Em meio ao pavor que se alastrou entre os americanos após o colapso do Silicon Valley Bank (SVB) e do Signature Bank, respectivamente segunda e terceira maiores falências de bancos nos EUA depois do Washington Mutual em 2008, Joe Biden não perdeu tempo. Em resposta à convulsão que se instalou no sistema financeiro na semana passada, com saques bancários que atingiram US$ 42 bilhões em um dia apenas no SVB, conhecido como o banco das startups, o presidente correu ao Twitter no domingo à noite, dia 12, para dizer que havia chegado a uma solução para proteger os clientes dessas instituições. E no dia seguinte pela manhã se apresentou à imprensa na Casa Branca para falar que o acesso ao dinheiro estava garantido a todos, incluindo aqueles com mais de US$ 250 mil aplicados — o teto segurado pelos bancos. “Seus depósitos estarão lá quando vocês precisarem”, assegurou Biden. Para isso, US$ 25 bilhões do Tesouro foram reservados como lastro de novos planos anunciados pelo Federal Reserve, o banco central dos EUA, onde os bancos buscam empréstimos em emergências.

US$ 42 bilhões foi o montante retirado por clientes do SVB em um dia

O bilionário Peter Thiel, extremista de direita e cofundador do PayPal, é apontado como pivô da debandada dos clientes, com a propagação via Twitter de que seu Founder’s Fund, de capital de risco, havia passado por problemas em negociações com o SVB e por fim sacado seu dinheiro em cash. A corrida pelos saques se deu para valer quando o próprio banco informou, na quarta-feira, 8, a venda de US$ 21 bilhões em títulos de renda fixa, com prejuízo de US$ 1,8 bilhão. As ações do banco caíram 86% em dois dias.

Depois do enorme volume de saques e transferências online que se seguiram no fim de semana, Joe Biden não pagou para ver, ao contrário de George W. Bush, que na crise da bolha imobiliária de 2008 se recusou a socorrer instituições privadas com dinheiro público, repassando o caos para as Bolsas de todo o mundo, com consequências que reverberam até hoje nos EUA.

Mesmo com a palavra de Biden sobre a solidez e a segurança dos sistemas financeiro e bancário do país, somada às medidas que se tornaram a mais extensa intervenção do governo federal no sistema bancário desde 2008, a desconfiança campeou. E de cara já foram vistas consequências no setor de inovação dos EUA, escorado em financiamentos do SVB. Muitas startups, de tecnologia e biotecnologia, em sua maioria voltadas ao controle das mudanças climáticas, tinham dinheiro aportado há anos pelo banco da Califórnia. O temor maior era que a corrida de clientes a outros bancos, com o preço das ações despencando, estendesse as quebras a outras instituições, como o PacWest Bank e o First Republic (que viram suas ações caírem 25% e 17%) e mesmo o JPMorgan, maior banco dos EUA (queda de 5,4%). Na última quarta-feira, foi a vez das ações do Credit Suisse derreterem. Essa instabilidade com a segunda maior instituição financeira suíça deixou os mercados globais receosos de uma contaminação sistêmica.

“Nosso sistema bancário é sólido. Seus depósitos estão seguros”  Joe Biden, presidente dos EUA (Crédito:Anna Moneymaker)

Na esteira do choque nos EUA, agências reguladoras de outros países entraram em campo rapidamente, para salvaguardar investidores, como no Reino Unido, que teve 200 startups em risco. O Tesouro e o Banco da Inglaterra optaram por facilitar a venda de uma subsidiária do SVB em Londres, pelo preço simbólico de uma libra esterlina, para o HSBC, maior banco da Europa, que protegeu depósitos de 6,7 bilhões de libras (US$ 8,1 bilhões).

Em jogo, as eleições

Com o caos, quase ficou de lado o anúncio do orçamento de US$ 6,9 trilhões, anunciado por Biden, dos quais 12% vão para duas agências públicas de saúde — para maiores de 65 anos e para os mais carentes sociais, e a pauta dos 25% de taxação dos super-ricos, bem vista pelo movimento “Nós somos os 99%” (em referência ao 1% que detém a maior parte da riqueza americana).

Para Roberto Goulart Menezes, do Instituto de Relações Internacionais da UnB, Biden se volta para políticas públicas importantes, até impostas pela pandemia (e por isso é chamado de comunista pelos extremistas). Consegue ganho junto aos eleitores e ainda coloca contra a parede os republicanos, que não têm como se manifestar contra a população. No entanto, esses adversários, com maioria no Senado, podem até engolir a passagem de benefícios, como observa o professor, mas o troco deverá ser barrando qualquer proposta de quebra no teto de gastos, o que corrói a popularidade de qualquer presidente.

Problema que ficou até pequeno diante do risco no sistema financeiro, que trouxe de volta o fantasma da recessão global de 2008.