O poliamor imperial na Tailândia chegou ao fim de uma maneira abrupta e tempestuosa. Na semana passada, a casa real comunicou o fim do relacionamento do monarca Maha Vajiralongkorn, também chamado Rama X, com sua amante oficial, Sineenat Wongvajirapakdi, de 34 anos. Maha retirou-lhe, sumariamente, o título de consorte real, condição prestigiada que ela havia alcançado há poucos meses, e a acusou, por meio do jornal da Corte, de deslealdade e ambição, por querer ter os mesmos privilégios que a rainha de fato — Suthida Tidjai, 41 anos, sua quarta mulher. O rei justificou o término pelo comportamento “desrespeitoso” demonstrado pela cortesã, acusada de desobediência contra o monarca e a rainha além de não ser grata ao título que lhe foi conferido.

Situação de coadjuvante

Parece que Sineenat ultrapassou determinados limites e não conseguiu se adaptar à vida monárquica e ao novo status. Nascida na província de Nan, no norte do país, ela se formou na Royal Thai Army Nursing College, aos 23 anos, para depois trabalhar como enfermeira nas Forças Armadas. Foi nessa época que começou a se relacionar com o então príncipe herdeiro. Com o apoio de Maha, Sineenat deixou os hospitais e se tornou pilota de aviões e paraquedista. Em seguida, passou a fazer parte do grupo de guarda-costas do rei e, ao final, foi nomeada major-general. Ao ser coroado, Maha, 67 anos, escolheu Suthida como sua rainha. Isso abalou Sineenat, que se sentiu preterida. Ela não admitia viver a situação de coadjuvante.

DESOBEDIÊNCIA Pilota de aviões e paraquedista, Sineenat foi acusada de comportamento desrespeitoso (Crédito:Handout/AFP)

Embora o título de cortesã real não fosse concedido desde o começo do século passado, ele faz parte da tradição imperial tailandesa. É oferecido pelo monarca à mulher escolhida como amante oficial para viver ao seu lado, não com os privilégios e obrigações de rainha, mas gozando de benesses e acesso direto ao palácio. Comuns no século XIX, as amantes recebiam ordens para estabelecer alianças com intermediários locais, em lugares em que o rei não estava disposto a ir. A última vez que um soberano do país teve uma concubina oficial foi durante o reinado de Vajiravudh, que morreu em 1925, sete anos antes do país se tornar uma monarquia constitucional.

A Tailândia, antes conhecida como Sião, é o único país do sudeste asiático que nunca foi dominado pelos ocidentais. Para o professor de relações internacionais da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Mássimo Della Justino, o caso de Sineenat mostra que a ilha se modernizou, mas ainda carrega traços absolutistas. “Essa destituição é uma demonstração de força. O rei não é um igual entre os iguais”, diz ele. Em 2016, após a morte de seu pai, Bhumibol Adulyadej, Maha chegou ao poder com a expectativa de que seria uma liderança menos autoritária que o antecessor. Mas isso não se confirmou. Politicamente está sendo mais duro na condução das Forças Armadas, no controle financeiro da coroa e no tratamento dado as suas mulheres. Antes de excluir a amante da corte, ele já revelava um histórico de intransigência nos relacionamentos. A segunda esposa, Sujarinee, foi repreendida publicamente por ele em 1996 e fugiu para os Estados Unidos. Maha repudiou os quatro filhos que teve com ela. Em 2014, a terceira mulher, Srirasmi, foi despojada de todos os títulos e banida da corte.

Intolerante e rebelde desde a juventude, o atual soberano passou boa parte de sua vida no exterior, principalmente na Alemanha. “Maha foi para Europa para não causar problemas, porque não tinha uma postura condizente com a realeza”, explica Justino. A Constituição da Tailândia não permite que conflitos da realeza sejam expostos a público. Fala-se, porém, que quem é destituído de títulos cai em desgraça e passa a ser tratado com indiferença e desprezo. A ex-cortesã real não poderá mais executar funções de alto nível nas forças militares, por exemplo, e perdeu sua influência. Pairam incertezas sobre o seu futuro. Tudo indica que seu provável destino é o total ostracismo.

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