O fantasma de um novo golpe de Estado continua rondando o Brasil. Os acontecimentos de 8 de janeiro de 2023 – o dia da infâmia política da nossa história republicana – poderão se repetir. A tarefa republicana e democrática é de ir até o fim nas investigações sobre os autores da ação golpista, bem como dos seus mentores e financiadores. Até o momento as autoridades têm conduzido com eficiência e rapidez as investigações. Não é um processo fácil, pois envolve centenas de pessoas. E não vai causar estranheza se for encontrando estrangeiros que se envolveram na ação golpista e terrorista, no dizer do ministro Alexandre de Moraes.

Não há registro em nenhum país democrático de um ataque simultâneo às sedes dos três poderes. O que assistimos no Brasil tem de ser repudiado, mas, apenas o repúdio não basta. Faz-se necessário uma dura resposta dos poderes constituídos. Os instrumentos legais e a estrutura para as ações estão dadas. A questão, portanto, é de uma decisão democrática, firme, na defesa institucional do Estado democrático de Direito.

Não há registro em nenhum país democrático de um ataque simultâneo às sedes dos Três Poderes. O que assistimos no Brasil tem de ser repudiado

Por si só, a Constituição cidadã não sobreviverá. Ela necessita da sociedade civil e de seus representantes na estrutura estatal. O País desprezou ataques sistemáticos à democracia realizados desde a sua promulgação. Jair Bolsonaro é um exemplo. Como parlamentar, especialmente em aparições televisivas, debochava dos valores constitucionais, defendia a adoção de uma ditadura no Brasil e propôs o fuzilamento do presidente Fernando Henrique Cardoso. No dia da votação de autorização para a abertura do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, ele, ao votar, deu loas a um dos mais famosos torturadores da ditadura militar, o coronel Carlos Alberto Ustra. Todas estas ações foram recebidas como espécies de chistes de um parlamentar considerado por muitos como um détraqué.

Como consequência, houve a naturalização do discurso extremista, dos “engenheiros do caos”, no dizer de Giuliano da Empoli. Ou seja, não foram ações no interior da divergência democrática, da pluralidade de pensamento, dos valores constitucionais. O que ocorreu foi um ataque sistemático à democracia como valor universal e pilar central do edifício legal da Constituição de 1988. Para que a história não se repita será necessário um conjunto de atividades tanto no campo legal – no aperfeiçoamento, se necessário, da legislação – como também da presença da Constituição – até no sentido material – em cada lar, em cada escola, na sociedade, no cotidiano das nossas vidas.