01/12/2024 - 10:00
O líder do governo na Câmara dos Deputados, José Guimarães (PT-CE), avalia que o PT pagou um preço alto ao enfrentar Eduardo Cunha, à época no MDB-RJ, na disputa pelo comando da Casa em 2015. Para ele, essa decisão foi o estopim para o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) no ano seguinte.
Segundo Guimarães, a decisão de enfrentar Cunha trouxe graves reflexos para o partido, com impactos que perduram até os dias atuais, deixando a legenda sem força para viabilizar uma candidatura própria. Na visão do líder de Lula (PT), o conservadorismo da Câmara imporia uma nova derrota ao partido, reforçando a necessidade de uma estratégia mais cautelosa nesses momentos.
“O PT pagou caro na época da Dilma porque se inventou uma candidatura para derrotar Eduardo Cunha. Aquilo teve consequências grandiosas para o processo de afastamento que houve entre o governo e o Congresso, especialmente a Câmara dos Deputados”, afirmou.
“Jamais iremos lançar uma candidatura própria para ser derrotada. Você tem que partir de uma realidade fática, que é o resultado das eleições. A Câmara, a maioria dela, é conservadora. O eleitor escolheu os parlamentares, uns 513. O PT elegeu 79 deputados e deputadas. O PL elegeu 99, hoje está com 90. Portanto, nós não tínhamos força para inventar uma candidatura como fizemos no passado”, completou.
Embora o PT desejasse lançar uma candidatura, descartou a possibilidade por não ter chances de vitória em um cenário dominado pelo Centrão. Essa situação não é inédita, mas contrasta com as duas últimas décadas, quando o partido conseguiu eleger três presidentes da Câmara: João Paulo Cunha, em 2003; Arlindo Chinaglia, em 2007; e Marco Maia, em 2011.
Sem o apoio do Centrão, o PT se tornou o fiel da balança na disputa pela presidência da Câmara neste ano. A legenda permaneceu indecisa entre a chapa Antônio Brito (PSD-BA)/Elmar Nascimento (União Brasil-BA) e Hugo Motta (Republicanos-PB), este último apoiado por Arthur Lira (Progressistas-AL).
Assista a entrevista completa:
A decisão pelo apoio a Motta foi chancelada pelo líder do partido na Câmara, Odair Cunha (MG), após o paraibano assegurar a governabilidade de Lula nos próximos dois anos. Outro fator determinante foi a promessa de congelar pautas ideológicas que pudessem gerar conflitos.
“A negociação que a bancada fez, liderada pelo Odair, foi no sentido de, primeiro, garantir a governabilidade. Segundo, priorizar as pautas do governo. Terceiro, evitar a discussão de pautas na área de costumes, para não acirrar os ânimos aqui dentro. E, por fim, garantir os espaços que foram acordados para o PT. O partido vai sair forte de 2024, e ainda mais forte em 2025, com grande potência política graças à capacidade de articulação que a bancada demonstrou ao dialogar com essas forças aqui dentro da Câmara”, explicou Guimarães.
O deputado cearense acredita que a articulação com Hugo Motta consolida a estratégia petista e fortalece o governo para garantir a reeleição de Lula em 2026.
“Nós fizemos uma importante articulação com Motta, e a nossa expectativa é que, cada vez mais, a governabilidade se estabeleça com maior força, solidez e parceria. As coisas estão se consolidando muito bem. Eu acredito que chegaremos a 2026 com uma articulação governamental robusta e capaz de garantir a reeleição do presidente Lula”, concluiu.
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ISTOÉ: Eu queria que o senhor começasse, antes de mais nada, fazendo uma avaliação dessa gestão do senhor à frente da liderança de governo. Já vamos para dois anos na liderança, queria que o senhor fizesse uma avaliação inicial em relação a isso.
