Rodrigo Garcia, de 47 anos, assumiu o governo de São Paulo há um mês com a missão não apenas de governar o maior estado brasileiro, mas também a de se reeleger para continuar administrando a mais rica unidade da federação, tendo em caixa uma pequena fortuna de R$ 54 bilhões, que serão aplicados na saúde, educação e em obras de estradas, dentro de um orçamento de R$ 286 bilhões em 2022. Para ficar mais perto dessa máquina administrativa que tem que gerir, mudou-se para o Palácio dos Bandeirantes e, ao contrário de seu antecessor, João Doria, ocupa a ala residencial da sede do governo paulista. Lá, mora com sua mulher e dois filhos adolescentes (uma terceira filha reside no exterior), que levaram para lá seus animais de estimação: quatro cachorros, dois coelhos e um gato. “E o mais interessante é que o cachorro convive com o gato, que convive com o coelho e ninguém briga”. Homem pacato, típico do interior, mas hábil negociador e gerente tocador de obras, Rodrigo já mostrou que vai conduzir o governo de forma bem diferente, tanto que preferiu tomar posse em um café da manhã no Bom Prato (restaurante popular) na Favela de Paraisópolis, em São Paulo, ao contrário de fazer festa com pompa e circunstância. “Mandamos R$ 400 bilhões para Brasília e só recebemos R$ 40 bilhões de volta. Esse pacto federativo é injusto e precisa ser mudado”.

O senhor assume o governo de São Paulo com a missão de garantir a continuidade dos governos do PSDB no estado que já perdura por 27 anos. É um peso muito grande sobre suas costas?
O PSDB tem um projeto vitorioso em São Paulo que a cada quatro anos foi avaliado e aprovado pela sociedade. A beleza da democracia é essa, que nas eleições as pessoas votam com liberdade e com consciência de que se as coisas estão indo bem, elas continuam. Se não estão, se muda. São Paulo é um estado onde as coisas funcionam, onde nós temos políticas públicas que são referências para o Brasil e o grande desafio é garantir as conquistas que São Paulo tem e, ao mesmo tempo, olhar para o futuro. Tenho 47 anos, represento, na minha opinião, a renovação da política paulista dentro de um partido que já tem tanta história e tradição como o PSDB.

O que o PSDB deixou de fazer e que o senhor deseja fazer agora?
Sempre dá para fazer mais. Nós somos um país muito injusto e o bom governador é aquele que consegue diminuir as desigualdades sociais no seu período de governo e também criar novas oportunidades para as pessoas. Eu diria que o grande desafio deste momento é criar em São Paulo um sistema de educação que dê esperança de futuro aos jovens. Tenho falado muito do ensino integral e do ensino integrado. Os alunos precisam ficar oito horas na escola. No segundo grau, o jovem pode escolher entre dois currículos, o técnico e o médio. Quero transformar a rede de ensino de segundo grau de São Paulo em Etecs (escolas técnicas).

Quais foram os maiores legados da gestão João Doria/Rodrigo Garcia no governo de São Paulo?
Foi a vacina. É aquilo que mais deu visibilidade ao governo de São Paulo. Foi a luta de Doria que trouxe antes a vacina para o Brasil. Isso tem que ser creditado a ele. Além de um ajuste fiscal do governo que permitiu um grande investimento público.

São Paulo vai voltar a ser a locomotiva do Brasil?
A minha prioridade agora é cuidar das pessoas mais pobres, porque a pobreza aumentou, e gerar empregos para aqueles que estão procurando. Então eu tenho dois focos: programas sociais que ajudem a população mais carente e programas econômicos que ativem o emprego, que é o melhor programa de distribuição de renda que o Brasil pode ter. O meu foco é a proteção social e a geração de empregos.

A concentração de renda é um problema, certo?
Nesse período de pandemia, nós crescemos muito. Só que, infelizmente, o crescimento está muito concentrado, e cada vez os ricos estão mais ricos e os pobres, mais pobres. Então quando você olha o número do PIB, você vê que São Paulo cresceu cinco vezes mais que o Brasil, 8% nesses últimos três anos. Mas quando se olha nas ruas, você vai observar que a pobreza está aumentando.

Por que isso está acontecendo?
Em minha opinião, muita concentração de renda. O governo tem que ter um olhar específico para criar políticas sociais, para ajudar quem está precisando e para criar políticas de emancipação social para que as pessoas possam conseguir seu emprego.

João Doria sempre disse que deixaria R$ 50 bilhões em caixa para investimentos. Esse dinheiro começou a ser aplicado?
Já estamos executando esse grande investimento desde o ano passado. A prioridade sempre será a saúde. Estamos ampliando o atendimento à saúde em todo o estado. A população quer um serviço sanitário melhor do que ela tinha antes da pandemia, e ela terá. Outro volume importante de recursos está sendo aplicado na proteção social. E aí o programa Bolsa do Povo, que tem o vale gás e o Acolhe São Paulo, os programas mais importantes de transferência de renda e de apoio à população mais pobre. E o Pró São Paulo, que é o maior conjunto de obras da história do estado.

Quantas obras estão em andamento no estado?
São oito mil obras e mais de 200 mil empregos. É esse tripé: saúde, social, e aí está incluída a educação, com as escolas de tempo integral, e o Pró São Paulo. Esse tripé é a prioridade do investimento desses mais de R$ 50 bilhões.

