Donald Trump cruzou a bem delineada e arriscada fronteira que separa nos EUA as posições políticas dos conservadores daquelas assumidas pelo reacionarismo. É preciso demarcar esses dois campos ideológicos dos americanos para se compreender que Trump deu um tiro no próprio pé na semana passada. Ele chegou à indicação republicana, e portanto conservadora, para a disputa final à presidência do país, colocando-se claramente contra o establishment e afirmando que “é preciso dar a América para os americanos”. Até aí, o seu discurso nacionalista, como era de se esperar, recebeu o endosso dos conservadores. Nos últimos dias, no entanto, Trump superou Trump no delírio xenófobo: ele ofendeu a memória do capitão Humayun Khan, militar americano muçulmano morto na guerra no Iraque. Eis a fronteira cruzada e o tiro errado: nenhum habitante dos EUA avaliza quem fala mal de herói de guerra e, a passos largos, Trump se colocou assim no território do reacionarismo – em reacionário vota a Ku Klux Klan mas não vota a maioria dos conservadores. A situação piorou para ele (melhor para o mundo) quando atribuiu “tibieza e falta de liderança” a Paul Ryan, presidente da Câmara dos Representantes, e foi imediatamente desautorizado por seu vice, Mike Pence, a prosseguir nas críticas. Mais: Barack Obama foi à ribalta e roubou a cena com sua principal arma: a fala. Discursou Obama: “Chega uma hora que você tem de dizer: esse não é alguém que eu posso apoiar para a presidência dos EUA, mesmo que seja do meu partido”. Abraham Lincoln, o maior líder republicano e conservador, observou: “Se quiser por à prova o caráter de um homem, dê-lhe poder”. Os próprios conservadores já não estão tão dispostos a fazer tal teste com Donald Trump.


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