JG: Quem lidera qualquer governo tem que entregar. E o resultado da Câmara nesses dois anos é de muita entrega. Isso está muito relacionado com a articulação que fizemos nesses dois anos, a boa relação que nós constituímos com o presidente da Câmara e o diálogo permanente entre o Poder Executivo e o Poder Legislativo. O Lula, o presidente Lula, tem esse reconhecimento. É sempre bom fazer o reconhecimento do papel do Legislativo. Todas as matérias que vieram para cá, e matérias muito difíceis de serem cotadas, da PEC da transição até agora, até agora, as medidas de ajuste, que nós vamos ter que votar grande parte delas até o final do ano. Sempre é no diálogo, é na constituição de consenso no dissenso. Portanto, o resultado é muito forte. Esse ano nós já votamos mais de 82 matérias de interesse do governo, só do ponto de vista de projetos de lei e medidas provisórias. E concluímos, agora há um mês atrás, a discussão da reforma tributária. Nós votamos tantas matérias importantes que seria impossível se imaginar que nós conseguiríamos esse alto índice de aprovação de matérias de interesse do governo aqui na Câmara dos Deputados.
ISTOÉ: No começo da gestão Lula, tinha muitas críticas sobre a articulação do governo, principalmente ao ministro Alexandre Padilha. Queria saber se essa relação entre Câmara, Congresso, no modo geral, Palácio do Planalto melhorou. Como estão as atualizações? A condução da articulação teve um aperfeiçoamento? Quais foram? E essa relação com o Congresso e o Palácio do Planalto?
JG: Importante sempre dizer que quando nós assumimos o governo, o governo tinha minoria completa aqui na Câmara. O governo não tinha maioria para conduzir a articulação política. Foi muito diálogo e muita parceria que nós fizemos entre o Poder Executivo e o Legislativo. E eu comandando aqui o Legislativo. Eu diria que nós estamos chegando ao final de 2024 numa paz profunda aqui dentro. As últimas decisões que nós tomamos, a bancada do PT com os aliados, a solução que nós encontramos para a sucessão do presidente Arthur Ira. Toda a articulação que fizemos mostra bem que o caminho escolhido foi isso, a consolidação da governabilidade aqui dentro. É claro que tem divergência, tem problemas, tem matérias que não há consciência nenhuma para serem votadas, mas naquilo que interessa ao governo, fundamentalmente na área da economia, nós já aprovamos todas as matérias solicitadas pelo ministro Haddad. Todas. Lá na PEC da transição, teto de gastos, alteramos, reforma tributária, novo regime fiscal. Nós fizemos tanta coisa que eu diria que não fizeram em 40 anos aqui no Brasil, depois da redemocratização, depois da Constituição de 1988.
ISTOÉ: É importante a gente falar sobre a transição aqui na Câmara dos Deputados. Ano que vem tem eleições e já tem um candidato favorito – que é o deputado federal Hugo Mota. A tendência é que ele mantenha a mesma linha do atual presidente Arthur Lira, que teve os seus percalços com o governo. O senhor acredita que a gestão de Mota vai dar governabilidade total ao presidente Lula? E quais são as expectativas dessa gestão?
JG: Nós estamos sempre avançando. Nós começamos em 2022, no finalzinho do ano, quando o Lula foi eleito. O presidente da Câmara votou em outro candidato em 2022. Todo mundo sabe disso. E nós iniciamos um movimento para consolidar uma relação de reconhecimento do papel Legislativo, uma relação civilizada que garantisse paz na relação e na governabilidade aqui dentro. Nem tudo foi céu de brigadeiro, evidentemente. Nós tivemos um momento de muita tensão aqui dentro, de muita divergência, de muito acirramento. Mas nessas horas sempre tem que prevalecer a humildade e o diálogo. Foi isso que eu fiz nesses anos todos, nesses dois anos. Cada um que assume o comando de uma casa como a Câmara, tem o seu estilo. Eu tenho o meu estilo, o ministro Padilha tem o dele, o Rui Costa tem o dele, o Haddad tem o dele. O que é importante é que nós fizemos uma importante articulação com o Mota e a nossa expectativa é que cada vez mais a governabilidade se estabeleça com maior força, com maior solidez, com maior parceria. E nós estamos terminando o ano com o Arthur Lira aqui. Eu tive uma longa conversa com ele ontem. Nós temos que comemorar muito o que nós aprovamos aqui para o governo.E às vezes até falam assim: “Ah, mas o PT, o Guimarães, eu escuto muitas vozes ‘do além’, às vezes pela mídia, dizendo que o Guimarães é ‘isso e aquilo’ porque é muito ligado ao Lira. Eu sou do governo. Ninguém lidera o governo se não tiver diálogo com o presidente da Câmara. Cada qual no seu, cada qual. Eu sou do PT, líder do governo. Portanto, foi fundamental essa relação que nós construímos, aberta de parceria, de franqueza. Sempre foi dito, “isso aqui dá, isso aqui não dá”. É isso que eu procuro fazer. E nós votamos tudo. Ainda ontem, nós votamos esses dias, duas matérias que em tempos pretéritos não se votava. A lei de cotas do Serviço Público, 30%. Eu tentei essa matéria há dois anos atrás, não dava nem para conversar sobre isso. Nós aprovamos semana passada. O reconhecimento da economia solidária votamos ontem, que é muito importante esse ramo da atividade econômica do Brasil, esse reconhecimento até para o governo poder fazer investimento, que hoje a economia solidária é importante do ponto de vista da gerar renda e oportunidade para os trabalhadores autônomos, aqueles que montam seus negócios. Portanto, a coisa está se consolidando muito. Eu penso que nós vamos chegar em 2026 numa alta e potente articulação do governo que seja capaz de garantir a reeleição do presidente Lula.
