Ao cumprir mandado de busca e apreensão na residência do ex-ministro da Justiça Anderson Torres, determinado pelo ministro do STF Alexandre de Moraes, que expedira contra ele mandado de prisão, a Polícia Federal encontrou a minuta (espécie de rascunho) de um decreto pelo qual o presidente Jair Bolsonaro poderia decretar estado de defesa no interior do TSE — e, assim, anular, alterar ou reverter o resultado das eleições vencidas por Lula.

Anderson Torres foi ministro da Justiça de Bolsonaro. Bolsonaro espalhou a mentira de que as eleições eram fraudadas – ou seja, Lula não teria sido eleito. Há uma pergunta óbvia: por que Torres faria a minuta, agora apreendida, se Bolsonaro não o tivesse incumbido dessa missão?

Não dá para unir materialmente o nome de Bolsonaro à minuta, a não ser que nela apareça, por exemplo, a letra do ex-presidente, ou que se descubra dentre o material apreendido alguma solicitação explícita de Bolsonaro nesse sentido. Mas foi dado um passo na direção do estabelecimento da materialidade de crimes cometidos pelo ex-mandatário.

Essa minuta, é claro, não incrimina Bolsonaro, mas, com base nela, deve a Justiça determinar oitivas do ex-presidente, justamente nessa direção: qual a razão desse projeto de decreto? O que o motivou? Para Torres também deverão ser feitas idênticas indagações. Ele poderá complicar a sua situação se afirmar que foi iniciativa própria – porque elaborar tal minuta é prática de crime. É inconstitucional. Ou poderá dizer a verdade: Bolsonaro ordenou-lhe que a fizesse. Aí a necessária materialidade para uma acusação formal contra Bolsonaro estará dada.

Com a busca e apreensão realizadas e a iminente prisão de Torres, surgirão provas de crimes que, todos sabem, Bolsonaro praticou no exercício do mandato.