Do segundo andar da casa de Onofra Alves Costa Rovai é possível ver parte do campo da Vila Belmiro, o estádio onde Pelé brilhou defendendo o Santos. Ao fim de algumas partidas, o ‘Rei’ costumava conversar com esta torcedora, que hoje tem 91 anos.

“Saía por essa porta e aí a gente conversava sobre futebol”, conta dona Onofra à AFP, apontando para a entrada principal do modesto estádio da cidade portuária, que fica logo em frente à sua humilde casa azul.

“Eu tinha a minha mãe, que já era de idade, e gostava muito de Pelé”, lembra com alegria esta senhora, que ostenta com orgulho a camisa alvinegra do ‘Peixe’. “Um jogador… Meu Deus do céu, nasceu para isso”.

Dona Onofra sorri ao falar de Edson Arantes do Nascimento, que faleceu nesta quinta-feira (29), aos 82 anos, no Hospital Albert Einstein em São Paulo, em decorrência de complicações causadas por um câncer.

Da porta de sua casa, onde mora há 50 anos, dona Onofra observava o ‘Eterno Camisa 10’ e outros integrantes daquele poderoso time do Santos, bicampeão mundial, sair da Vila Belmiro, onde Pelé será velado a partir de segunda-feira (2).

“Pelé era assim comum, falava com qualquer pessoa, conversava sobre qualquer assunto, era maravilhoso”, garante a torcedora nonagenária.

Neste estádio modesto, com capacidade para 16.000 pessoas, Pelé fez 1.091 gols em 1.116 partidas e levantou 45 troféus vestindo o manto alvinegro, segundo as contas do clube.

– ‘O melhor’ –

Na calçada em frente à casa de dona Onofra, dezenas de turistas e torcedores passavam a caminho da Vila Belmiro na manhã desta sexta-feira (30), debaixo de uma chuva fina, para homenagear o melhor jogador de futebol de todos os tempos.

Nas casas em volta do estádio do ‘Peixe’, onde Pelé jogou 18 de seus 21 anos como profissional, bandeiras do alvinegro praiano se proliferam por varandas e janelas.

Três modestas coroas de flores, uma delas com os dizeres “Pelé Eterno”, foram depositadas diante da estátua do único jogador a ganhar três Copas do Mundo (1958, 1962, 1970), que fica ao lado do busto nos corredores da Vila.

“[A morte de Pelé] foi muito triste para mim, porque eu não vi ele jogar bola, mas o que eu ouvi meu pai falar, meus avós falarem, o que eu vi em algumas imagens que passaram dele, é o melhor, é único”, opina o aposentado Anaur Aparecido Deolindo.

Morador do município de Votuporanga, norte do estado de São Paulo, este santista de 57 anos percorre todos os anos mais de 500 km para a passar a virada em Santos, onde as autoridades decretaram sete dias de luto. O presidente Jair Bolsonaro decretou três dias de luto no país.

Assim que soube da notícia do falecimento de Pelé, Anaur sabia que tinha que homenageá-lo em um dos campos onde ele mostrou parte de sua magia para o mundo.

“É como se fosse alguém da família da gente, porque foi um menino que chegou aqui, cresceu aqui e ganhou o mundo. Hoje, ele voltou para lá onde ele merecia, no colo de Deus”, comenta. “O Edson morreu, mas Pelé não morre. Vai ficar eterno”.

– Ídolo para sempre –

Acompanhado de alguns amigos, Jonas Augusto dos Santos, um analista de sistemas de 28 anos, veio à Vila Belmiro para conhecer a sede de seu time do coração – e também de seu pai e seu avô – justo no dia seguinte à morte do ídolo máximo da torcida santista.

“A vida do brasileiro, ela não é fácil já há muito tempo, então, a gente sempre vai buscar alguém para ser ídolo. O Pelé, mesmo morto, não vai deixar de ser ídolo”, diz o jovem torcedor do Peixe. “O corpo de Pelé se foi, mas a alma de Pelé eu tenho certeza de que está ao redor do estádio e no coração de todos os brasileiros”.

Devidamente trajado com a camisa do clube, outro torcedor, o professor Luiz Santos, estranha o movimento fraco na Vila nesta sexta, mas garante que uma multidão comparecerá ao velório do ‘Rei’, que será antecedido por um cortejo fúnebre pelas ruas da cidade.

“Segunda-feira isso aqui estará tomado de pessoas, de São Paulo até aqui, muitas pessoas vão vir”, sentenciou.

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