministro da Economia, Paulo Guedes, ter afirmado a uma plateia de empresários em Brasília, na semana passada, que a França era irrelevante para o Brasil. O ministro disse, conforme mostrou reportagem do Estadão/Broadcast, que iria “ligar o f…-se” para o país europeu.

“Com a relevância que temos, não podemos fazer qualquer coisa porque uma pessoa disse algo”, resumiu o executivo. Depois da compra do Grupo Big, em março de 2021, por R$ 7,5 bilhões, o Carrefour se tornou o maior empregador privado no Brasil. Com mais de mil pontos de venda, tem 150 mil funcionários – mais do que na França e quase um quarto do varejo nacional de alimentos.

O cenário turbulento por conta das eleições de outubro também não afeta os planos da companhia francesa, que está há 47 anos no País. “Vamos seguir atendendo os nossos clientes qualquer que seja a decisão do povo brasileiro”, disse o executivo. O plano é repetir em 2023 os investimentos de um pouco menos de R$ 2 bilhões e focar na abertura de 20 novas lojas de atacarejo da bandeira Atacadão e em lojas de vizinhança do Express, que ele não revela quantas serão.

Egresso da subsidiária do grupo na Argentina, ele assumiu o cargo com duas missões: acelerar a transformação digital da companhia e fazer a integração com o Big.

Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista.

Qual é o foco da sua gestão?

Fazer acontecer a integração com o Big, das pessoas, do mercado. Mas, ao mesmo tempo, temos de nos organizar para entregar o melhor atendimento aos clientes, com uma jornada muito mais acelerada para o digital. Quando falamos em integração, são 40 mil funcionários a mais dentro do Carrefour, o maior empregador privado do País, com 150 mil funcionários. Para isso, temos de ter organização clara e comunicação forte para criar uma nova cultura. Ao mesmo tempo, temos de integrar 374 lojas do Big, das quais 124 vamos converter. Também temos de trabalhar as sinergias. Anunciamos ao mercado que temos ao menos R$ 2 bilhões de sinergias que queremos entregar até 2025. Queremos que a integração do Big não atrapalhe a aceleração digital.

Como está hoje a integração do Big?

Está concluída em termos de liderança de organização. Apresentamos como queremos trabalhar. Agora estamos trabalhando em conversões de lojas e conversões de sinergias. Começamos em junho e temos 124 lojas para converter em vários formatos: hipermercado Big para Atacadão, para hipermercado Carrefour ou Sam’s Club. O novo formato para nós é o Sam’s Club. Já as lojas Maxxi serão convertidas em Atacadão. Isso leva tempo. Estamos trabalhando nas primeiras conversões e anunciamos 18 meses para fazer a conversão de 124 lojas. Começamos e estamos andando muito bem. Quando convertemos uma loja, precisamos de dois a três anos para atingir o patamar de vendas do novo formato.

Como está o processo de aceleração digital?

Do modelo clássico do CD (centro de distribuição) para entregar para os clientes, mudamos para ter a preparação dos pedidos dentro das lojas. Desde março, cem lojas de hipermercado e também de supermercado e algumas lojas do Express estão preparando os pedidos para os clientes. Com isso, conseguimos fazer as entregas no mesmo dia. Temos também a digitalização do Atacadão. Estamos crescendo.

Qual é a participação do e-commerce nas vendas?

Hoje é de 4%. A meta é atingir duplo dígito em 2026.

Nos próximos meses, o Carrefour vai ter como prioridade qual formato de loja, diante do aumento da inflação?

Vamos manter o crescimento do Atacadão e também loja de vizinhança; 47 lojas Big vão virar hipermercados. Ainda estamos avaliando bem o potencial desse formato Sam’s Club, onde os clientes são sócios. Vamos converter sete lojas Big para esse formato. Vamos chegar a 54 e depois queremos crescer.

Como o Carrefour está lidando com a inflação?

Estamos puxando os nossos produtos marca própria, mostrando que há possibilidade para os nossos clientes comprarem mais barato em nossas lojas. Também estamos com produtos com embalagens menores para atender os clientes que compram menos e mais frequentemente. Estamos negociando com fornecedores para controlar a inflação de suprimentos e atuando em todos os setores para ter um posicionamento de preço melhor. Quando divulgamos os resultados do primeiro trimestre, mostramos que baixamos a margem para acompanhar a curva de aumento da inflação. Implementamos desde novembro do ano passado até janeiro deste ano a estratégia de preços congelados da nossa marca própria.

Quanto a marca própria representa nas vendas?

Representa 20%. São pequenas iniciativas para enfrentar essa alta de preços no País.

Qual é o cenário para o segundo semestre?

O Auxílio Brasil dá a possibilidade de as pessoas comprarem alimentos. Temos a possibilidade de manter o crescimento registrado no primeiro semestre. Não posso dizer muito mais.

Ao mesmo tempo que há um Auxílio Brasil maior, de R$ 600, a taxa de juros subiu muito…

Mas como há um banco dentro do Carrefour Brasil, temos a oportunidade de apoiar a venda financiada, parcelando em três vezes sem juros.

Como o Carrefour encara a afirmação do ministro da Economia, Paulo Guedes, feita na semana passada a uma plateia de empresários em Brasília, de que a França é irrelevante para o Brasil?

Encara as condições positivas que o País tem. Vamos seguir investindo no País, através da abertura de lojas e do crescimento no digital. É tudo isso que o Carrefour França tem para o Brasil. As porteiras estão abertas.

Essa afirmação muda o plano de investimentos?

Estamos há 47 anos aqui, e não é uma frase que vai mudar tudo. Acreditamos na capacidade de crescer as atividades no Brasil ontem, hoje e amanhã. Com a relevância que temos, não podemos fazer qualquer coisa porque uma pessoa disse algo.

Quanto a companhia vai investir este ano e em 2023 e quantas lojas o grupo pretende abrir?

Este ano vamos abrir 20 lojas do Atacadão, fora as conversões. Das 124 lojas a serem convertidas, 70 serão Atacadão. Vamos abrir 20 lojas Atacadão no ano que vem. Dos R$ 2,1 bilhões nas conversões, provavelmente vamos manter o patamar de investimentos, não posso dizer quanto. Normalmente investimos um pouco menos de R$ 2 bilhões.

Como o sr. vê o cenário eleitoral?

Vamos seguir atendendo os nossos clientes, qualquer que seja a decisão do povo brasileiro. Seguimos o nosso caminho, aconteça o que acontecer, com objetivo de crescer.

Como a matriz olha o cenário eleitoral, as incertezas e os ataques à democracia?

Acho que o mundo está atravessando direções desse tipo. Na França, tivemos os jalecos amarelos (movimento que começou contra o aumento dos combustíveis e se ampliou para insatisfação social mais ampla) e nos Estados Unidos tivemos o episódio em janeiro de 2021 (invasão do Capitólio).

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.