A Argentina experimentou um aumento nos feminicídios durante 2023, um total de 322, equivalente a quase um assassinato por dia, deixando cerca de duzentos órfãos, de acordo com as últimas estatísticas da Defensoria do Povo da Nação.

Os dados surgem enquanto o Congresso debate uma polêmica reforma das leis de gênero impulsionada pelo presidente de extrema direita Javier Milei, após a eliminação do Ministério das Mulheres e Diversidade de Gênero do governo.

O número de assassinatos de mulheres por razões de gênero é “alarmante” e supera até mesmo as cifras de 2020, ano marcado pela pandemia de covid, quando foram registrados 295 feminicídios, avaliou o órgão oficial.

“A violência de gênero está na agenda pública, nas mesas das famílias, mas as práticas culturais continuam sendo machistas e patriarcais. O Estado deve investir muito mais em prevenção, não se retirar”, disse Fernanda Tarico, da Shalom Bait (Paz no Lar, em hebraico), à AFP.

Quase 60% das vítimas foram assassinadas em suas residências, locais de trabalho ou em moradias compartilhadas com os agressores. Em três a cada quatro casos, havia uma relação preexistente entre a vítima e o agressor, detalhou a Defensoria argentina.

O governo de Milei, que defende que “a violência não tem gênero”, incluiu em seu projeto de “Lei Ônibus” (uma extensa lei de reformas em diversos temas) alterações na chamada Lei Micaela, aprovada em 2019, que obriga o Estado a capacitar funcionários de todos os níveis dos três poderes sobre questões de gênero e violência contra as mulheres.

A reforma de Milei propõe capacitações sobre “violência familiar” e restringi-las aos órgãos competentes na questão.

A modificação é “grave” porque “afeta o sentido da lei”, questionou publicamente a Fundação Micaela García, que leva o nome de uma menina vítima de feminicídio em 2017, cujo caso acelerou o debate e a aprovação da legislação vigente.

A reforma impulsionada por Milei, segundo Tarico, “é fruto da absoluta ignorância, da falta de reconhecimento do problema que implica que um juiz, forças de segurança ou pessoal do Estado façam intervenções irresponsáveis”.

O secretário de Infância, Adolescência e Família, Joaquín Torre, afirmou no Congresso que a Lei Micaela “é nobre, mas não deu resultado. Temos mais mortes do que antes e investimos milhões”.

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