Algumas semanas atrás, milhões de habitantes de São Paulo sofreram com uma pane elétrica que deixou boa parte da cidade sem luz por dias. Maior região metropolitana do Brasil, São Paulo também concentra grande parte dos datacenters do País. Mas, diferentemente de você e do seu vizinho, os datacenters não ficaram um segundo sequer sem eletricidade. Para entender melhor como isso ocorre, conversamos com Marcos Siqueira, VP de Operações da Ascenty. A empresa tem 24 datacenters no Brasil, 17 destes no estado de São Paulo. Confira a entrevista.

Recentemente tivemos um grande problema de falta de energia em São Paulo, com locais ficando sem luz por dias. Além disso, estamos vivendo o ano mais quente da história. Como os administradores de datacenter lidam com estas situações?

Quando construímos um novo datacenter, levamos alguns aspectos em consideração. Um deles é a localização, do ponto de vista de riscos, como chances de desmoronamento, terremoto etc. Não se constrói datacenter próximo de gasodutos ou rios, por exemplo.

Uma vez eliminados os aspectos de risco, partimos para uma análise mais detalhada do terreno, incluindo aí a questão da qualidade do solo e da oferta de energia elétrica no local. Além do espaço usado para os equipamentos, o datacenter precisa de uma grande área para geradores, tanques para armazenar diesel, no-breaks e também um grande espaço para uma subestação elétrica.

No caso dos geradores, embaixo de cada um há um tanque de diesel pequeno. Este tanque pequeno, por sua vez, se comunica com um tanque bem maior, com capacidade na casa dos 30 mil litros, em alguns casos. Esse grande tanque fica longe do gerador. Isso permite que o tanque seja abastecido com segurança enquanto o gerador está em funcionamento.

Há ainda equipamentos para movimentar o diesel dentro do tanque. Pois se o combustível fica parado por muito tempo, ele perde eficiência.

Cada ambiente do datacenter, que chamamos de halls, tem três geradores conectados, Precisamos de apenas um para manter tudo funcionando, mas por questão de segurança temos dois a mais.

Marcos Siqueira, VP de Operações da Ascenty (Crédito:Divulgação)

Mas os geradores apenas entram em funcionamento em emergências, certo?

Sim. Embora estejamos preparados para funcionar apenas com eles, a regra é usar a energia que vem pelas linhas elétricas. É mais barata e obviamente mais sustentável. Por isso, os datacenters contam suas próprias subestações elétricas.

No caso da Ascenty, todos os data centers têm subestações de energia próprias, ligadas às linhas de alta tensão da infraestrutura de energia nacional. Trabalhamos com as concessionárias de energia e com a Aneel para ter as devidas licenças para construir essas subestações.

Por isso, nossa operação não foi impactada de nenhuma forma pelos recentes problemas de queda de energia em São Paulo. Em nosso caso, só uma instabilidade nessas grandes linhas de alta tensão pode causar um incidente que ative os geradores.

O Brasil é recordista mundial em incidência de raios. Isso de alguma forma impacta a operação dos datacenters?

Sim, trabalhamos também com isso em mente ao construir o datacenter. Pois obviamente não há como prever onde e quando um raio vai cair. E o potencial de dano é enorme.

Por isso, temos equipes, câmeras e outros equipamentos para monitorar onde e quando o raio caiu, e também medir a intensidade da descarga elétrica. Em média, cada datacenter nosso possui cerca de 400 câmeras.

Por meio dessas medições, conseguimos saber se houve alguma variação de tensão em algum equipamento do datacenter após a queda de raios. Além disso, claro, temos toda a infraestrutura de aterramento para as instalações.

E quanto ao aumento das temperaturas?

Os data centers precisam refrigerar os equipamentos nas temperaturas adequadas, e para isso há sistemas que inserem ar frio nas intalações e removem o ar quente. Quando você tem uma temperatura externa muito alta, você começa a ter um pouco mais de dificuldade nessa troca de calor.

Em altas temperaturas, o ar frio que vai para o datacenter já começa a chegar não tão frio. Então já precisamos esfriar os equipamentos de troca de calor que estão fora do datacenter.

Ainda sobre aquecimento, vemos que, com o crescimento de aplicações de IA generativa, o consumo de energia dos datacenters vem aumentando, e em consequência o calor gerado pelos servidores. Em resposta a isso, algumas empresas começam a usar o liquid cooling – sistema que usa líquidos para refrigerar processadores e outros componentes – em suas instalações. Como a Ascenty vê essa tendência?

Atualmente não temos liquid cooling em funcionamento nos nossos data centers. Mas todos eles já estão preparados para receber essa tecnologia.

Em muitas instalações já temos racks de servidores operando a 30 KVA, uma potência muito alta. E já temos projetos em que o consumo deve subir para 50 KVA. Então sim, estamos bem próximos de já começar a usar equipamentos de liquid cooling no futuro.