Mesmo sem estar filiado a um partido político a 14 meses das eleições, o presidente Jair Bolsonaro começou a preparar o terreno para que possa ter condições mínimas de estrutura nos estados para disputar a reeleição. O plano do capitão passa por lançar vários de seus ministros como candidatos a algum cargo em regiões consideradas estratégicas pelo Planalto, como estados do Nordeste, reduto petista, ou em São Paulo, o maior colégio eleitoral do País. O objetivo do mandatário é construir palanques pelo Brasil para que pelo menos possa pedir votos na tentativa cada vez mais improvável de se manter no poder.

Dos 23 ministros que integram o governo, pelo menos 12 são cotados para disputar cargos eletivos em outubro de 2022. A estratégia do ex-capitão deve favorecer o Progressistas, principal partido do Centrão, que acabou de receber de Bolsonaro o comando da Casa Civil, um dos postos mais importantes da Esplanada, ocupado por Ciro Nogueira. O senador licenciado, que é também o presidente nacional do PP, deverá ser candidato a governador do Piauí para enfrentar o PT, que domina a política local há oito anos. Ele é cogitado também para ser o vice de Bolsonaro, alavancando o bolsonarismo no Nordeste. O PP deve ser o partido ao qual Bolsonaro deve se filiar.

Disputa no Nordeste

Nessa região, o mandatário quer jogar pesado, com o lançamento de seus principais ministros como candidatos aos governos estaduais ou ao Senado. É o caso do ministro das Comunicações, Fábio Faria, que deve deixar o PSD para disputar pelo PP o governo do Rio Grande do Norte ou uma vaga no Senado. Nesse mesmo estado, administrado hoje pela governadora Fátima Bezerra (PT), o presidente tem incentivado o ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, a fazer uma dobradinha com Faria. Um disputaria o governo do RN e o outro, a vaga no Senado. Outros três ministros também foram escalados para disputar as eleições pelo mesmo partido ao qual o mandatário se filiará. Tratam-se dos ministros do Turismo, Gilson Machado, atualmente filiado ao PSC, cotado a concorrer a uma vaga no Senado por Pernambuco, enquanto o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, deseja pleitear uma vaga no Senado ou o governo de seu estado, a Paraíba.

Aliás, dos 12 palanques que Bolsonaro pretende abrir no País, seis seriam no Nordeste. Assim, um outro subordinado do presidente, João Roma, ministro da Cidadania, está sendo incensado a disputar o governo da Bahia. Para isso, terá que romper feio com seu padrinho político ACM Neto, que também vem pleiteando concorrer a esse cargo. Roma foi, inclusive, chefe de gabinete do presidente do DEM quando ele ainda ocupava a prefeitura de Salvador. Os dois cortaram relações quando Roma decidiu aceitar o convite de Bolsonaro para assumir o ministério, em fevereiro deste ano, contrariando ACM. As chances de Bolsonaro perder o governo baiano com Roma é enorme. Nas eleições presidenciais passadas, Bolsonaro também perdeu na Bahia.

O incentivo de Bolsonaro aos seus ministros segue uma lógica. Fragilizado por denúncias de corrupção na compra de vacinas e com sua popularidade em baixa, Bolsonaro tem motivado ministros que considera mais competitivos nas urnas para que virem palanques bolsonaristas em regiões cruciais. “Acho isso estratégico e importante. Precisamos reforçar a política de direita no Brasil”, afirmou o deputado Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ), aliado de Bolsonaro e membro da bancada evangélica.

O ex-capitão também está de olho nas eleições em São Paulo, governado por João Doria, que deverá ser o candidato do PSDB a presidente e que hoje venceria o mandatário no segundo turno, conforme revelam os levantamentos dos principais institutos de pesquisa. Para tentar tirar os tucanos do poder no estado depois de quase 30 anos, Bolsonaro quer lançar o ministro Tarcísio de Freitas como candidato ao governo paulista e, ao mesmo tempo, estruturar um palanque no maior colégio eleitoral brasileiro. A questão é que o ministro da Infraestrutura é desconhecido e o candidato de Doria, Rodrigo Garcia, deve atropelá-lo.

A cientista política Nara Pavão, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), explica que o mandatário age como sempre agiu ao longo de sua carreira política, atraindo aliados de forma não convencional. “Isso faz todo o sentido. Bolsonaro saiu enfraquecido das eleições de 2020 e, como ainda não tem um partido político, está buscando ter os seus próprios cabos eleitorais para compensar a ausência de uma máquina partidária”, disse. Ela mostra que o ex-capitão sempre teve essa “estratégia capenga” de tentar compensar a falta de estrutura institucional de um partido forte por uma atuação individualista, como aconteceu em 2018 com o PSL. É a cara do bolsonarismo: o desprezo pelos partidos e o culto ao personalismo.