Esquerda é partido mais votado em Berlim; AfD prevalece no Leste

Em contraste com o resto do país, capital alemã dá preferência à oposição de esquerda. Já a ultradireita se consolida nos estados da antiga Alemanha Oriental – mas avança também em "cinturões de ferrugem" no oeste.Minoritário no cenário nacional, o partido alemão A Esquerda (Die Linke) foi o mais votado em Berlim. Com 19,9% dos votos – um recorde para a legenda na cidade –, ela superou por estreita margem até mesmo os conservadores da União Democrata Cristã (CDU), vencedores da eleição geral deste domingo (23/02), mas preferidos por apenas 18,3% dos eleitores da capital alemã.

Com isso, A Esquerda terá seis dos 24 parlamentares eleitos por Berlim. No parlamento inteiro, os esquerdistas devem ocupar 64 das 630 cadeiras – a menor bancada do Bundestag.

O partido surpreendeu analistas que davam como certa sua trajetória rumo à irrelevância, mobilizando eleitores com uma campanha focada em temas sociais e na defesa da taxação de ultrarricos, mas também com uma oposição clara às políticas de migração defendidas pela CDU. Em Berlim, o partido também investiu em iniciativas de apoio a inquilinos pressionados pelo alto custo dos aluguéis na cidade.

Berlim é famosa nacionalmente pelo seu alto percentual de estrangeiros e alemães de ascendência estrangeira, que respondem por quase 40% da população.

A capital alemã, dividida em 12 distritos, foi palco da disputa regional mais acirrada da eleição. A Esquerda foi o partido mais votado em seis deles, cujo traçado coincide em boa parte com as fronteiras da antiga Berlim Oriental. A exceção ficou por conta do distrito periférico de Marzahn-Hellersdorf, no leste, onde a sigla de ultradireita Alternativa para a Alemanha (AfD) saiu na frente – pela primeira vez.

Do outro lado, na antiga Berlim Ocidental, os melhores resultados couberam aos conservadores da CDU. Ainda assim, eles ficaram abaixo da média nacional.

O resultado das eleições em Berlim não poderia ser mais diferente do resto da Alemanha (veja gráfico abaixo): Esquerda com 19,9%, conservadores com 18,3%, Verdes com 16,8%, AfD com 15,2% e SPD com 15,1%. Já o nanico BSW, sigla populista de esquerda, teria presença garantida no parlamento, com 6,6%, se dependesse dos berlinenses. Já os liberais do FDP, com 3,8%, seriam banidos do Bundestag.

O mapa dos resultados eleitorais revela uma capital alemã claramente mais à esquerda que o resto do país, mas praticamente cercada por eleitores da AfD; a ultradireita anti-imigração só não foi mais popular em Potsdam. No resto de Brandemburgo, um em cada três eleitores depositou seu voto na AfD.

Leste alemão, bastião da AfD, mas partido também avança no oeste

Apesar de a AfD ter ficado em segundo lugar nas eleições gerais, se dependesse somente do leste alemão, a legenda terminaria o pleito em primeiro lugar. Ela foi a mais votada na esmagadora maioria dos distritos, com exceção de três distritos nas regiões de Leipzig, Potsdam e Berlim.

Ali, na antiga Alemanha comunista, 36,6% dos eleitores escolheram a AfD – muito acima dos 20,8% conquistados no cenário nacional.

Já os três partidos que integraram a coalizão de governo derrotada neste domingo tiveram desempenho bem abaixo do resultado nacional: o SPD teve 10,8%, os Verdes saíram-se com 5,6% e o FDP, com 3,1% – um sinal claro de insatisfação do eleitorado.

Mas, pela primeira vez, a popularidade da AfD extrapolou as fronteiras do leste alemão, e começou a avançar em "cinturões de ferrugem" do oeste que vem sendo afetados pela desindustrialização.

O partido também foi o mais votado nos distritos de Kaiserslautern (25,9%), na Renânia-Palatinado, e Gelsenkirchen (24,7%), na Renânia do Norte-Vestfália. Neste mesmo estado, num distrito de Duisburg, um centro urbano qye vem sendo afetado pela perda de população nas últimas décadas, o partido perdeu por pouco para o SPD, mas ainda obteve uma votação significativa (24,6%).

Na Baviera, a AfD até obteve votações melhores que isso em três distritos, mas não conseguiu superar a popularidade da União Social Cristã (CSU), partido-irmão da CDU.

O crescimento da AfD na antiga Alemanha Ocidental, onde a legenda somou 18% (contra 20,8% a nível nacional), foi decisivo para a expansão da bancada no Parlamento.

A Renânia do Norte-Vestfália, por um exemplo, é um dos estados que também concentra um número acima da média de imigrantes. Ali, a AfD obteve 16,8% dos votos, 7,3% a mais que em 2021. Já na Baviera, esse número foi de 20,8% – o dobro de 2021, num resultado idêntico ao nacional.

A AfD foi bem-sucedida na mobilização de 2 milhões eleitores descrentes com o sistema político, que já não votavam mais em eleições. Também conseguiu convencer alguns que, na eleição de 2021, haviam apostado nos partidos tradicionais: tirou 1 milhão de votos dos conservadores, 890 mil dos liberais e 720 mil dos social-democratas. E até mesmo 210 mil ex-eleitores d'A Esquerda e dos Verdes migraram para a AfD.

ra (dpa, ots)