A ciência normalmente é feita de descobertas que pouco a pouco adicionam conhecimento sobre um mesmo tema. Algumas vezes, no entanto, os achados apresentam conclusões tão surpreendentes que servem para mudar de forma significativa as ideias concebidas até então. Na semana passada, uma dessas informações veio a público. E transformará para sempre a maneira pela qual o cérebro deve ser compreendido. Em um artigo publicado na prestigiada revista científica Nature, um time de pesquisadores coordenados por cientistas do Trinity College, em Dublin, na Irlanda, anunciou que duas doenças distintas – a esquizofrenia e a Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) – possuem a mesma raiz genética. São diferentes, mas iguais.

No estudo, foi analisado o DNA de 13 mil pacientes com ELA e o de 30 mil com esquizofrenia. Constatou-se que 14% dos genes associados a ambas as doenças são os mesmos. Como explicar que enfermidades com manifestações tão diversas compartilhem a mesma origem? A esquizofrenia é uma doença psiquiátrica. Apresenta-se na adolescência ou no início da idade adulta e tem entre seus principais sintomas delírios (o paciente acha que está sendo perseguido, por exemplo), alucinações (ouve vozes, entre elas) e tem ideias desconexas. A ELA é uma enfermidade neurológica. Degenerativa, ataca progressivamente os neurônios motores, levando à perda da força muscular e à incapacidade de executar movimentos.

UMA COISA SÓ Líder do trabalho, Orla defende que o cérebro seja tratado como um todo
UMA COISA SÓ Líder do trabalho, Orla defende que o cérebro seja tratado como um todo

A resposta ao questionamento principal dos cientistas força a uma mudança radical. “A divisão entre o que é neurológico e psiquiátrico é artificial”, disse à ISTOÉ Orla Hardiman, coordenadora do trabalho. “Precisamos quebrar essa barreira e entender que se deve estudar e tratar o cérebro como um todo.”

Na prática, a informação obriga os médicos a não mais dissociarem totalmente as doenças. O primeiro impacto é na prevenção, tanto das neurológicas quanto das mentais. “Deveremos ficar mais alertas para a história familiar e à manifestação de sintomas”, afirma o neurologista José Luiz Pedroso, da Escola Paulista de Medicina e coordenador do Departamento Científico de Neurogenética da Academia Brasileira de Neurologia. Depois, ao tratamento. “Passaremos a ter mais atenção com sinais físicos que possam estar associados à manifestações mentais”, diz a psiquiatra Carmita Abdo, presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria.

PONTOS COMUNS

O QUE É CADA DOENÇA
A Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) é uma doença neurológica caracterizada pela degeneração progressiva dos neurônios motores. Leva à perda de força muscular e dificuldade para executar movimentos. A esquizofrenia é uma enfermidade psiquiátrica caracterizada por distúrbios no comportamento social

O QUE FOI DESCOBERTO
A análise do perfil genético de 13 mil pacientes com ELA e 30 mil com esquizofrenia revelou que 14% dos genes associados a ambas as doenças são os mesmos

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IMPACTO FUTURO
A informação muda a forma pela qual doenças psiquiátricas e neurológicas são compreendidas atualmente. Em vez de manifestações distintas, poderão ser analisadas como sintomas diferentes decorrentes do mesmo erro genético
O entendimento será usado para a criação de novas maneiras de prevenção de um e de outro gênero de doença e de tratamentos que tenham como base a correção das alterações no DNA


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