Em meio a caos fiscal, BC sinaliza que alta de juros deve ter chegado ao limite

Diretores que integram o Copom sinalizam uma parada no ciclo de sete altas consecutivas da Selic, referência para economia. Postura do BC favorece balanço entre ganhos para o controle dos preços e perdas com aumento do custo da dívida pública, num momento em que o governo tem dificuldade de fechar as contas do ano

Marcelo Camargo/Agência Brasil
Gabriel Galípolo Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Com a taxa de juros em 15% ao ano, no maior patamar dos últimos 20 anos, o Banco Central, presidido por Gabriel Galípolo, muito pouco pode fazer adicionalmente para tentar derrubar a inflação que, em 12 meses, está acumulada em 5,32% para a meta de 3%. A decisão dos diretores que integram o Copom de sinalizar, nesta quarta-feira, 18, uma parada no ciclo de sete altas consecutivas da taxa Selic, referência para economia, é um caminho para minimizar os danos. No comunicado, eles argumentam que devem esperar para ver o impacto dos aumentos já realizados se materializando na economia o que, também, pode ser traduzido como um freio de arrumação para um balanço entre ganhos para o controle dos preços e perdas com aumento do custo da dívida, num cenário de caos fiscal.

O BC aumenta os juros de olho na trajetória da inflação futura. Esse é o mandato legal. Cada elevação demora entre três e seis meses para começar a surtir efeito na vida real e o impacto pleno leva até 18 meses para acontecer. O que significa que a economia começou a refletir a alta realizada em dezembro no último trimestre e que o ciclo de elevação dos juros atual ainda irá mostrar o seu valor no final do ano que vem.

O mercado de crédito é um dos principais canais de transmissão da política monetária para a economia. Pela teoria, a alta de juros eleva o custo dos empréstimos, dos investimentos para aumentar a produção, o que contribui para redução do nível de emprego e do consumo, freando a atividade econômica.

Mesmo com a Selic subindo em sete reuniões consecutivas do Copom, os diretores destacam que “o conjunto dos indicadores de atividade econômica e do mercado de trabalho ainda tem apresentado algum dinamismo”. Observam certa moderação no crescimento e que a inflação recente e as expectativas do mercado financeiro ainda seguem acima da meta de 3%. Os economistas e analistas preveem inflação de 5,2% para 2025 e 4,5% para 2026. O BC projeta 4,9% e 3,6% , respectivamente. Além disso, outro risco destacado pelo Copom é “uma desancoragem das expectativas de inflação por um período mais prolongado”. E quando os agentes econômicos acham que o IPCA (índice oficial) não vai ceder, eles acabam alimentando mais inflação no curto prazo, num ciclo vicioso.

Mas a alta de juros tem ainda um outro lado: faz subir o custo para o governo rolar a dívida pública. E, com juros a 15% ao ano, a brincadeira começa a ficar muito cara. Com isso, se as expectativas para a inflação ainda não melhoraram o suficiente, a desaceleração da economia está mais lenta, os preços seguem pressionados, em especial do setor de serviços (que responde fortemente à demanda da população) e a dívida pública se avoluma numa proporção arriscada, os diretores sugerem uma parada técnica para ver se os ganhos com a política monetária restritiva se confirmam.

Embate entre governo e Congresso
Enquanto isso, o Banco Central ganha tempo para avaliar a evolução do embate fiscal entre governo e Congresso. A crise para arrumar novas receitas e cortar velhos gastos vem num crescente há semanas e gerando desdobramentos que podem criar mais problemas em vez de soluções, como aconteceu com a derrubada pelos parlamentares de vetos do presidente Lula aprovados no Congresso. A Abrace, associação dos grandes consumidores de energia, estima que o impacto dos vetos derrubados será de R$ 197 bilhões até 2050, sendo que parte de custo será pago pelos brasileiros na conta luz, já que mudam os incentivos a projetos de geração de energia limpa.

O governo corre contra o tempo. Precisa arranjar dinheiro para recompor perdas de arrecadação e fechar as contas em 2025. Além disso, até o final de agosto, deve mandar para o Congresso a Lei Orçamentária para 2026. No meio disso tudo, estão em jogo as eleições de 2026, quando Lula deverá concorrer à reeleição ou indicar um candidato a sucessor. E, aí, a coisa complica ainda mais. Boa parte do caos fiscal veio de mais gastos do próprio governo. Além disso, enquanto o BC tenta frear a economia, o ministro Fernando Haddad (Fazenda) e seu time turbinam o consumo com medida de estímulo ao crédito mais barata para trabalhadores.

O BC não tem nenhuma ingerência sobre a política fiscal, mas tem a obrigação de combater os efeitos dela que ajudam no descontrole inflacionário. Mas, nessa conta, a explosão do endividamento público (que caminha para o patamar de 80% do PIB) também é fator de instabilidade que os juros em patamar recorde ajudam a turbinar.