ISTOÉ: Entrando ainda nessa questão da presidência da Câmara, o presidente Arthur Lira é do Progressistas, e o futuro presidente, por enquanto Hugo Mota, é do Republicanos – que ainda tem uma divisão dentro do partido em relação a ser base ou ser oposição. O PT já foi muito forte para disputar uma presidência da Câmara dos Deputados. Nós tivemos João Paulo Cunha em 2003, Arlindo Quinalha, tivemos também o Marco Maia. Queria saber por que não houve o lançamento de uma candidatura própria do PT que tenta se fortalecer num momento como esse e se o senhor acredita que o PT perdeu a força aqui na Câmara dos Deputados a ponto de tentar uma candidatura própria.
JG: Não, nós não jamais iremos lançar a candidatura própria para ser derrotado. Você tem que partir de uma realidade fática que é o resultado das eleições. A Câmara, a maioria dela é conservadora. O eleitor escolheu os parlamentares, uns 513. Portanto, o PT elegeu 79 deputados e deputadas. O PL elegeu 99, hoje está com 90. Portanto, nós não tínhamos força para inventar uma candidatura como fizemos no passado. O PT pagou caro na época da Dilma porque se inventou uma candidatura para derrotar Eduardo Cunha. Aquilo teve consequências grandiosas para o processo de apartamento que houve entre o governo e o Congresso, especialmente a Câmara dos Deputados. Nós já valemos que o melhor caminho é esse. E eu digo que o PT hoje está no alto grau de protagonismo aqui dentro porque a negociação que a bancada fez pelo Líder Odair foi no sentido de, primeiro, garantir a governabilidade. Dois, as pautas do governo. Três, não discutir pautas na área de costumes para não ter acirramento aqui dentro. E os espaços que estão acordados para o PT. O PT vai sair de 2024, ainda mais 2025, com muita potência na capacidade política que a bancada teve de articular com essas forças aqui dentro da Câmara. Portanto, foi o melhor caminho. Unidade, até porque o Lula sempre disse, não vamos inventar a candidatura só para marcar a posição. Quem governa não pode fazer isso. Quem não tem compromisso com o país, tudo bem, pode lançar a candidatura. Tira voto, não tira a voto e fica de boa. Nós governamos o Brasil, nós temos que entregar. E para entregar depende daqui. Então, o grau de capacidade pública que nós temos aqui é fundamental para garantir as entregas do governo, como nós estamos fazendo. Ainda ontem nós votamos as três matérias fundamentais. Eu, na reunião com o presidente Tullio, negociando as matérias pelo celular, com o Arthur Lira lá. Economia e Solidariedade, nós votamos.O bioinsumos, que foi uma coisa fundamental, que altera a utilização exagerada dos produtos tóxicos na nossa agricultura, tanto para agronegócio como para agricultura familiar. Essas matérias todas nós votamos ontem. Então, eu sou muito otimista quanto aos resultados. É prático isso, não estou fazendo “firula”, não. O que nós votamos deu ao governo a governabilidade para consolidar os programas e projetos que nós votamos. Pé de meia, o novo ensino médio, reformulação do Bolsa Família, Minha Casa e Minha Vida, o Mais Médio. Rapaz, é tanta coisa. Isso do ponto de vista social. E do ponto de vista fiscal, nós aprovamos o novo regime fiscal e a reforma tributária, que foi o que deu equilíbrio, que tem relação com o que o Haddad anunciou ontem.
