Ganhador do Oscar, em 2016, de melhor longa-metragem de animação, “Divertida Mente” voltou aos cinemas na última quinta-feira, 20, na sequência da animação que apresenta as emoções que conduzem a vida da pequena Riley. Na fase adolescente, agora Alegria, Tristeza, Medo, Raiva e Nojinho ganham a companhia de novos sentimentos como a Ansiedade, Tédio, Vergonha e Inveja.

Apesar de ser uma animação infantil, o filme foge do superficial e lida com temas como luto, despedidas e ressignificação de lembranças. Desta forma, assim como todos nós, a personagem principal é guiada por suas emoções que se transformam em personagens vivendo em uma sede de controle dentro de sua mente, onde a ajudam a tomar decisões no dia a dia e conflitam sobre a melhor forma de navegar em um turbilhão de acontecimentos.

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Segundo Denize Savi, especialista em Ciência da Felicidade e com MBA em Psicologia Positiva, Neurociência e Comportamento, o primeiro filme já apresenta lições valiosas que a animação pode passar, como a ideia de que todas as emoções são igualmente importantes, que os nossos valores e visão de mundo naturalmente mudam ao longo dos anos, que a imaginação é um processo fundamental para a saúde mental e muitas outras análises.

Para sua sequência, a especialista acredita que o novo filme possa dar um entendimento visual do que acontece no período da adolescência e que mais compreensão possa trazer relacionamentos mais próximos, além de nos fazer refletir sobre a saúde mental das crianças e adolescentes.

'Divertidamente 2' apresenta as novas emoções: Ansiedade, Inveja, Tédio e Vergonha
‘Divertidamente 2’ apresenta as novas emoções: Ansiedade, Inveja, Tédio e Vergonha (Crédito:Pixar/PIXAR - © 2024 Disney/Pixar)

No Brasil, segundo o relatório Situação Mundial da Infância 2021, estima-se que quase um em cada seis meninas e meninos entre 10 e 19 anos de idade viva com algum transtorno mental, parcela mais exposta ao risco de automutilações, depressão e suicídio.

“Nos primeiros anos da adolescência, o cérebro está passando por uma remodelação, onde chegam novas e complexas emoções, como vergonha, inveja, tédio e ansiedade,  que serão retratadas no novo filme. Essa ideia é extremamente interessante e importante para ser discutida e abraçada, justamente pela preocupação com a saúde mental dos adolescentes”, aponta.

De acordo com Denize Savi, pensando na mensagem geral da animação, é possível traçar alguns aprendizados de acordo com a Ciência da Felicidade, como:

A tristeza é importante e não deve ser evitada

A tristeza é um sentimento importante. Ela nos permite refletir, a partir das perdas, o que realmente tem valor na nossa vida. Quando, por exemplo, alguém que amamos está muito doente ou se vai, nos confrontamos com a realidade e refletimos sobre o que de fato importa. Nos damos conta de que não são as coisas materiais, os seguidores nas redes sociais, status ou sucesso que nos faz feliz, mas o quanto do nosso tempo passamos com as pessoas que amamos.

Muitas transformações de vida acontecem através da dor. Ela também é uma forma de conexão social por empatia. Quando expressamos nossa tristeza recebemos apoio e consolo. Isso também ajuda a construir laços mais fortes entre os seres humanos. Só quem já sofreu junto com alguém sabe o quanto essa relação é especial.

Medo e nojo são emoções necessárias para a sobrevivência

Ambas as emoções funcionam como mecanismos de defesa e proteção. O nojo, por exemplo, é um sentimento importante na evolução humana. Ele nos protege de ameaças como doenças infecciosas. As pessoas sentem nojo para se proteger de objetos e seres vivos que representam risco à saúde.

Já no caso do medo, nos faz refletir sobre aceitação e acolhimento, pois reconhecemos que ele é o primeiro passo para estarmos conscientes e avaliarmos nossos desafios e obstáculos.

Além de nos proteger de perigos. Assim como o excesso de coragem pode colocar a vida em riso, o medo a protege. A partir desse ponto e na total presença do nosso ser, podemos tomar as melhores decisões.

A raiva permite um alívio da frustração, mas também reparação da injustiça e da ofensa

A raiva visa defender os nossos direitos e impor limites em nosso espaço pessoal. Desta forma, faz parte dos sentimentos que agem como combustível, que nos impulsiona, move, agita. Quando reconhecida e transformada em consciência plena e plano de ação, é um belo catalisador de mudança.

Ansiedade

A ansiedade é uma experiência natural do ser humano desde sempre, pois é uma reação que nosso corpo tem diante de uma ameaça. Assim como o medo e o nojo, ela também foi um sentimento importante para a sobrevivência da nossa espécie. No período pré-histórico quando um humano se via perante uma situação perigosa, como por exemplo, sendo presa de algum animal ou diante de uma tribo inimiga, a ansiedade desencadeava uma resposta de luta ou fuga.

Hoje em dia quando nos sentimos ameaçados, preocupados ou em qualquer situação que gere expectativa, medo ou indecisão, a ansiedade bate à porta. Mas ela pode ser positiva, pois nos ajuda a manter o foco e a concentração diante dos desafios. Porém, passa a ser prejudicial quando sentida em excesso e constantemente.

Inveja

Inveja é desejar o que o outro possui ou realiza. Embora seja um sentimento inerente do ser humano, com o qual todos convivem em algum momento da vida, ela é um sinal de alerta. A famosa “dor de cotovelo” é um indicativo de que algo não vai bem. Ela sinaliza que o indivíduo está passando por um descontentamento, que impacta profundamente na sua autoestima.

A inveja começa na infância e adolescência, quando se inicia o processo de formação de identidade, quando eu percebo que eu sou um indivíduo diferente do outro e me comparo com o outro. A partir dessa comparação surge a inveja. Portanto, reconhecer que temos esse sentimento nos ajuda a buscar ferramentas para fortalecer nossa autoestima para focar nas nossas conquistas ao invés das nossas “faltas”.

Vergonha

A vergonha nos previne de sermos excluídos. Ela é um balizador de como devemos nos comportar perante os demais. Somos seres sociais e, portanto, queremos ser aceitos. O sentimento de vergonha influencia a nossa tomada de decisão, nos motiva a nos forjarmos seres humanos melhores para nós e para o mundo.

Tédio

Pela definição do dicionário tédio é a sensação de enfado produzida por algo lento, prolixo ou temporalmente prolongado demais. Está aí algo que todo mundo foge, em especial as crianças e adolescentes que, na era da hiperconectividade e do excesso de informação, buscam estímulos o tempo inteiro.

O que a maioria de nós não sabe é que o tédio é super importante para estimular a nossa criatividade e despertar a nossa intuição a partir dos momentos de ócio. Se por um lado ele se assemelha ao “nada”, a algo que parece inútil, por outro é o espaço de tempo que precisamos abrir para preencher com a nossa imaginação.

Crianças, em especial, precisam muito do tédio para emergirem de suas ideias criativas. O alerta é quando o estado de tédio passa a ser uma falta de interesse recorrente pelo ambiente ao redor, ou sentir que a vida é monótona. Quando esses sentimentos se tornam excessivos, é importante investigar.