Dois estudos recentes dão pistas sobre as causas da chamada covid longa, uma síndrome regida por mecanismos ainda misteriosos: um trata do efeito conjunto de sequelas em vários órgãos, e o outro, do danos nos neurônios.

Há “evidências concretas de que diferentes órgãos sofrem mudanças” após a hospitalização por covid-19, declarou em entrevista coletiva Christopher Brightling, coautor de um estudo publicado na sexta-feira (22) na revista Lancet Respiratory Medicine.

O estudo é baseado em ressonâncias magnéticas realizadas em 259 pacientes que foram hospitalizados pelo novo coronavírus entre 2020 e 2021. Os resultados foram comparados com exames realizados em cerca de 50 pessoas que nunca foram infectadas.

Cerca de um terço dos pacientes de covid apresentavam “anomalias” em vários órgãos – cérebro, pulmões, rins e, em menor medida, coração e fígado – meses depois de terem alta.

Os pesquisadores observaram, por exemplo, lesões na substância branca do cérebro, fenômeno que a literatura científica associa a uma leve perda cognitiva.

Os autores do estudo e observadores independentes acreditam que estes resultados fornecem uma possível explicação para a covid longa, ou seja, a persistência de sequelas duradouras meses após a infecção.

A covid longa ainda não tem uma definição consensual, e as explicações hipotéticas são diversas, sem serem excludentes entre si.

O estudo publicado na sexta-feira sugere que a covid longa “não se explica por insuficiências graves concentradas em um único órgão”, mas que obedece a “uma interação entre pelo menos duas anomalias” em órgãos diferentes, afirma o pneumologista Matthew Baldwin, que não participou do estudo, no mesmo número da Lancet Respiratory Medicine.

– A pista do cérebro –

Outro estudo, publicado uma semana antes na revista eBiomedicine, abre o caminho para um mecanismo concentrado no cérebro.

Conduzido por uma equipe do Inserm, o instituto francês de saúde e pesquisa médica, este estudo analisa cerca de 50 pacientes. Alguns deles sofreram queda nos níveis de testosterona, relacionada com uma alteração de certos neurônios que regulam as funções reprodutivas.

Os pesquisadores então mediram as funções cognitivas desses pacientes e constataram um pior desempenho naqueles que sofreram tais danos nos neurônios.

Esses resultados “sugerem que a infecção pode causar a morte desses neurônios e estar por trás de certos sintomas persistentes”, diz o Inserm.

Fadiga, tosse, falta de ar, febre intermitente, perda do paladar, ou do olfato, dificuldade de concentração, depressão… Os sintomas da covid longa são abundantes. Em geral, manifestam-se nos três meses posteriores à infecção e duram pelo menos dois meses. Aqui, são sintomas que não podem ser atribuídos a outras patologias e que têm impacto na vida quotidiana.

Pelo menos 90% dos pacientes de covid longa apresentam, no entanto, uma lenta melhoria lenta dos sintomas após dois anos, enquanto os demais têm uma recuperação rápida, ou mesmo uma persistência dos sintomas, segundo um estudo publicado em maio pelo epidemiologista Viet-Thi Tran, da Universidade de Paris Cité, com base em 2.197 pacientes.

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