A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal sabatina nesta quarta-feira, 21, o desembargador Kássio Nunes Marques, escolhido pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) para a vaga aberta no Supremo Tribunal Federal (STF) com a aposentadoria do decano Celso de Mello.

Regras

Os senadores poderão fazer perguntas ao indicado do presidente e, na sequência, decidem internamente, entre os membros da comissão e mediante votos secretos, se aprovam o nome. Se passar pelo crivo da CCJ, Kássio Nunes precisará da maioria absoluta dos votos dos senadores (41 dos 81) no plenário para que sua nomeação seja confirmada.

Os requisitos para assumir uma vaga no Supremo Tribunal Federal estão previstos no artigo 101 da Constituição Federal e incluem estar em plena posse dos direitos políticos, ser maior de 35 anos e menor de 65 anos, ter ‘reputação ilibada’ e ‘notório saber jurídico’. Apesar das condições expressas, não há uma regra sobre as perguntas a serem colocadas pelos senadores ou sobre o formato de sabatina. O último ministro a passar pela CCJ foi Alexandre de Moraes, indicado pelo ex-presidente Michel Temer, em sabatina que durou cerca de 11 horas.

“Embora os critérios constitucionais sejam expressos, a aprovação pelo Senado é um ato político e as perguntas não são pré-definidas. Historicamente, sabe-se que as questões são das mais variadas naturezas”, explica o advogado Saulo Stefanone Alle, especialista em Direito Constitucional do Peixoto & Cury Advogados.

Inconsistências no currículo

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A expectativa é que a polêmica recente em torno das credenciais acadêmicas do desembargador não passe em branco. Marques cita em seu currículo um curso de pós-graduação que a Universidad de La Coruña, na Espanha, nega existir. Segundo a instituição europeia, a única ligação de Kassio Marques com a universidade foi a participação, como ouvinte, em um curso de quatro dias. Além disso, o magistrado usou trechos idênticos de artigos acadêmicos em sua dissertação de mestrado.

Os questionamentos já chegaram ao conhecimento do desembargador que, nos bastidores, é tido como um homem tranquilo e resistente a provocações. Em uma audiência virtual com senadores no início do mês, ele chegou a fazer comentários aos parlamentares sobre os cursos de pós-graduação. Segundo um senador presente na reunião, Kássio Nunes teria demonstrado preocupação com a repercussão que o tema poderia ganhar, mas disse aos parlamentares que, caso houvesse qualquer polêmica, já tinha as justificativas.

“Inicialmente, as perguntas girarão em torno do seu currículo, em razão do imbróglio recente, além de explorarem principalmente o “tamanho” dos seus conhecimentos jurídico-constitucionais, ou seja, se ele está preparado acadêmica e empiricamente para encarar processos de natureza complexa e extremamente diversificados nas diversas áreas do direito, especialmente as ações constitucionais”, avalia Vera Chemim, especialista em direito constitucional e mestre em direito público administrativo pela FGV.

Perguntas

Especialistas ouvidos pelo Estadão também apostam em questionamentos para medir o perfil do possível futuro ministro sobre temas sensíveis. Nesse sentido, devem aparecer perguntas sobre foro privilegiado, prisão após condenação em segunda instância, descriminalização do aborto, porte de drogas, combate à corrupção e Operação Lava Jato.

Com o julgamento recente sobre a soltura do narcotraficante André do Rap, o desembargador também deve ser confrontado sobre a aplicação do artigo 316 do Código de Processo Penal, em sua redação atual, para a revogação das prisões preventivas.

Há expectativa ainda sobre o destino do inquérito que apura se o presidente Jair Bolsonaro tentou interferir politicamente na Polícia Federal para blindar aliados e familiares de investigações. O caso era conduzido na Corte pelo decano Celso de Mello. Com a aposentadoria, a regra é que o sucessor da cadeira assuma os processos. Contudo, há quem defenda que Kássio Marques, por ter sido indicado por Bolsonaro, deva se declarar impedido para cuidar do caso.

Perfil

Piauiense, o desembargador Kássio Nunes Marques tem perfil discreto. Entre os colegas no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) é tido como uma pessoa simples, humilde, comedida e conhecida pela produtividade.

“No que se refere aos resultados dos julgamentos com o ingresso do novo ministro, a julgar pelo seu perfil supostamente conservador, ele contribuirá para a não aprovação de temas que contrariem o mainstream no âmbito do Direito brasileiro”, avalia Vera Chemin.

Para Paula Sion, sócia do Cavalcanti, Sion e Salles Advogados, ainda é difícil prever os posicionamentos do possível substituto de Celso de Mello.


“A chegada de um novo membro no STF, ainda mais para substituir o insubstituível ministro Celso de Mello, é para mim uma grande incógnita e prefiro não fazer exercício de futurologia. Em que pese estar sendo apresentado como um magistrado garantista, fato é que ele não julgava casos criminais no TRF1, então fica difícil advinhar como serão os seus posicionamentos nesta seara”, opina a advogada.


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