Mensagens e arquivos obtidos a partir da quebra de sigilo dos telefones e e-mails dos investigados na Operação Trapiche indicam que brasileiros estavam sendo recrutados pelo Hezbollah, grupo paramilitar xiita do Líbano, para ações terroristas no Brasil.

Após analisar o relatório do material, a juíza Raquel Vasconcelos Alves de Lima, da 2.ª Vara Federal Criminal de Belo Horizonte, afirmou que os elementos reunidos até o momento pelos investigadores confirmaram a existência de uma “rede de terrorismo em estado embrionário”.

O sírio naturalizado brasileiro Mohammad Khir Adbulmajid, dono de tabacarias em Belo Horizonte, é apontado como o elo entre o Hezbollah e os brasileiros. O nome dele foi colocado na lista de difusão vermelha – mais procurados – da Interpol. Segundo investigadores, Mohammad estaria no Líbano. O braço-direito dele seria o libanês naturalizado brasileiro Haissam Housin Diab.

O modus operandi do grupo foi descrito pelo Ministério Público Federal (MPF) em uma representação enviada à Justiça. O documento narra que Mohammad e Haissam eram responsáveis por cooptar brasileiros, preferencialmente homens que tivessem antecedentes criminais. Os “candidatos” eram enviados para o Líbano, onde passavam por “entrevistas” com lideranças do Hezbollah. A organização custeava passagens, diárias em hotéis de luxo e todos os outros gastos durante a estadia. Também distribuía presentes, como relógios de luxo.

“Durante a entrevista, o referido ‘chefe’ da organização indagava os potenciais recrutas sobre suas vidas pessoais, questões políticas, e os questionava se seriam capazes de ‘matar e sequestrar’ a mando da organização. Ocasionalmente também pediam referências de outros brasileiros com antecedentes criminais capazes de ‘matar por dinheiro’”, escreve o MPF.

A Polícia Federal ouviu quatro brasileiros que viajaram para o Líbano. Os depoimentos são semelhantes: eles narraram aos investigadores que viajaram acreditando que teriam oportunidades de negócio, mas sem saber mais detalhes sobre as propostas. Dois deles relataram que foram levados do hotel por homens armados em carros com cortinas para a entrevista. A conversa era intermediada por um homem que falava espanhol e fazia a tradução. Depois, eram orientados a tirar fotos em locais turísticos simular que estavam no Líbano a passeio.

Prisão

Nesta semana, a Justiça Federal mandou soltar o técnico em plásticos Jean Carlos de Souza e o músico Michael Messias. Eles estavam presos temporariamente, mas na avaliação dos investigadores e da juíza do caso “não oferecem perigo à investigação ou à sociedade”.

O autônomo Lucas Passos Lima, que também foi preso na Operação Trapiche, teve a prisão temporária convertida em preventiva, que não tem prazo para terminar. Ele foi preso no aeroporto de Guarulhos, quando voltava do Líbano.

A perícia no celular de Lucas indica que ele teria monitorado sinagogas em Brasília e em Goiás para possíveis ataques terroristas. O autônomo também estaria fazendo aulas de tiro, segundo a investigação, e teria tentado cooptar um piloto de avião. O Estadão entrou em contato com a defesa dele e aguarda resposta.