08/02/2018 - 12:23
Conhecida como ‘Cinderela brasileira’, Sandra Passos cresceu em um lixão antes de construir uma carreira improvável nas passarelas chinesas, onde criou uma agência para fazer despontar outras modelos brasileiras.
De volta à cidade natal de São Gonçalo, município da região metropolitana do Rio de Janeiro, a jovem de 28 anos ensina às suas alunas a posar para as câmeras e, inclusive, se virar em inglês.
A partir de fevereiro, sua intenção é levar as melhores a mais de 17.000 quilômetros dali, para Cantão, a cidade do sul da China, onde mora na maior parte do tempo.
Usando um biquíni preto e branco que ressalta suas formas generosas, Jessica Soares caminha com passos firmes e saltos altos sobre o piso de madeira de um clube esportivo como se fosse uma passarela.
“Muita gente já me falou: nossa, você é linda de rosto, já pensou em emagrecer?”, conta a jovem parda de 22 anos, de longos cabelos ondulados.
Assim como ela, quatro das 24 modelos selecionadas por Sandra para entrar em sua escola são ‘plus-size’, termo usado para designar os números grandes no mundo da moda.
Mais da metade é de negras, que, apesar de representarem grande parte da população brasileira, não costumam ter seus rostos estampados na indústria da imagem. Também há um jovem pardo, Luiz Filho, de 26 anos, igualmente corpulento.
Os alunos foram selecionados no começo de janeiro em um casting que reuniu mais de 200 candidatos.
– Chega de Barbies –
“O importante para mim é a determinação e a vontade de vencer. Nosso critério de seleção foi bem longe do padrão. Queria quebrar esse paradigma da Barbie de olhos azuis e cabelo louro”, afirma Sandra Passos.
Magra, de cabelos castanhos, pele branca e olhos verdes, ela está relativamente próxima deste perfil, embora para vencer tenha tido que superar muitos obstáculos.
A começar pela infância pobre e por ter crescido em um lixão.
“Meu pai sempre foi criador de porcos e catador de lixo. Ele coletava e reciclava todas as coisas”, lembra.
Incentivada pela mãe a participar de concursos de beleza desde menina, Sandra tinha acabado de ser rejeitada por várias agências de modelo quando um agente lhe deu a chance de viajar para a China. Ela tinha 16 anos.
“Cruzei o mundo sem falar inglês, sem dinheiro, sem nada, sem saber nem o que estava fazendo lá. Precisei de um tempo de adaptação, passei seis anos antes de abrir caminho”, lembra a jovem, que empresta o rosto para várias marcas de lingerie vendidas pela gigante chinesa do comércio digital Taobao.
– Autoestima –
Atualmente, Sandra toca a carreira de modelo junto com a de empresária à frente da agência Rio Model Management, que ela mesma fundou há quatro anos, em Cantão.
Entre seus feitos está o de ter introduzido com sucesso na China Caroline Patrão, uma manequim ‘plus-size’ de Niterói, também na região metropolitana do Rio.
Seguindo seus passos, Sandra pretende aumentar a diversidade das modelos no gigante asiático, apesar de a população negra ser minoritária por lá – vítima, em muitos casos, de racismo – e de as brasileiras terem um biotipo muito diferente do das chinesas.
“Na China, praticamente não há modelos negros e os padrões de beleza são bastante rígidos, mas queremos tentar mudar isso. Antes de Caroline chegar lá, as modelos ‘plus-size’ tampouco eram aceitas”, explica Sandra.
Ivan Li, um dos colaboradores de Sandra Passos na China, acredita que apesar de tudo há “uma demanda relativamente importante” de modelos ‘plus-size’, tanto interna como externa, visto que existem “agências estrangeiras implantadas na China, mas que trabalham para outros mercados”.
Para encontrar novos talentos e dar uma chance aos mais desfavorecidos, ela criou a ‘Rio School’, onde as 24 modelos selecionadas fazem cursos em uma plataforma online.
“Além de nos ensinar muita coisa, é ótimo para nossa autoestima. A trajetória da Sandra é incrível e torna o nosso sonho mais palpável”, afirma Larissa Bonifácio, uma jovem negra de 21 anos, cabelos curtos e olhar determinado.
Jessica, por sua vez, está pronta para se aventurar.
“A ideia de ir para a China assusta porque é outro país, língua, cultura, costumes… Antes disso, eu não me via fora daqui. Agora penso que posso virar uma modelo ‘plus size’ internacional na China”, conclui.