O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) deve discursar na tarde deste domingo, 25, em um ato convocado após ele se tornar alvo de investigação sobre tentativa de golpe de Estado. A manifestação vai ocorrer na Avenida Paulista, em São Paulo, uma via pública conhecida como palco de atos políticos – e não será a primeira vez que bolsonaristas ocuparão o local para um protesto. Na última vez em que esteve presencialmente na Paulista, em 7 de setembro de 2021, o então presidente também fez uso da palavra e, com o discurso que proferiu, deflagrou uma crise institucional.

No feriado de Independência daquele ano, Bolsonaro subiu ao palanque da manifestação na Paulista e chamou o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes de “canalha”, prometendo aos apoiadores presentes naquela ocasião que “não mais cumpriria” medidas do magistrado. Ele ainda atacou o sistema eleitoral e disse que não aceitaria o resultado das eleições de 2022 se não houvesse voto impresso.

À época, Moraes já era relator de inquéritos que miravam pessoas próximas ao então presidente, inclusive seus filhos, como os inquéritos das fake news e dos atos antidemocráticos. Em 2020, o ministro também suspendeu a nomeação de Alexandre Ramagem para o comando da Polícia Federal (PF), por suspeita de interferências de Bolsonaro na autonomia da corporação.

O discurso de teor antidemocrático na Paulista levou a uma reação imediata do STF e o principal “bombeiro” da crise, como é chamada no jargão político a pessoa que atua para apaziguar os ânimos em um momento de tensão institucional, foi o ex-presidente Michel Temer (MDB).

O que disse Bolsonaro na Avenida Paulista

Na manhã de 7 de setembro de 2021, Bolsonaro participou de agenda oficial em Brasília (DF). Durante uma cerimônia simbólica de hasteamento da bandeira no Palácio do Alvorada, morada oficial da Presidência, Bolsonaro queixou-se de interferência do Supremo em suas atribuições, dizendo que o STF deveria se “enquadrar” em suas próprias atribuições”. “Ou o chefe desse Poder (STF) enquadra o seu ou esse Poder pode sofrer aquilo que nós não queremos”, afirmou o então chefe do Executivo.

Pela tarde, o presidente compareceu à Paulista, tomada por uma passeata pró-governo e, do palanque, subiu o tom do discurso. “No nosso Supremo Tribunal Federal um ministro ousa continuar fazendo aquilo que nós não admitimos, um ministro que deveria zelar pela nossa liberdade, pela democracia, pela Constituição e faz exatamente o contrário. Ou esse ministro se enquadra ou ele pede pra sair”, afirmou aos milhares de apoiadores.

“Não podemos admitir que uma pessoa, um homem apenas, turve a nossa democracia e ameace a nossa liberdade. Dizer a esse indivíduo que ele tem tempo ainda para se redimir. Tem tempo ainda para arquivar seus inquéritos”, começou Bolsonaro, mas, ao ouvir vaias do público, recuou e disse que “o tempo” de Moraes tinha acabado. “Sai, Alexandre de Moraes, deixa de ser canalha!”, disse.

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“Nós devemos, sim, porque eu falo em nome de vocês, determinar que todos os presos políticos sejam postos em liberdade. Dizer a vocês que qualquer decisão do senhor Alexandre de Moraes, esse presidente não mais cumprirá”, ameaçou o então presidente.

Bolsonaro seguiu fazendo ataques ao Judiciário, especialmente ao então presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luís Roberto Barroso, mas sem citá-lo nominalmente. Ao criticar o sistema eleitoral brasileiro e as urnas eletrônicas, o presidente afirmou que não participaria do que chamou de “uma farsa patrocinada pelo presidente do TSE”. E repetiu que não ia “aceitar” o resultado das eleições de 2022 “sem voto impresso e contagem pública de votos”.

Temer foi ‘bombeiro’ da crise e ajudou a retomada de relações entre Bolsonaro e STF

A fala deflagrou uma crise entre as instituições políticas. No STF, a reação veio em ato contínuo. O ministro Luiz Fux, então presidente da Corte, abriu a sessão do dia seguinte com a leitura de uma nota de repúdio ao discurso de Bolsonaro.

Até o ex-presidente Michel Temer, então afastado da vida pública, foi convocado para atuar nos bastidores. Bolsonaro acionou o ex-chefe do Executivo pela proximidade dele com Alexandre de Moraes, nomeado para o Supremo por indicação do emedebista.

Temer auxiliou Bolsonaro na redação de uma réplica ao Supremo e, em 9 de setembro, foi divulgada a “Declaração à Nação”, documento em que o presidente recuava nas investidas contra o Judiciário. Além da ajuda textual, Temer, intermediou um telefonema de desculpas entre Bolsonaro e Moraes.

Bolsonaro ‘voltou’ à Avenida Paulista em chamada de vídeo

O ato de 7 de setembro de 2021 foi a última participação presencial de Bolsonaro em uma manifestação pública na Avenida Paulista, mas no feriado de 1º maio de 2022 ele voltou a participar de um protesto no local – dessa vez por meio de uma chamada de vídeo.

O ato tinha como foco defender o deputado bolsonarista Daniel Silveira (PTB), condenado a prisão pelo STF por ataques antidemocráticos ao Tribunal, a seus ministros e à democracia.

Já pré-candidato à reeleição, Bolsonaro afirmou que o ato, que envolveu duras críticas ao STF e pedidos do público por intervenção militar, era em defesa da “Constituição, da família e da liberdade”. “Satisfação muito grande poder cumprimentá-los nessa manifestação pacífica em defesa da Constituição, da família e da liberdade. Devo lealdade a todos vocês, temos um governo que acredita em Deus, respeita os seus militares , defende a família e deve lealdade ao seu povo”, disse.