Após vencer a presidência da Guatemala com a promessa de uma luta frontal contra a corrupção, Bernardo Arévalo completa nesta terça-feira (23) 100 dias no poder sem apresentar conquistas significativas.

“Nossa prioridade número um é fechar a torneira dos recursos públicos para os corruptos”, declarou o presidente em fevereiro, mas até agora não tomou medidas de peso.

Apenas criou uma comissão para detectar irregularidades no setor público e denunciou à Justiça uma ministra do governo anterior por uma compra questionável de vacinas russas contra a covid-19.

Arévalo também destituiu a ministra do Meio Ambiente por “mau uso de recursos” do Estado, depois que veio a público que uma de suas filhas supostamente usava um veículo oficial para atividades pessoais.

No entanto, analistas políticos e líderes empresariais e indígenas dizem que seu governo é “decente”, algo importante em um país que ocupa o 154º lugar entre 180 no ranking de corrupção da ONG Transparência Internacional.

“É um começo muito tímido […] Havia tempo para que organizassem uma ofensiva muito maior no combate à corrupção”, afirma à AFP Manfredo Marroquín, da filial local da ONG.

Para o constitucionalista Edgar Ortiz, por enquanto, existem apenas “boas intenções”, mas “falta uma estratégia” anticorrupção.

“Não vimos nem iniciativas de lei nem políticas públicas que demonstrem que já tinham uma ideia do que era necessário reformar para reduzir os espaços de corrupção”, aponta a analista independente Marielos Chang.

Chang, porém, destaca que Arévalo não tem os traços autoritários dos presidentes Jimmy Morales (2016-2020) e Alejandro Giammattei (2020-2024). “Não parece que estamos em um retrocesso democrático”, observa.

– “Alto risco” –

Arévalo coabita com a questionada procuradora-geral Consuelo Porras, que iniciou em 2023 uma cruzada contra ele que colocou em risco a transição presidencial e que ele denunciou como uma tentativa de “golpe de Estado”.

Como não tem poder para destituí-la, a denunciou à Suprema Corte por “descumprimento de deveres” na esperança de que seja removida.

Mas Ortiz considera que foi um “grande erro” usar a via judicial, pois no país a “manipulação da lei é o campo fértil” de “juízes e procuradores corruptos”.

“O que mais vai pesar […] para Arévalo é o fato de não vermos ações contundentes nem um plano a seguir para destituir a procuradora-geral”, diz Chang.

Sancionada pelos Estados Unidos e pela União Europeia, Porras tem buscado se fortalecer com reuniões com legisladores da oposição e prefeitos.

Além disso, mantém um pedido à Justiça para retirar a imunidade de Arévalo para processá-lo por suposta lavagem de dinheiro em seu partido, o Semilla.

“O Ministério Público tentou abertamente dar um golpe de Estado e agora a agenda não mudou”, adverte Ortiz.

Aceitar “conviver” com a procuradora é um “jogo de alto risco” para Arévalo, pois é como “dormir com o inimigo”, afirma Marroquín.

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