É possível se curar de vícios? Neurocientista Elainne Ourives fala sobre comportamentos viciosos

É possível se curar de vícios? Neurocientista Elainne Ourives fala sobre comportamentos viciosos

Os comportamentos viciosos estão presentes em boa parte da população mundial, sejam eles autodepreciativos ou não. Os vícios podem ser em vídeo games – que atingem 2% da população mundial, segundo estudo publicado no Jornal de Psiquiatria da Austrália e Nova Zelândia -, em comida, em pornografia, em álcool, ou em drogas, sendo os últimos os mais preocupantes do ponto de vista da saúde. Segundo a OMS, 1 bilhão de pessoas no globo ainda usam cigarro e a dependência dele está ligada a 7,6 milhões de mortes.

Os vícios, sejam eles relacionados às substâncias psicoativas ou mesmo a hábitos alimentares e jogos, têm relação multifatorial, mas geralmente possuem ligação com as crenças do indivíduo, conforme explica a neurocientista Elainne Ourives. Segundo ela, esses comportamentos vêm do aprendizado e da programação emocional neuro associativa e neurocognitiva – gerada ainda na infância, até os sete anos de idade, quando a mente consciente ou o cérebro racional, que fica do lado esquerdo, está em formação.

“Nessa fase, o cérebro é bombardeado por um turbilhão de informações de toda ordem e natureza. Então, com pouco filtro ou sem qualquer filtro, passa a aceitar verdades, crenças e programações ainda de modo inconsciente. Caso a pessoa não identifique a origem dessas crenças e as elimine, pode reproduzir certos comportamentos e atitudes por toda a vida, mesmo sem perceber. Por isso, às vezes, o vício no cigarro, por exemplo, pode ser relacionado a uma necessidade de aceitação, por falta de afeto, pela necessidade de se sentir pertencente socialmente. E isso, na maioria das vezes, tem a ver com a programação ou crença que recebeu lá no passado”, explica.

Há também o caso em que as pessoas têm comportamentos obsessivos como um recurso de fuga. Neste caso, é o vício como resposta ao vazio, à falta de atenção e de reciprocidade. “Os vícios são resultados das crenças e programações emocionais. São respostas automáticas, inconscientes e neuroquímicas do cérebro em busca de qualquer recompensa para suprir algum tipo de falta emocional e neuroquímica”, explica. Elainne Ourives.

Identificando um comportamento vicioso

Ainda na infância é possível reconhecer comportamentos que podem gerar uma tendência a desenvolver vícios, como ansiedade, nervosismo e impaciência. “Os pais também podem ser analisados, pois a criança imita padrões, comportamentos e atitudes dos adultos. Nesses casos, é essencial buscar a origem desses padrões nos pais, para anular o avanço ou a instalação de determinado vício no cérebro e no campo das emoções. Essa ação é fundamental porque tudo é sistêmico e também constelar. E a origem, quase sempre, está na família, nos processos sociais e de relações humanas”, alerta.

No caso de adultos, Elainne Ourives destaca que também é necessário buscar a origem ao identificar padrões repetidos, justamente quando se percebe a necessidade de buscar a mesma satisfação ou recompensa, a partir de comportamentos ou condutas repetidas, sucessivamente, como no consumo de cigarro, álcool ou mesmo comportamentos como lavar as mãos repetidamente e falar mal dos outros.

“Esses padrões são possíveis de se identificar porque são sinais claros. Entretanto, existem padrões ocultos nas emoções e também nos pensamentos. Esses são mais subjetivos e requerem uma análise de auto-observação para buscar as emoções mais genuínas e tentar desvendar o que aflige ou perturba a si mesmo. Caso esse processo seja muito complicado e não se alcance uma resposta mais clara, o recomendado é buscar a ajuda de um especialista, seja ele médico, psicólogo, neurocientista ou reprogramador mental”, pontua.

Como alerta, a especialista destaca que pessoas emocionalmente instáveis são mais propícias a desenvolver vícios, pois buscam preencher seus vazios internos e emocionais com subterfúgios e recompensas. “Algumas pessoas recorrem ao esporte, outras à arte, outras à dança e a diferentes atividades, assim como as que se satisfazem com comportamentos autodepreciativos.

“Mesmo quando se recorre a algo mais tranquilo ou saudável, é sempre interessante não exagerar, nem extrapolar, com excesso repetido da mesma prática, mas buscar uma ação mediana e balanceada, para o cérebro também não acelerar a própria produção neuroquímica em puro excesso. Tudo que excede não gera a harmonia e revela uma falta”, alerta.

É possível se curar dos vícios?

Assim como a neurociência consegue diagnosticar a origem dos vícios, também é possível usá-la para o tratamento dessa condição. De acordo com Elainne Ourives, após identificado o vício, é possível usar a neuroquímica do cérebro para se criar novas trilhas neuronais e espaços cognitivos. “Isso pode ser feito com sessões de visualização, com medicamentos ou neurotransmissores estimulantes, por meio de exercícios mentais e por uma mudança consciente de hábitos, ao menos, por 21 dias consecutivos”, defende.

A neurocientista pontua que, com base em estudos que já comprovaram a neuroplasticidade do cérebro – capacidade de mudar -, é possível criar comandos mais positivos, estimular o nascimento de novas células cerebrais, produzir novas conexões subcorticais e mais axiomas na comunicação entre diferentes partes do encéfalo, que é o aparelho responsável pelo aumento da capacidade mental.