Um dos seus concorrentes, o ex-ministro Tarcísio de Freitas, deveria ter feito privatizações aqui, mas nada fez…
São Paulo tem o maior programa de infraestrutura da sua história e tem obras concretas para mostrar. Não são obras de papel.

As obras dele são de papel?
São Paulo tem obras reais. Canteiros de obras reais e empregos reais nas obras que a gente empreende. Tudo o que for de interesse de São Paulo, serei o primeiro a lutar e a brigar para que as coisas aconteçam. Sejam questões federais aqui dentro do estado, sejam questões do município. O governador tem esse papel de protagonista de defender São Paulo e defender os interesses dos paulistas. O governo nunca vai misturar a briga política com a relação institucional. Estou aberto a receber todo o apoio que eventualmente o governo federal possa vir a dar. Aliás, o pacto federativo é extremamente injusto. O estado manda dez reais de impostos para o governo federal e devolve-se apenas um real para São Paulo.

O senhor tem o valor disso?
Mandamos R$ 400 bilhões para Brasília e recebemos de volta R$ 40 bilhões. Então, o pacto federativo é injusto. E por que é injusto? São Paulo tem um papel importante na questão nacional. A gente é do território nacional. Nós somos brasileiros e ajudamos o Brasil. Por outro lado, você sai aqui por São Paulo e vemos que temos muitos problemas para resolver. Então, não é justo o dinheiro de São Paulo estar sustentando, por exemplo, a elite do funcionalismo público federal. Não é justo o dinheiro dos pobres de São Paulo estar sustentando o rico de outros estados. Então, temos que brigar para que isso seja alterado.

O senhor vai dialogar com Bolsonaro para tratar dos problemas de São Paulo se for preciso?
Converso com todo o espectro da política brasileira, da esquerda à direita, quando o interesse for o meu estado. Não tenho nenhuma dificuldade de dialogar com todos os partidos, com o presidente da República e com outros governadores sobre os interesses do estado.

O senhor reconhece que há uma grande dificuldade na forma como Bolsonaro administra o País?
Eu posso falar por São Paulo. Ele colocou São Paulo como o último da fila. Não temos praticamente nenhum investimento do governo federal aqui. O DNIT investe R$ 14 milhões por ano nas rodovias de São Paulo, e isso é nada. Nós não tivemos a privatização do Porto de Santos, não tivemos a privatização do Aeroporto de Congonhas. A privatização da Dutra traz investimentos, mas muito mais no Rio de Janeiro do que em São Paulo, e isso é importante frisar. A duplicação da Rio-Santos acontece no território do Rio, não acontece no território de São Paulo. Foi uma opção que o governo federal fez de não ajudar São Paulo.

O presidente é negacionista em quase todos os campos, além de ser um político conservador de direita. Incomoda ter que negociar com uma pessoa com esse perfil?
Tudo que for do interesse de São Paulo, eu sento com quem precisar. Acima da minha opinião ou da minha ideologia, está o interesse do meu estado. Falo que São Paulo sempre foi um estado que soube se unir em torno dos temas que são relevantes. Aqui nós sempre soubemos respeitar as diferenças. Respeitar quem pensa diferente da gente. Eu governo para todos os paulistas, para quem concorda e para quem não concorda comigo.

Como o senhor vê a polarização política no Brasil?
Meu trabalho é proteger São Paulo contra essa guerra ideológica e não deixar que ela venha para cá e contamine a discussão por aqui. Essa guerra ideológica não enche a barriga de ninguém. Ela não resolve os problemas reais das pessoas. Em 2018, o presidente Bolsonaro representava uma série de reformas e mudanças para o Brasil que não foram feitas. E isso frustrou a mim e a tantos outros brasileiros. Por isso é que eu acho que o caminho não seja nem Lula e nem Bolsonaro.

O senhor aposta em uma terceira via?
A sociedade está buscando esse nome de consenso e espero que os partidos do centro democrático possam estar juntos e com um único nome para apresentar uma alternativa ao Brasil.

O que acha do governo Bolsonaro, de um modo geral?
É um governo que entregou muito pouco. O Brasil hoje sofre com inflação alta, com desrespeito ao meio ambiente. Por isso que a vida das pessoas está mais difícil do que estava. Um governo que entregou pouco e, portanto, frustrou as expectativas dos brasileiros.

Faltando seis meses para as eleições, o senhor ainda está atrás de outros candidatos. Em que momento o senhor acha que vai subir nas pesquisas?
No momento em que as pessoas pararem para olhar os candidatos, conhecê-los e avaliar as suas propostas. Meu foco é governar o estado. É diferente dos candidatos de outros partidos. Sou o governador de São Paulo e tenho uma responsabilidade muito grande de governar um estado de 46 milhões de habitantes. Acordo cedo e durmo tarde pensando em quais decisões vou tomar como governador para melhorar a condição de vida dos paulistas. No momento certo, a partir de agosto, eu vou debater a eleição, vou mostrar quem sou, o que represento e o que eu quero para o futuro de São Paulo. E aí, naturalmente, as pessoas vão poder avaliar cada candidato no mês de setembro, que é o mês em que as pessoas vão parar para escolher o seu candidato.