Enquanto vivia uma das personagens mais intensas de sua carreira, a destemida Ellie na série “The Last of Us”, Bella Ramsey passou por uma jornada pessoal tão profunda quanto a da protagonista. A atriz britânica revelou que foi durante as gravações da primeira temporada da produção da HBO que recebeu o diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista (TEA), um marco que, segundo ela, trouxe clareza e autocompreensão.
“Foi como acender a luz de um quarto onde eu vinha tropeçando no escuro há anos. Finalmente, tudo se encaixou”, declarou Bella em entrevista recente.
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Em entrevista à Vogue Britânica, publicada na quarta-feira, 19, a atriz, que se identifica como não-binária, disse: “Eu já falei sobre neurodivergência antes, mas por alguma razão eu não queria […] não queria dizer o que era”.
“Sempre me senti diferente. Tinha uma sensibilidade que as pessoas não entendiam, preferia rotinas previsíveis e me sentia exausta após interações sociais. Achei que era apenas parte da minha personalidade, mas o diagnóstico me mostrou que há uma razão para tudo isso.”
A descoberta do autismo na vida adulta, embora menos comum do que na infância, é cada vez mais reconhecida pela comunidade médica. O psicólogo *Damião Silva, especialista em transtornos do neurodesenvolvimento, explica que muitas pessoas passam boa parte da vida sem saber que fazem parte do espectro.
“Muitos adultos só começam a desconfiar quando veem traços nos próprios filhos ou após terem acesso a informações mais amplas sobre o TEA. O diagnóstico tardio pode trazer desafios emocionais, mas também é uma oportunidade de autoconhecimento e acolhimento”, diz.
Silva destaca que o autismo em adultos pode se manifestar de forma sutil, com sinais como dificuldade na comunicação social, hiperfoco em interesses específicos, sensibilidade a estímulos sensoriais e desafios para manter relacionamentos.
“São pessoas que podem ter desenvolvido estratégias para ‘mascarar’ suas dificuldades, o que retarda a identificação do transtorno”, observa.
No caso de Bella Ramsey, o ambiente intenso e emocionalmente exigente das filmagens foi um gatilho para que ela começasse a olhar mais atentamente para si mesma.
“Estava lidando com emoções extremas, cenas de conflito e ambientes imprevisíveis. Percebi que precisava entender o motivo de certas reações minhas”, afirmou a atriz.
Segundo o especialista, o processo diagnóstico na fase adulta envolve uma avaliação clínica completa, com histórico de vida, entrevistas estruturadas e observação direta.
“Não é incomum que adultos cheguem ao consultório já com suspeitas bem embasadas. A validação profissional traz alívio e direcionamento”, diz Silva.
Embora o autismo não tenha cura, há várias estratégias terapêuticas que contribuem para a qualidade de vida de quem recebe o diagnóstico na vida adulta. O psicólogo recomenda abordagens como Terapia Cognitivo-Comportamental, Terapia Ocupacional, intervenções em habilidades sociais e, em alguns casos, uso de medicação para tratar quadros associados como ansiedade ou depressão.
“O importante é compreender que o TEA não define a pessoa, mas ajuda a entender aspectos importantes do funcionamento dela. Com apoio e informação, é possível viver com autonomia, bem-estar e aceitação”, conclui o especialista.
Bella Ramsey, agora mais consciente de sua neurodivergência, tem usado sua visibilidade para abrir espaço para a conversa.
“Não quero ser rotulada, mas sim reconhecida. Meu cérebro funciona de um jeito único, e isso faz parte do que sou como artista e ser humano. Saber disso só me dá mais força”, destacou a artista.
A revelação da atriz é um convite à reflexão: quantas pessoas ainda vivem em silêncio com suas diferenças, sem o acolhimento de um diagnóstico? O caso de Bella mostra que nunca é tarde para se conhecer — e se aceitar.