SÃO PAULO, 27 MAI (ANSA) – Em depoimento à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid nesta quinta-feira (27), o diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas, confirmou que as declarações do presidente Jair Bolsonaro resultaram na paralisação por três meses das negociações para a compra da vacina CoronaVac.   

Segundo Covas, se não tivesse ocorrido essa interrupção no processo, teria sido possível entregar 100 milhões de doses do imunizante desenvolvido em parceria com o laboratório chinês Sinovac até maio deste ano.   

O diretor do Butantan contou que a primeira proposta de venda dos fármacos para o Ministério da Saúde ocorreu em julho, data em que também houve um pedido de recursos para a construção de uma fábrica de vacinas e para testes clínicos. No entanto, para nenhuma notificação houve resposta positiva.   

Em 19 de outubro, o médico explicou que o então ministro da Saúde Eduardo Pazuello anunciou a intenção de compra das doses, mas o contrato não se concretizou. Na ocasião, Covas disse que não recebeu ofício cancelando as negociações, mas avalia que houve prejuízo para a entrega de vacinas após as falas do presidente, já que elas foram seguidas da suspensão por três meses das tratativas.   

O relato contraria o depoimento de Pazuello, que disse à CPI que a declaração de Bolsonaro não influenciou as negociações com o Butantan.   

“Após o dia 20 de outubro, isso foi absolutamente interrompido.   

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De fato, nunca recebi um ofício dizendo que a intenção de compra feita no dia 19 [de outubro] não era mais válida, mas, na prática, não houve consequência”, explicou.   

“A consequência foi no dia 7 de janeiro, e mesmo assim em detrimento de outras iniciativas que não eram certo. Houve a tentativa de trazer vacina da Índia, que não foi bem sucedida.   

Houve a dificuldade da própria AstraZeneca. Naquele momento, a única vacina disponível era a do Butantan”, acrescentou.   

O vice-presidente da CPI, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), chegou a divulgar áudios com declarações de Bolsonaro no dia 20, nos quais afirma: “já mandei cancelar, quem manda sou eu. Não abro mão da minha autoridade”. Em outra gravação, um dia depois, Pazuello diz que “é simples assim: um manda e outro obedece”.   

Na sequência, Covas garantiu que existe, sim, relação entre as situações. “Infelizmente, essas conversações não prosseguiram, porque houve, sim, aí, uma manifestação do presidente da República, naquele momento, dizendo que a vacina não seria, de fato, incorporada, não haveria o progresso desse processo”.   

“Óbvio que isso causa, sem dúvida nenhuma, uma frustração da nossa parte, mas, enfim, faz parte. E voltamos ao Butantan e continuamos o projeto, quer dizer, isso não foi motivo para nós interrompermos o desenvolvimento da vacina, mas aí já com algumas dificuldades, ou seja, a inexistência de um contrato com o ministério, que é o nosso único cliente, colocava, de fato, uma incerteza em termos de financiamento”, completou.   

O governo brasileiro só fechou contrato com o Instituto Butantan em janeiro deste ano para a compra de 100 milhões de doses, que agora devem ser entregues em setembro, já que o cronograma pode sofrer mudanças devido aos problemas para obter insumos.   

“Se tivéssemos o contrato com quantitativo maior, de 100 milhões de doses, o cronograma seria outro, poderia ter sido cumprido até maio”, disse Covas, lembrando que o Ministério da Saúde reduziu a quantia para 46 milhões.   

Apesar do imunizante ter sido aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) no dia 17 de janeiro, Covas ressaltou que em dezembro de 2020 seria possível ter entregue 10 milhões de doses anti-Covid.   

Agora, na terça-feira ( 1º), a médica oncologista e imunologista Nise Yamaguchi prestará depoimento. (ANSA)


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