ISTOÉ: O ministro Fernando Haddad anunciou nesta semana o corte de gastos no governo. Na verdade, a contenção de gastos. Eu queria saber o que o senhor achou do texto, se acredita que essa é a solução para as contas do governo e se vota ainda neste ano.
JG: Primeiro, pela primeira vez, nós vamos fazer ajustes importantes na economia brasileira sem penalizar os mais fracos, os de baixo, o chamado andar de baixo. Vamos fazer um rearranjo e uma contenção de gastos e ajustando as políticas do governo sem retirar direitos. O mercado só ficava feliz com essas medidas que o Haddad anunciou se cortasse o Bolsa Família, desvinculasse a Previdência. É isso. Não tem como. Não tem como fazer isso. Então, pela primeira vez, nós vamos fazer uns ajustes importantes para a economia que vamos economizar sem retirar direitos, sem aumentar a carga tributária e sem tirar nenhum direito que já está consolidado. Primeiro, fazendo correção na tabela de impostos de renda no próximo ano. “Para compensar como, pessoal? De onde é que vai sair o dinheiro dessa renúncia?”. Os de cima tem que pagar. Tem muita gente que não paga impostos de renda no Brasil. Os que vivem da especulação. Segundo, fazer correções nos programas BPC, Bolsa Família, sem retirar nenhum direito, introduzir o sistema da biometria para dar transparência, porque o Brasil precisa de equilíbrio. Então, nós vamos fazer reforma do imposto de renda, do salário mínimo, abono salarial, nas emendas parlamentares que foram reduzidas em mais de 6 bi e na Previdência dos Militares sem precisar retirar nenhum direito. Essa foi a coisa mais importante do anúncio que o ministro Haddad fez, pedagogicamente, porque é isso que o Brasil precisa. Responsabilidade fiscal, mas responsabilidade social, porque o país é um país injusto. Uma parte tem quase tudo e outra parte não tem nada. Então, nós estamos recuperando a capacidade, inclusive, dessa gente que não teve que perder o direito nesses anos todos. Portanto, eu estou muito otimista e penso que dá para votar até o final do ano – a PEC e o PLP. A parte da reforma da renda é para o próximo ano. O projeto chega hoje, mas nós só vamos discutir em 2025 para ter efeito em 2026. Eu ouvi hoje de manhã um economista falando na CBN: “mas eu não acredito, é duvidoso se vai economizar e se esse ajuste vai dar70 bi em dois anos.” Mas veja era para fazer o quê? Quando nós começamos a discutir, a reforma tributária aqui na Câmara dizia assim “ah, não vai dar certo. Os interesses conflitantes dos entes federais não dá para votar.” Aquelas vozes que ficam só… Então, dá sim. Eu diria que é um ajuste humano. Todo mundo contribuindo. Eu acho que se a gente aprovar essa pauta, as duas matérias até o final do ano…esse é o desejo nosso, do governo e do presidente Arthur Lira.
ISTOÉ: Alguns líderes, eu até publiquei uma matéria na quinta-feira em relação a isso, alguns líderes acharam tímido o texto e falaram “ó, deveria ter tido mais cortes para justamente você cumprir a meta do arcabouço fiscal e consequentemente você ter maior tranquilidade para os próximos anos.” Eles falam que a meta desse texto apresentado pelo ministro Fernando Haddad dura dois anos, 2025, 2026. O senhor concorda com essa opinião? Acha que há um receio ou que eles estão ouvindo muito a situação que o mercado está colocando?
