08/03/2019 - 9:30
Certa vez perguntaram a Albert Einstein se ele andava com um bloquinho e uma caneta para anotar suas ideias.
Einstein estranhou a pergunta.
– Na verdade, só tive uma ideia na vida — respondeu.
Uma única boa ideia ao longo de uma existência, afinal, é uma enorme conquista.
Já tive milhares de ideias. Nenhuma delas foi boa.
Pior, minha inveja de quem é cheio delas e tem a autoconfiança necessária para levá-las a cabo se expressa na forma de críticas e previsões absolutamente equivocadas.
Quando conheci o Instagram, fui taxativo:
– Besteira. Vão fotografar o quê? O prato do almoço? Ora, por favor, que bobagem.
Deu no que deu.
A primeira vez que ouvi o rumor que Trump seria candidato ao mais alto cargo dos Estados Unidos, dei uma boa gargalhada.
Que o sujeito era arrogante e egocêntrico já sabíamos, mas imaginar que teria apoio para se eleger, que conseguiria seduzir os eleitores, que driblaria o labirinto das convenções, aí já era demais.
– Besteira. Não ganha nem com reza brava. — profetizei.
Deu no que deu.
Veio o presidente Messias. Assisti ao anúncio de sua candidatura com descrença pueril.
– Besteira. Era só o que faltava esse sujeito achar que pode ser presidente.
Deu no que deu.
A verdade é que o mundo tem provado que não entendo patavinas de nada.
De aplicativo ao presidente, os projetos e as intenções que me soam mais absurdos têm se provado consistentemente aceitáveis, factíveis e realizáveis.
Agora me aparecem com a teoria da terra plana.
Quando assisti pela primeira vez um maluco no YouTube explicando que o planeta não é esférico, reagi como sempre:
– Besteira.
Mas o tempo vai passando e mais gente vai aderindo.
Uns deputados do Mato Grosso chegaram a homenagear um “cientista” brasileiro que alegou ter comprovado a teoria.
Todavia, acreditar na terra plana não é o mesmo que apostar numa ideia qualquer, dessas que surgem por aí.
É desacreditar da física e da gravidade. É negar técnicas de navegação que diariamente levam milhares de aeronaves de um ponto ao outro do planeta. É não aceitar o funcionamento básico dos GPS, das ondas eletromagnéticas e do celular.
Por isso, essa semana assisti a um documentário do Discovery Channel dedicado a comprovar que a terra é redonda. A que ponto chegamos.
Os ignorantes não sabem que não sabem de nada, por isso se cobrem de toda a razão.
E como são maioria, quando assumem o poder impõem sua negação do conhecimento como verdade absoluta.
Essa ignorância hegemônica se espalha.
Líderes se elegem apoiados pelas mais primitivas crenças e, em nome da democracia, dão voz e poder ao mais vil obscurantismo. Com isso, conchavos e decisões são apoiados não mais em má-fé, mas em burrice.
A terra plana de Brasília expõe uma lamentável salada de técnicos competentes e ignorantes funcionais.
Como um vírus adaptável, vamos nos acostumando com decisões primárias evidentemente equivocadas. São escolhas que misturam religião com política, conservadorismo arraigado e argumentos fracos impostos por grupos poderosos.
Por isso, é emblemática a triste decisão do ministro da Justiça ao voltar atrás em sua indicação de Ilona Szabó de Carvalho para uma vaga na suplência do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária.
A ignorância, com poder, forma e deforma nosso futuro. Dá no que dá.
Ignorantes no poder impõem a negação do conhecimento como verdade absoluta. Na terra plana de Brasília, política e religião se misturam, enquanto nos acostumamos com decisões primárias equivocadas