Na decisão em que autorizou a Operação Fake Road – investigação sobre supostas fraudes em licitações de obras do DNOCS -, o ministro do Supremo Tribunal Federal, Flávio Dino, apontou a existência de um ‘processo endêmico de corrupção e desvio’. O esquema teria sido financiado por emendas parlamentares patrocinadas pelo deputado federal Robério Monteiro (PDT-CE), segundo a Polícia Federal.
A reportagem do Estadão pediu manifestação do deputado Robério Monteiro. O espaço está aberto.
A mando do ministro, a PF apura suspeitas de superfaturamento em municípios cearenses onde o deputado mantém laços familiares, além de obras não executadas e contratos usados para desviar mais de R$ 22 milhões em recursos públicos.
‘Ao que tudo indica, estamos diante de um cenário robusto de favorecimentos espúrios, potencialmente vinculado a um processo mais endêmico de corrupção e desvio’, assinalou o ministro no documento de 37 páginas, ao qual o Estadão teve acesso.
A Operação Fake Road foi deflagrada na sexta, 28. O parlamentar não foi alvo de buscas, mas seu nome é predominante na decisão de Flávio Dino.
O ministro indica ‘ausência de transparência concreta do uso das emendas parlamentares e na destinação de recursos públicos’. Para ele, o cenário é uma ‘peculiaridade’ do ‘famigerado orçamento secreto’, revelado pelo Estadão em 2021.
As investigações começaram após auditorias da Controladoria-Geral da União apontarem indícios de superfaturamento, execução parcial ou inexistente de serviços, medições fraudulentas e favorecimento de empresas contratadas.
A análise se concentrou em dois contratos públicos firmados em Itarema e Aracaú, ambas no litoral cearense, cidades administradas por familiares do deputado, e encontrou irregularidades em contratos de pavimentação do Departamento Nacional de Obras Contra a Seca (DNOCS) financiados com emendas destinadas por Robério.
A CGU identificou o superfaturamento de R$ 6.845.360,17 nos dois contratos firmados entre o poder público, na figura do DNOCS, e a empresa Construmaster, que teve mais de R$ 20 milhões em bens bloqueados por decisão de Dino.
‘Suplementarmente, é de se registrar a existência de indícios substanciais de que o deputado federal Robério Monteiro tenha participado, pelo menos, do processo de desvio, notadamente a partir dos indícios de beneficiamento político a partir do direcionamento dos recursos encaminhados via emenda de comissão’, sintetiza a decisão.
O ministro do Supremo, que critica reiteradamente a falta de transparência das emendas, assinala que ‘as fraudes executadas foram inteiramente orquestradas, justamente almejando angariar lucratividade espúria a partir da fraude contratual’.
‘O aparente cruzamento de demandas financeiras e de serviços escancara a forma pouco clara e transparente pela qual são destinadas e utilizadas as emendas parlamentares’, crava o ministro.
Anexado à decisão de Dino, o parecer da CGU calcula um superfaturamento de R$ 11.006.043,20, correspondente a 46,27% do valor medido em um dos contratos suspeitos.
No segundo contrato, investigados teriam embolsado R$ 2.501.097,77, cerca de 31% a mais do que o previsto.
‘Foram identificados pagamentos por serviços não executados, como pavimentação de vias inexistentes, placas de obras e projetos executivos não entregues’, detalha o ministro, que também criticou a ‘atuação insatisfatória’ do DNOCS ao aprovar os contratos ‘sem a devida verificação documental e técnica’.
A decisão ainda ressalta a forma ‘escrachada’ – nas palavras do ministro – de como o uso de fotos falsas era recorrente no expediente criminoso para comprovar a realização das obras.
‘A utilização de imagens de outros locais ou manipuladas para simular a execução de serviços é uma grave irregularidade que compromete a transparência e a confiabilidade do processo de fiscalização. Mais do que isso: comprova, de maneira irretorquível, que a empresa contratada fraudou a execução do contrato ora analisado, dolosamente’, conclui o ministro.
COM A PALAVRA, O DEPUTADO ROBÉRIO MONTEIRO
O Estadão pediu manifestação do deputado. O espaço está aberto.
COM A PALAVRA, OS DEMAIS CITADOS
A reportagem pediu manifestação da Construmaster e do DNOCS. O espaço está aberto.