Logo no início de Luta por Justiça, ao conversar com um homem condenado, o advogado Bryan Stevenson se dá conta de que, não fosse por um ou outro detalhe, podia ser ele no corredor da morte, ou na prisão. Os dois tinham sido criados num lugar pobre, indo à igreja todos os domingos. Ele foi para Harvard, o outro, para a cadeia. Quando Stevenson nasceu, ainda estavam em vigor as leis de segregação Jim Crow. “Eu comecei minha educação numa escola para negros”, contou ele ao Estado. “Crianças negras não podiam frequentar escolas públicas. Advogados tiveram de lutar para que abrissem as escolas para nós.”

Ele é prova, portanto, de que os advogados e as leis fazem diferença na vida das pessoas. “Mas temos um sistema que o trata melhor se você for rico e culpado do que se for pobre e inocente”, disse. “E isso é agravado pelo alto número de pessoas que prendemos neste país. Setenta milhões de americanos têm passagem pela polícia, o que atrapalha na hora de conseguir emprego, ou empréstimo.” E, claro, há a questão da raça, que ele viveu. “Temos um legado que começou com o genocídio dos povos nativos e depois se sustentou com dois séculos e meio de escravidão. Tivemos uma era de terrorismo racial e linchamentos. E um apartheid. Nossa história criou uma presunção de periculosidade e culpa dos negros e pardos – e não importa quanto talento e educação você tenha.”

Stevenson visitou muitos países do mundo, inclusive o Brasil, em 1989. “Havia um esforço para trazer de volta a pena de morte”, ele contou. O advogado disse que entende a vontade de usar a medida para coibir a violência. “Mas meio século de punições severas e ameaças não melhoraram a segurança pública em meu país. Acho que os Estados Unidos fizeram um trabalho terrível, exportando essa ideia de que, se formos duros e punitivos, melhoramos a segurança. E não funciona assim. É preciso tratar a pobreza, o trauma e o abuso que deram origem à violência num local como o Brasil.”

Durante 20 anos, ele preferiu fazer seu trabalho com a discrição que parece ser um traço fundamental de sua personalidade. “Não tínhamos nem placa na frente do nosso escritório”, afirmou, referindo-se à organização Equal Justice Initiative. “Mas eu percebi que, se não mudássemos o clima fora dos tribunais, nunca conseguiríamos a justiça que procurávamos lá dentro.” Foi assim que decidiu fazer um TED Talk e lançar seu livro, que agora virou filme.

Em suas quase três décadas de trabalho, libertou dezenas de condenados à morte ou diminuiu suas sentenças. Vivem perguntando se gostaria de entrar na política. Ele não diz desta água não beberei. “Mas sou um produto da decisão Brown vs. Conselho de Educação, em que a Suprema Corte deu fim à segregação nas escolas, porque advogados brigaram por isso, porque era um direito”, afirmou.

“A democracia decepcionou as pessoas negras em meu país. A democracia tem falhas. Por causa dos direitos, posso ajudar muita gente, pessoas que ouviram que suas vidas não tinham significância, propósito ou valor, que estavam lutando para manter sua humanidade. Eu as vi encontrando a redenção. E isso é muito bonito.” Para ele, a esperança é essencial para a justiça, porque a injustiça prevalece onde há desesperança. “Se eu tenho um superpoder, é a esperança.”

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.