O Brasil começa a atuar numa área de vanguarda na arqueologia. A Universidade de São Paulo inaugura em 2023 o Laboratório de Arqueologia e Antropologia Ambiental e Evolutiva, o LAAAE-USP, o primeiro polo científico na América do Sul dedicado exclusivamente à pesquisa da arqueogenética. Usando tecnologia de ponta, o trabalho é voltado para a extração do DNA de esqueletos encontrados em sítios arqueológicos, para poder qualificar de forma precisa a constituição genética de grupos pré-coloniais, reconstituindo DNA de moradores da Terra há séculos.

Criado pelo professor André Strauss, com acompanhamento do Instituto Max Planck de Antropologia Evolutiva, na Alemanha, o laboratório pioneiro é coordenado por Tiago Ferraz, doutor em Biologia Genética. Segundo ele, a importância do laboratório para a ciência nacional é de iniciar o Brasil no estudo da arqueogenética, capacatando profissionais para a área. “A ideia é que no futuro tenhamos um grupo de pesquisa cada vez maior se dedicando a esse trabalho, desde estudo da história humana, que é o que eu faço, como também estudos de paleobotânica. O projeto nasceu com a ideia desses dois pilares: trazer esse conhecimento, gerando informação, e ao mesmo tempo formar pessoas.”

A extração do DNA antigo de esqueletos revolucionou grande parte da pesquisa da história humana. Passa a ser possível reconstruir questões que são discutidas há décadas dentro da arqueologia e dar respostas a estas dúvidas. Quanto maior for o banco de informações genéticas de indivíduos de várias regiões diferentes, o trabalho vai além de identificar a idade de cada fóssil, é possível estabelecer rotas de migração. No cruzamento dos dados, pode ser estabelecido o caminho de populações antigas. Atualmente, os estudos de arquivo genético podem acessar o DNA de até 15 mil anos de idade e fazer a comparação com populações que vieram antes ou depois a esses indivíduos. Um mamute recentemente encontrado na Sibéria teve seu DNA sequenciado e é um marco na capacidade de extrair e sequenciar código genético antigo. O esqueleto do animal tem 1,6 milhão de anos. Esse sequenciamento só conseguiu ser realizado porque o DNA se preservou em temperatura muito baixa. Por estar em região tropical, no Brasil esse trabalho não aconteceria, pois fatores como a umidade do solo, acidez, calor e temperatura fazem com que o DNA se degrade mais rápido.

Para Ferraz, o estudo do DNA antigo seria a peça que faltava para reconstituir boa parte da história humana. “Hoje em dia a gente tem uma ‘lente’ um pouco melhor para poder observar determinadas coisas. Então consegue abordar e ter mais evidências de uma história que ainda está em pequenos fragmentos.

A arqueogenética vem para tentar ajustar essas pequenas partes e a gente conseguir entender a forma final desse quebra-cabeças”, diz o cientista.