Por Roberto Samora

SÃO PAULO (Reuters) – As importações de fertilizantes pelo Brasil em patamares recordes, com produtores e indústrias acelerando as compras em meio a preocupações com a oferta global, permitirão que agricultores tenham adubos, ainda que mais caros, para aplicar na atual temporada 2021/22, segundo especialistas.

Mas os temores do setor privado e do governo com a oferta de fertilizantes no país, que está importando mais de 80% de sua necessidade neste ano, justificam-se para a próxima temporada de grãos, em 2022/23, que começa a ser plantada em setembro do próximo ano, avaliaram a Agroconsult e a estatal Conab.

Caso essa menor disponibilidade de adubos se acentue –enquanto países produtores de fertilizantes, como a China, restringem a oferta–, o ritmo de expansão da agricultura perderia velocidade, após elevados investimentos do setor para ganhar área e produtividade em 2021/22, avaliou a Agroconsult.

Segundo o sócio-diretor da consultoria André Pessôa, a oferta de fertilizantes será suficiente para a lavoura brasileira de soja 2021/22, cujo plantio caminha para o final, e mesmo a segunda safra de milho e de algodão deverá ter adubos suficientes, apesar dos preços mais altos.

“Para a safrinha (segunda safra milho) de 2022 vamos passar bastante apertado, mais vai chegar adubo, vai ser entregue, tem um line-up (programação de importação) gigantesco de adubo para as próximas semanas para a safrinha brasileira….”, disse ele.

Mas ele vislumbra problema para a safra de verão 2022/23.

“Tenho até dito para os produtores que o problema já deixou de ser preço, hoje é garantia da disponibilidade… Os custos já aumentaram e vão continuar elevados. E isso vai reduzir a velocidade de expansão da agricultura brasileira na safra 22/23”, ressaltou o consultor, durante evento da associação de exportadores de cereais Anec, na quinta-feira.

Segundo ele, em 2022/23 a área plantada com a soja brasileira não deve ter o mesmo crescimento de mais de 1,5 milhão de hectares, ou mais de 4%, verificado em 2021/22, assim como o milho e o algodão vão perder ritmo.

“Vamos diminuir o ritmo de expansão na safra 22/23, ainda com preços internacionais bons, os preços (dos grãos) lá fora não estão tão ruins, combinados com câmbio desvalorizado, deveriam permitir a sequência de três anos muito favoráveis.”

A dependência das importações e restrições de oferta têm movimentado o governo. O presidente Jair Bolsonaro se manifestou o assunto nos últimos dias após a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, ter se encontrado na Rússia com produtores em tentativa de garantir o fornecimento.

IMPORTAÇÃO RECORDE

A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) ressaltou que as importações do Brasil estão em patamares recordes no acumulado do ano de janeiro a outubro, somando 33,8 milhões de toneladas, aumento de cerca de 22% ante o mesmo período de 2020 e já um volume histórico se comparado com anos completos.

E o total importado neste ano poderia se aproximar de 40 milhões de toneladas, concordou o superintendente de Logística da Conab, Thomé Guth, considerando desembarques de 3 milhões de toneladas já registrados este mês, até a terceira semana.

“Em termos de oferta para a safra 2021/22, a situação está equacionada, o custo está bem mais alto, tem elevação significativa, mas em termos de abastecimento, até pelo nível de importação, falta de adubo não teremos”, disse ele, à Reuters.

Guth comentou que produtores estão buscando alternativas para diminuir custos logísticos, como importação pelos portos do Arco Norte do país. Isso acontece pela possibilidade do chamado frete de retorno –sobe o grão e desce o fertilizante.

De janeiro a outubro, a importação pelo Arco Norte aumentou quase quatro vezes ante mesmo período de 2020, para 2,4 milhões de tonelada, com investimentos permitindo a nova logística.

Guth também avaliou que a oferta de adubo para safra que será plantada no ano que vem merece atenção. “É um ponto de alerta, um sinal amarelo no horizonte para o produtor ter a sabedoria de antecipar processos…”

Um agravante da situação da oferta, frisou ele, decorre do fato de o fertilizante ser um produto que, se armazenado por muito tempo, pega umidade, causando o empedramento e problemas para a qualidade. Isso limitaria uma antecipação ainda maior de aquisições.

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