Dois anos depois, nova política de preços da Petrobras ainda divide opiniões

A decisão de “abrasileirar” os preços dos combustíveis praticados pela Petrobras completa dois anos e ainda divide opiniões. Um apelo do então recém eleito presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, a mudança em uma das principais mudanças na rotina da empresa foi adotada durante o comando de Jean Paul Prates na estatal. Com isso, a petroleira substituiu a política de paridade de importação (PPI), implantada no governo Temer, por uma nova estratégia comercial. A ideia seria priorizar o “custo alternativo do cliente” e o “valor marginal para a Petrobras” na formação dos preços dos combustíveis.

O dia do anúncio da nova política de preços foi de muita tensão no mercado financeiro. Após conhecer as mudanças, no entanto, as ações da petroleira subiram mais de 5% com a percepção de que a solução encontrada foi melhor do que se esperava. Afinal, durante a campanha à presidência, Lula acenava com preços mais baixos para o consumidor, um sinal de que os ganhos da empresa poderiam minguar, e com eles a distribuição dos bilionários dividendos dos anos anteriores.

“Conseguimos implementar uma nova política e explicá-la a todos: preços que levam em conta as vantagens de se produzir todo o petróleo no Brasil e retirar a grande maior parte também no País. Ou seja um preço de mercado, mas de mercado brasileiro, como qualquer país que luta para diminuir e conquistar sua autonomia em relação à dependência de importações”, disse Prates ao Broadcast. Para o executivo, a mudança permitiu atender ao mesmo tempo Lula e os acionistas privados, além de fazer a empresa conquistar fatias de mercado e eficiências comerciais desperdiçadas nos anos anteriores.

Uma análise do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep) mostra que a política conseguiu atingir o objetivo de evitar o repasse da volatilidade do mercado internacional de petróleo para o consumidor brasileiro. “Até aqui, (a estratégia comercial) cumpriu seu objetivo de mitigar o repasse da volatilidade dos preços internacionais para o mercado interno, moderar as pressões sobre os preços dos derivados, em especial do diesel, e contribuir para geração de valor e bom desempenho financeiro da companhia”, diz o Ineep.

Em 2023, foram efetuados quatro reajustes no preço do diesel, sendo três para baixo e um para cima, em contraste com as 18 alterações em 2021 e 10 em 2022.

De acordo com o instituto, as mudanças comerciais e operacionais da Petrobras resultaram em uma redução dos preços do diesel e da gasolina nas refinarias da estatal de, respectivamente, 20,9% e 4,0%, entre janeiro de 2023 e abril de 2025. No entanto, a redução foi menor nos preços aos consumidores finais.

“No caso do diesel, houve uma estabilização dos preços de revenda, com queda de 0,3% no período analisado, saindo de R$ 6,44 por litro, em janeiro de 2023, para R$ 6,42, em abril de 2025. No caso da gasolina, o efeito foi um aumento dos preços de revenda de 25,5%, que saltaram de R$5,05 por litro para R$ 6,34 no mesmo período”, avaliou o Ineep. O efeito não foi mais efetivo, ressaltou, devido a fatores conjunturais, como choques geopolíticos e desvalorização cambial, assim como estruturais da indústria nacional de produção, distribuição e comercialização de combustíveis, como a trajetória da tributação federal e estadual e as dinâmicas de propriedade das empresas desse segmento.

Acompanhamento

Para o analista da Genial Vitor Sousa, o que se observa desde a adoção da nova política é um razoável acompanhamento em relação ao que é estimado como preço da paridade e a execução dos preços da empresa – exceto em um ou dois momentos muito pontuais”, observou. “Fora isso, o que eu posso dizer é que apesar dos discursos, a empresa tem sido muito razoável no acompanhamento de preços dos derivados”, disse.

A Genial chegou a criar uma espécie de “termômetro” da percepção de risco político em relação à Petrobras, em 2023, comparando os reajustes da estatal com o PPI, mas já deixou de publicar, segundo Vitor.

Interesse no Refino

Já Ilan Arbetman, analista da Ativa Investimentos, considera que toda política de preços tem seus prós e contras, inclusive o PPI. Mas avalia que a mudança “colocou uma pá de cal” no interesse de qualquer player do setor de refino em se instalar no País, movimento que poderia levar à maior concorrência e, por consequência, à tão almejada redução de preços para o consumidor.

“O principal ponto é que quando você foge da lógica do mercado, você sempre deixa alguém insatisfeito. O PPI não era perfeito, você tinha de fato períodos que precisava fazer bastante alteração nos preços. Mas a política era mais transparente, hoje ela é opaca. Isso do ponto de vista do planejamento das companhias, e até numa lógica de investimentos, para ter mais racionalidade, é complicado”, avaliou.

Ele explica que quando o preço está mais baixo do que o mercado internacional, as janelas de importação são fechadas e prejudica importadores e regiões que não tem acesso fácil aos combustíveis. Já quando os preços estão mais altos que o PPI, facilita a importação, mas prejudica as distribuidoras que alegam perda de competitividade, além dos consumidores, que pagam mais caro. Além disso, afirmou, só este ano já foram realizados quatro reajustes no diesel, três para baixo e um para cima, trazendo a volatilidade de fora para o mercado interno.

Também o presidente da Associação dos Importadores de Combustíveis (Abicom), Sérgio Araújo, reclama da falta de transparência na nova política, mas disse que após a sua implantação, as distribuidoras de combustíveis tiveram que passar a trabalhar com um “mix” entre as refinarias da Petrobras, a importação e das refinarias privatizadas, para conseguir um custo médio e viabilizar a operação.

“Nesses últimos dois anos, a estatal não teve uma política de preços muito clara, ela considera parâmetros que não são bem acompanhados ou medidos”, disse Araújo. “As distribuidoras aprenderam a trabalhar com esse mix no fornecimento. O que ainda atrapalha na parte da previsibilidade das distribuidoras são os leilões que a Petrobras tem feito regularmente, em que ela não acata os pedidos das distribuidoras, que então recorrem aos agentes privados. Nesse meio tempo, a estatal oferece o produto em leilões, atrapalha”, criticou.