Consta que Deus realmente se empenhou em ser brasileiro, mas desistiu quando constatou quantos incompetentes, irresponsáveis e desmiolados fazem parte de nossas elites políticas, econômicas, sindicais, empresariais, clericais etc. Não quis emprestar seu prestígio a um País de tal forma obcecado pelo fracasso.

De fato, em 2018, a economia brasileira logrou o portento de crescer 1,1%. Isso mesmo: 1,1 por cento. Cifra que sequer arranha a massa de mais de doze milhões de desempregados. Nossa renda por habitante é de uma cruel mediocridade, algo em torno de onze mil e quinhentos dólares anuais. Se operarmos o milagre de fazê-la crescer 3% ao ano, levaremos 23 anos — uma geração inteira — para atingir o modesto nível atualmente desfrutado por Portugal. Mesmo conhecendo esses números, uma parte substancial das elites a que me referi resiste com unhas e dentes a reformar o País.

Outro dia, li que uma ilustre doutora em economia contestava a necessidade de reformar a Previdência devido à estrutura demográfica brasileira. Ora, sabemos todos que a chamada transição demográfica — a passagem de um padrão de alta natalidade e alta mortalidade para um de baixa natalidade e baixa mortalidade — ocorreu no Brasil em um período de cerca de 40 anos, um terço do tempo que se verificou na França, por exemplo. Ou seja, de agora em diante, se o tempo de trabalho para se aposentar não for substancialmente aumentado, teremos um número decrescente de jovens trabalhando para assegurar a aposentadoria de uma quantidade enorme de aposentados precoces.

Com um seríssimo agravante: a parcela decrescente de jovens incumbida de sustentar os aposentados precoces terá um nível de escolaridade e qualificação baixíssimo, diria mesmo catastrófico, para enfrentar os novos desafios do mundo do trabalho. A maioria deles estará condenada a empregos ruins e mal remunerados. Será uma catástrofe para ninguém botar defeito.

Mas ainda tem mais. Esse País que estamos delineando já começa a se configurar. Será uma realidade escancarada dentro de quinze ou vinte anos. A desigualdade social será pior que a atual. O conflito entre grupos e camadas sociais, mais acirrado do que nunca. A indiferença de cada um pelo destino coletivo, o culto à amoralidade, à criminalidade e a tudo mais que meu leitor quiser imaginar, provavelmente estarão em franca ascensão. Convenhamos, pois: Deus tinha razão.

Sem reforma na Previdência, a desigualdade social será pior que a atual. Os conflitos, mais acirrados que nunca. Culpa das elites