Filha de pai e mãe com ensino fundamental incompleto, a estudante de publicidade Sabrina Mayara Soares de Alencar, de 23 anos, aposta na conclusão da faculdade para conseguir uma renda melhor no futuro. Ela sabe, porém, que sua trajetória não é regra, mas exceção. Entre seus conhecidos, é uma das poucas a conseguir subir o “degrauzinho” do ensino superior. “É muito difícil, principalmente para quem mora na minha cidade, a renda é muito baixa”, conta a estudante, que mora em Itapoã, uma das regiões com menor renda per capita do Distrito Federal.

Ao concluir o curso de publicidade, a hoje estudante estará no pequeno grupo de 14,9% de filhos que completam essa etapa e têm pais com fundamental incompleto, segundo dados do recém-criado Instituto Mobilidade e Desenvolvimento Social (IMDS). Pela “lógica” da realidade brasileira, o mais provável seria que ela ficasse pelo meio do caminho, prejudicando não apenas suas próprias chances de ganhar mais, mas também reduzindo o potencial de crescimento da economia como um todo.

Os dados mostram que a situação se agrava quando se considera a população negra. Entre filhos de pais sem instrução, a chance de terminar o ensino superior é de 6,2% para brancos e 3,7% para negros. Mesmo entre filhos de pais com ensino superior completo, a proporção de quem repete o feito é de 71,7% para brancos e de 58,8% para negros.

Para dar esse passo na escalada social, Sabrina começou a trabalhar aos 15 anos, como estagiária, e seguiu como jovem aprendiz em uma agência de publicidade após concluir o ensino médio. A pausa nos estudos foi estratégica para conseguir se preparar financeiramente e pagar a própria faculdade, a partir deste ano. A mensalidade, já com um desconto obtido com uma bolsa parcial, fica em torno de R$ 320 por mês.

Hoje, Sabrina trabalha com carteira assinada como assistente de faturamento na mesma agência de publicidade onde era jovem aprendiz. Ela diz ter convicção de que o ensino superior lhe dará melhores condições de competir no mercado de trabalho.

Melhores gastos

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Para o economista Paulo Tafner, diretor-presidente do IMDS e responsável pelo levantamento, o problema da mobilidade social não está restrito à questão racial, uma vez que atinge também brancos pobres. “Mas, obviamente, que no caso dos negros é um pouco mais grave”, afirma ele.

O aumento nessa mobilidade social passa, segundo Tafner, pela formulação de políticas que melhorem a efetividade do gasto com educação, saúde e assistência. Ele cita a experiência do Ceará como um exemplo positivo: o Estado passou a ter maior supervisão do aprendizado dos alunos e recompensar bons desempenhos. O problema é que essa não é uma regra no restante das escolas brasileiras.

“Uma criança falta à escola e não há movimento de ir cobrar os pais. Só que ele (aluno) pode estar doente ou se envolvendo no crime”, afirma. Em sua visão, é preciso promover a busca ativa dos estudantes, assim como trabalhar no aconselhamento dos alunos para prevenção de comportamento de risco – que possa resultar em gravidez precoce ou envolvimento com o crime, por exemplo.

“Tem locais em que 30% dos jovens não estudam nem trabalham. Ele, então, vira um adulto pobre”, diz Tafner, ressaltando que esse indivíduo acaba ficando dependente de transferências de renda para conseguir sobreviver.

Se a baixa mobilidade social é obstáculo para a ascensão, ela também serve de trava para uma queda dos mais ricos. “No caso do Brasil, tudo leva a crer que a migração do 1% mais rico é muito baixa. Significa dizer o seguinte: são basicamente as mesmas famílias que controlam a riqueza e os acessos há décadas, e isso não é bom. O bom é ter mobilidade”, afirma o economista.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.


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