Pouco mais de dois meses após deixar sua primeira experiência no setor público, onde foi diretor do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) por um ano, o economista Vinicius Carrasco está “menos pessimista” em relação à economia. As incertezas relacionadas à crise política, ao ajuste fiscal e às eleições de 2018 merecem alguma preocupação, mas Carrasco, professor de Economia da PUC-Rio, aposta na continuidade da agenda de reformas. O economista fez parte da equipe que elaborou a TLP, nova taxa de juros do BNDES, mas deixou o cargo após Paulo Rabello de Castro, que substituiu Maria Silvia Bastos Marques no comando do banco, criticar a reforma.

A retomada da economia é sustentável?

Há incertezas associadas ao ciclo político. Ano que vem tem eleição. A gente tem de torcer para que o debate conduza a sociedade a refletir sobre as dificuldades, as necessidades de ajuste e de reforma. E para que as reformas sejam mantidas e haja avanços. E para que a questão fiscal se resolva de maneira mais clara. A gente sabe hoje que sem a reforma da Previdência não tem como manter as contas no lugar. Há incertezas tanto de cunho político quanto fiscal, que estão relacionadas. Para que a gente garanta alguma sustentabilidade nessa retomada do crescimento da economia, essas incertezas têm de ser resolvidas.

Que perfil de líder político seguiria esse caminho?

Um candidato que não queira se confrontar com a dificuldade de apresentar ao eleitorado o tamanho do ajuste e que vai passar quatro anos numa situação que pode ser bastante dramática (se sair vencedor). A conta de não fazer o ajuste está muito clara, com o colapso dos serviços públicos. As pessoas entendem isso. Parte do que aconteceu em 2014 foi que a candidata ganhou a eleição perdendo. E isso rapidamente se reverteu contra o governo. Plataformas populistas, que não lidem com as dificuldades que a conjuntura vai nos impor, vão ganhar perdendo. A gente tem tido exemplos de que o Congresso entende isso. Uma série de reformas difíceis de serem implantadas tem avançado, como aumentar o custo de financiamento do BNDES, impor teto dos gastos e fazer reforma trabalhista. Sou menos pessimista do que as pessoas em geral.

Qual o papel do BNDES na atual política econômica?

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É bastante importante. A correção de rumos no montante de subsídios de crédito vai ter benefícios fiscais. Isso é uma mudança na direção de reduzir os juros na economia. Quanto pior o perfil da dívida e sua trajetória, mais reticentes estarão os agentes em financiar essa dívida e maior será a taxa de juros que exigirão por isso. A mudança do BNDES também tem o efeito de ajudar o BC no papel de trazer a inflação para a meta. Quando há menos projetos insensíveis à taxa sob controle do BC, maior tem de ser essa taxa para atingir a meta de inflação. A redução no montante de subsídios permite taxas de juros menores e a alocação de capital na economia fica melhor. Subsídios podem viabilizar projetos que se mostrem, depois, de pouco valor econômico. Parte do que aconteceu nos últimos quatro anos é resultado da má alocação de recursos. Há uma série de ativos de pouco valor econômico.

Por exemplo?

Estádios de futebol que hoje não hospedam jogos, um monte de elefantes brancos, que não têm nenhum valor econômico, e isso de algum jeito consome recursos da sociedade. Alguém está se endividando, alguém está financiando. Quando, depois, esses projetos não apresentam receita, criamos um investimento de pouco uso econômico. Outro exemplo menos claro é o excesso de capacidade (em vários setores). São elefantes brancos em dimensões menos óbvias, mas que estão aí. Criamos excesso de capacidade e isso vai acabar se refletindo em menor produtividade e menor crescimento. O subsídio, por fazer com que o custo de financiamento seja artificialmente barato, estimula projetos de pouco valor econômico. Um exemplo são as decisões de investimento da Petrobrás: um monte de refinarias construídas com sobrepreço e que não valem nada. A redução dos subsídios faz com que só projetos que apresentem retorno acima de um mínimo sejam financiados.

Há alguma outra vantagem?

A redução de subsídios permite que o financiamento privado tenha um papel relevante. O financiamento privado impõe uma barreira, faz com que só projetos de fato produtivos e que tenham valor econômico sejam financiados.

A redução de subsídios foi suficiente?

É preciso avançar mais. Um próximo passo poderia ser remunerar o FGTS pela TLP (nova taxa de juros do BNDES). Reduziria o quanto o trabalhador é taxado nessa poupança forçada e disciplinaria a alocação de capital do FI-FGTS (fundo que investe em infraestrutura com recursos do FGTS), por exemplo. Passos futuros poderiam ser o leilão dos recursos do FAT e do FGTS entre quaisquer interessados em geri-los, ou mesmo a devolução do FGTS aos trabalhadores.

Não há risco de a elevação dos juros do BNDES abortar a recuperação?

Não, ao contrário. O BNDES continua com acesso a uma fonte de financiamento de longo prazo com o custo de captação do Tesouro. É uma fonte barata, para financiar bons projetos de investimento. Parte do que vai acontecer é uma substituição. Em vez de sair do BNDES, (o financiamento) vai sair de bancos ou do mercado de capitais. Realmente, não acho que seja algo a se preocupar. A taxa de juros da economia está caindo, todas as taxas estão caindo, em particular a que vai balizar a TLP.

A troca de comando no BNDES pode interromper essas mudanças?

Não. O que tenho acompanhado é que o BNDES assinou documento conjunto defendendo a TLP. As políticas operacionais estão mais ou menos mantidas. Já há um acordo para devolver parte dos recursos do Tesouro. Não vejo desalinho. Não vejo como, num momento como hoje, em que a questão fiscal é de primeira ordem, você possa se opor, por exemplo, a devolver recursos que não necessariamente vão ser usados para investimentos. Além disso, o fato de mudar os juros do banco aponta a direção que ele deve tomar. É a medida que vai fazer com que o banco discuta onde ele pode atuar e de que forma. Quando o custo do recurso é zero, você faz de tudo, não tem por que se restringir. Esse mundo mudou. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.



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