JG: O mercado é o mercado. A Faria Lima, ela não pensa o Brasil, pensa os interesses de lá. E alguns parlamentares, eu sei que tem relação com eles. Mas veja só: Começa em 2025 e vai até 2030. O total nesses anos todos, cinco anos, são 327 bilhões que o governo vai conter no gasto. Bom, aí é que outras medidas poderiam ser tomadas, né? Nós vamos discutir aqui. Se o pessoal achar que tem que avançar mais, podemos avançar. Mas o governo teve como uma média aquilo que não podia e aquilo que podia. Então foi no equilíbrio. No equilíbrio, sem aumentar a carga tributária. Vamos fazer a reforma sem aumentar a carga tributária. A reforma da renda que vai vir agora, no próximo ano, é a conclusão da reforma tributária. Um rearranjo para que todos paguem imposto de renda sem comprometer aqueles que ganham até cinco mil reais, que foi o compromisso. Aliás, ninguém pode dizer que há medida em tese mais forte do que essa. Então, ninguém pode reclamação, porque isso foi aprovado na campanha. É muito importante. O Lula defendeu isso na campanha e eles, a oposição, ficavam cobrando: “Ah, cadê o imposto de renda? Cadê a isenção?” Nós vamos efetivar para ter feito já em 2026. E vamos fazer a reforma da renda em 2025.
ISTOÉ: E além da questão da reforma da renda, quais são as prioridades de pautas para 2025?
JG: Essa é a prioridade das prioridades. Foi isso que o Lula nos pediu ontem. Como foi a PEC da transição há dois anos atrás. No final do ano sempre tem essas novidades, né? Segundo, a LDO e a LOA, que é importante. Resolver a bronca das emendas daqui para segunda-feira a gente resolve tudo no diálogo com o ministro Flavio Dino. Votar a PEC, o PLP, o lado de lei complementar, o LDO e a LOA. Isso do ponto de vista da Câmara. É claro que tem várias matérias que nós votamos que estão pendentes de votação no Senado. Mas acho que aqui nós vamos nessa linha. Prioridade das prioridades, todas as três semanas de segunda à sexta: pé em Brasília, votar as matérias e passarmos o Natal – pelo menos ter o direito de dar um “piruzinho” para brasileiros e brasileiras.
ISTOÉ: Só entrando nas eleições do PT, o senhor é colocado como candidato à presidência do partido. Até para deixar claro para quem está nos acompanhando no site da IstoÉ, eu queria saber sobre a questão do nome do senhor, que foi colocado como um dos favoritos [à presidência] por conta também da vitória do prefeito de Fortaleza, a única capital. Queria saber se o senhor se reafirma que é candidato à presidência do partido e quais são as missões do PT para os próximos anos, visto que o partido, embora tenha aumentado o número de prefeituras, só conseguiu uma capital, sendo que foi já um partido que conseguiu grandes capitais em uma época passada. O que aconteceu com o PT para ele não conseguir essas coisas?
JG: Primeiro, o PT está em um processo de reconstrução. Todo mundo sabe que foi feito em 2017, 2018. O impeachment da Dilma, afastaram a Dilma. Eu nunca vi afastar uma presidenta que não tem um processo. A Dilma não tem nenhum processo. Prenderam o Lula, derrotaram o Haddad. Parecia o fim do mundo para o PT, porque eles pregavam que o PT estava definitivamente no seu fim. Outros partidos naufragaram, é verdade. Nós não, o PT ressurgiu, Lula é eleito presidente e estamos em um processo de reconstrução. O resultado não foi, evidentemente, o resultado para o tamanho do partido que governa o Brasil. Mas nesse processo de reconstrução foi o resultado. Nós não tínhamos nenhuma capital. Você vê que, é verdade, nós já governamos quatro capitais importantes, até São Paulo. Com as derrotas e aquilo que foi feito do ponto de vista de penalizar o PT e sacrificar o PT e derrotar o PT, nós estamos em um processo de reconstrução. Então, eu acho que isso é fundamental, fazer esse reconhecimento. E o papel da presidenta Gleisi foi fundamental. Então, essa reconstrução teve esse resultado. Nós aumentamos, evidentemente, um aumento de vereadores e prefeitos, um aumento ainda tímido, mas eu penso que é um processo lento, gradual e seguro. Nós estamos conversando sobre o PT para discutir o seu futuro. Tem muitas coisas que precisam ser revistas dentro do PT e acho que uma das coisas que é fundamental na nova direção do PT, primeiro, é a identidade que ele tem com os programas do governo. Segundo, compor uma direção que dialogue com o país e com a base do PT. No meu estado, por exemplo, nós elegemos 47 prefeitos e prefeitas. Onde nós perdemos a militância, voltou. E essa militância precisa ter espaço no PT. Surgiram muitas lideranças novas. Por exemplo, eu cito o Nordeste, a menina de Natal quase ganha a eleição, o menino de Teresina quase ganha a eleição, em Fortaleza, do Evandro. Então, surgiu um time novo do PT que nós temos que valorizar. A nova direção precisa se dar conta disso. A direção tem que dialogar com a base, tem que potencializar a base do PT, envolvê-la nos destinos do partido, fazer formação política, presença nos estados e preparar o partido para o grande enfrentamento de 2026 com a reeleição do Lula. Esse tem que ser o compromisso, quem vai assumir a direção do PT. É claro que tem alguns companheiros que defendem muito que a presidenta Gleisi coordene o processo e ela está dialogando comigo, na hora certa nós vamos bater o martelo. O que todo mundo sabe é do meu compromisso com o PT. Não farei nada para contrariar – na sucessão da presidência – primeiro a Gleisi, segundo o presidente Lula. Tudo tem que ser feito em entendimento. E se tiver entendimento, eu nunca fugi de missões.
