Na cidade síria de Khan Sheikhun, vítima de um letal “ataque químico”, a população ainda chora seus mortos, enquanto manifesta esperança de que os ataques americanos deem uma lição a seu inimigo, o presidente Bashar al-Assad.

“Que Deus abençoe Trump!”, grita, diante do jornalista da AFP, Abu Ali, um morador dessa localidade, onde 86 pessoas morreram, entre elas 30 crianças, no suposto ataque químico da última terça-feira (4).

Três dias depois da tragédia, os habitantes ainda têm dificuldade para falar sobre o que aconteceu, as famílias continuam recebendo condolências de visitantes, e as ruas seguem com pouco movimento.

“Ainda estamos sob choque”, afirma um morador, com enorme tristeza, pensando nas crianças tomadas por convulsões, ou que foram encontradas mortas em casa, ou nas ruas.

Algumas horas depois da primeira ação militar americana contra o governo de Damasco desde o início do conflito sírio, Abu Ali comemora os ataques dos Estados Unidos. A ofensiva teve como alvo uma base militar de onde teria decolado – segundo os americanos – o avião que teria lançado substâncias químicas sobre Khan Sheikhun.

“É um alerta claro a Bashar al-Assad: chega de assassinatos e de injustiça!”, acrescenta ele, esperando que Al-Assad, Irã e Rússia vejam nesse episódio um “sinal” sobre a “mudança do equilíbrio de forças”.

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‘Onde estão os americanos’

Abu Muhib, um desertor do Exército, de 37 anos, quer que o governo americano vá ainda mais longe.

“É preciso punir o criminoso, e não o instrumento do crime”, alegou.

Para ele, os ataques ordenados por Donald Trump após o “ataque químico” atribuído ao governo sírio “não faz justiça aos parentes dos mártires, são apenas uma consolação”.

Como muitos habitantes, Hajj Kassar, um comerciante local, espera que não se trate apenas de uma “reação” ao drama de Khan Sheikhun.

“Trata-se de vingar os mártires caídos aqui (…) os bebês, as mulheres mortas enquanto dormiam, as pessoas andando nas ruas, aqueles que buscaram abrigo, onde a morte lhes alcançou”, completou.

Nesse momento, um avião militar sobrevoa a área.

“Onde estão os americanos? Olha a Força Aérea nos ameaçando de novo”, aponta, enquanto a aeronave bombardeia uma estrada ao norte da cidade, sem deixar vítimas.

O conflito na Síria começou há seis anos, com manifestações pacíficas contra o governo. Duramente reprimidas por Damasco, transformaram-se em rebelião armada. Desde então, já são mais de 320 mil mortos e milhões de deslocados.

Ao longo dos últimos meses, as tropas do governo infligiram uma série de derrotas aos insurgentes. Nos territórios rebeldes, os ataques americanos desta madrugada parecem ter trazido a esperança de volta a seus habitantes.

“Somos agradecidos à Força Aérea americana por ter respondido ao massacre de Khan Sheikhun”, afirmou Ali al-Khaled, que mora no bairro atingido pelo suposto ataque de gás tóxico.


Segundo o Observatório Sírio dos Direitos Humanos (OSDH), o ataque de Khan Sheikhun é o segundo dessa natureza desde o de 2013, no qual mais de 1.400 pessoas morrera, na região rebelde da Ghuta Oriental, perto de Damasco.

Na época, o governo de Barack Obama disse estar pronto a atacar o Exército de Al-Assad, mas a ação militar acabou sendo descartada.

‘Insuficiente’

Em Duma, principal cidade da Ghuta, os moradores celebraram o ataque dos Estados Unidos, mas pedem mais intervenção.

“Não queremos um único ataque, para que, depois, os crimes continuem”, disse à AFP Abu Shahid, de 30 anos.

“É necessário um meio de dissuasão mais importante. Não acho que [os ataques] sejam suficientes”, completou.

Alguns querem que Washington impeça os aviões sírios de sobrevoarem a região.

“Na realidade, os sírios querem uma zona de exclusão aérea”, comenta Hassan Taqiddin, de 27.

“Porque, no fim das contas, esses ataques têm um efeito limitado. Eles atacam um aeroporto e, então, o quê?”, desabafou.

Em Khan Sheikhun, Abu Ali recorda que “uma parte do povo sírio fugiu do país, outra está enterrada, e outra está em busca de ajuda humanitária”.

“Não queremos comida. Queremos exatamente que [Donald] Trump e seu governo ponham fim a essa farsa”, frisou.


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