ISTOÉ: Essa primeira questão que o senhor citou sobre o fortalecimento. O que é necessário para o PT conversar com a base? Porque muitas pessoas com quem eu conversei dentro do partido falam que o PT perdeu um pouco de sentido. O PT precisa sinalizar mais ao centro? De que forma ele precisa conversar mais a militância? Que ele precisa para se reconstruir?
JG: O PT já está se reconstruindo. Acho que é um processo lento, gradual e seguro. O PT não precisa mudar de lado e ir ao centro para poder se consolidar, não. O PT tem que se reconectar com a sua base e com o país real. O jeito de fazer isso é melhorando, enfrentando o advento da comunicação, que hoje é muito grave. Nós estamos ainda no sistema analógico. Todo mundo sabe disso e nós temos que melhorar bastante isso. E o que eu defendo é que o governo, o PT, tem que defender o seu lado e do jeito que é, se reconectando com o país e com a nossa base…fazer uma aliança, agregar o centro para 2026. Não é o PT ir para o centro, não concordo com isso. O PT tem que ser o partido que é. É um partido de esquerda. E faz aliança com o centro para governar. É isso que nós vamos fazer com o presidente Lula em 2026. Eu defendo que o Lula em 2026 construa um arco de alianças grande, trazer, atrair todo o centro para governar. Acho que a reformulação que o governo tem que fazer é essa.
ISTOÉ: Pra gente encerrar, o Partido dos Trabalhadores é dos trabalhadores E das trabalhadoras. Só que tem um ponto que muitos dentro do partido falam: o PT não se comunica mais com esse público de trabalho. Principalmente porque, embora defenda o CLT, hoje nós temos o “pejotismo” muito forte.
JG: E os trabalhadores de aplicativos que não querem mais não ter carteira assinada. Esse novo mundo do trabalho, nós precisamos debater também. Aí é um problema do governo. O Brasil, a economia brasileira é outra. O PT nasceu do chão da fábrica. O chão da fábrica encolheu. E hoje é outro mundo que nós estamos vivendo hoje. Então o PT tem que discutir isso. Eu não tenho receita pra isso.
ISTOÉ: Mas como?
JG: Aí nós vamos ter que discutir muito. Nós vamos ter que pensar que tipo de regulamentação é importante para que esses trabalhadores tenham algum direito, porque eles são tratados como escravos. São escravizados. Eu conheço muita gente que trabalha nesses aplicativos e é desumano. Então nós vamos ter que pensar. Eu acho que a sociedade brasileira mudou muito. O Brasil hoje é outro mundo e nós temos que pensar bem como nos reconectarmos com essa nova realidade econômica e do mundo do trabalho brasileiro.
ISTOÉ: A PEC 6×1 é um caminho?
JG: Eu concordo que nós temos que aproveitar essa ideia da deputada e do Reginaldo e discutir, sim, a jornada. Nenhum país moderno, as economias mais modernas do mundo, não tem uma jornada tão sacrificante como essa. Não é possível. Então eu acho que esse é o problema: toda vida que você vai discutir um direito, o “andar de cima” diz que não pode. Tem que poder, tem que ceder. Então eu acho que essa discussão da nova jornada é fundamental e só com o debate que surgiu já dá para a gente fazer uma grande “consertação”, restabelecendo uma jornada digna, humana, para dar condições para as pessoas viverem como gente e não como escravo.