Cidade portuária vive situação humanitária catastrófica, sitiada por tropas russas. Zelenski acusa russos de sequestrarem membros de comboio humanitário. Veja os principais destaques desta terça-feira sobre o conflito.A situação em Mariupol e em outras cidades ucranianas se deteriorou ainda mais nesta terça-feira (22/03), 27º dia da guerra na Ucrânia. O dia também foi marcado pelo apelo do presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, para que o papa Francisco medie o conflito com a Rússia e pela homenagem da Alemanha a um sobrevivente do Holocausto morto em um bombardeio russo na Ucrânia.

Nesta terça-feira, após semanas de bombardeios pelas forças russas, Zelenski disse, em discurso ao Parlamento italiano, que “não resta mais nada” da cidade portuária de Mariupol, no sul do país. Ele voltou a apelar à Rússia que permita a saída de dezenas de milhares de pessoas que ainda permanecem na cidade.

Enquanto Zelenski discursava, autoridades ucranianas disseram que a Rússia lançou duas grandes bombas em Mariupol. A cidade está cercada por tropas russas há vários dias, que também impedem a saída de civis e a chegada de ajuda humanitária. As pessoas estão sem água, energia, telefone e comida. Vários derretem neve para terem o que beber. Diversas tentativas de corredores humanitários foram frustradas, com Rússia e Ucrânia se culpando mutuamente.

Mariupol foi palco de cenas avassaladoras da guerra, como um bombardeio a uma maternidade e a um teatro onde estavam abrigadas centenas de pessoas.

De acordo com a ONG Human Rights Watch, mais de 200 mil pessoas estão presas na cidade. O jornal britânico The Guardian noticiou que a ONG descreveu a situação na cidade como uma “paisagem infernal congelante repleta de cadáveres e prédios destruídos”.

Zelenski acusou tropas russas de bombardearem uma rota de fuga de Mariupol. Quatro crianças ficaram feridas, disse o presidente ucraniano em uma mensagem de vídeo. O bombardeio ocorreu na região de Zaporínjia, destino de muitos moradores de Mariupol em busca de segurança.

Comboio sequestrado

À noite, Kiev informou que separatistas pró-Rússia prenderam um comboio de ajuda que se dirigia a Mariupol. Combatentes da autoproclamada República Popular de Donetsk fizeram vários funcionários da defesa civil ucraniana reféns em Manhush, 10 quilômetros a oeste de Mariupol, informou a vice-primeira-ministra Iryna Vereschuk. A informação não pôde ser verificada de forma independente pela DW.

As pessoas feitas reféns dirigiam ônibus nos quais civis deveriam ser retirados de Mariupol, disse Vereshchuk. A rota de fuga havia sido acordada com a Cruz Vermelha Internacional.

Segundo Zelenski, apesar de todas as dificuldades, mais de sete mil pessoas foram retiradas de Mariupol nesta terça-feira. “Nossos representantes estão tentando organizar corredores humanitários nas regiões de Kiev, Kharkiv, Zaporínjiaa e Luhansk”, disse Zelenski.

O secretário-geral da ONU, António Guterres, denunciou o conflito como “absurdo”. “Mesmo que Mariupol caia, a Ucrânia não pode ser conquistada cidade por cidade, rua por rua, casa por casa”, disse Guterres.

Ele acrescentou que “o único resultado” é “mais sofrimento, mais destruição e mais horror até onde os olhos podem ver”.

Segundo fontes ucranianas, além de Mariupol, o exército russo atacou várias cidades do país nesta terça, incluindo Kiev, Kharkiv, Odessa e Mykolaiv.

Situação crítica em Kherson

Além de Mariupol, a cidade de Kherson também está vivendo uma tragédia humanitária. O Ministério das Relações Exteriores da Ucrânia disse que 300 mil pessoas em Kherson, ocupada pela Rússia, estão ficando sem comida e suprimentos médicos. Kiev também afirmou que a Rússia está impedindo a retirada de civis para locais seguros.

“Os 300 mil cidadãos de Kherson enfrentam uma catástrofe humanitária devido ao bloqueio do exército russo”, disse o porta-voz Oleg Nikolenko.

Por outro lado, os militares ucranianos disseram que suas tropas expulsaram as forças russas de Makariv, cerca de 60 quilômetros a oeste de Kiev.

A cidade estrategicamente importante foi palco de uma batalha feroz e sofreu danos significativos de bombardeios russos, disse o Ministério da Defesa ucraniano, acrescentando que sua recaptura impede que as forças russas cerquem a capital pelo noroeste.

“A bandeira da Ucrânia foi hasteada sobre a cidade de Makariv”, escreveu o ministério em um post no Facebook. A DW não pôde confirmar a alegação das forças da Ucrânia.

O Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos informou que que 953 pessoas foram mortas, entre elas 78 crianças, e 1.557 ficaram feridas desde o início da invasão russa na Ucrânia.

Por sua vez, a agência de refugiados da ONU disse que mais de 3,3 milhões de refugiados ucranianos chegaram a países vizinhos desde o começa da ofensiva russa, em 24 de fevereiro. A grande maioria, mais de 2 milhões, cruzou a fronteira para a Polônia, disse a Agência das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR).

Telefonema com o Papa

Zelenski, afirmou nesta terça-feira que, em telefonema com o papa Francisco, “falou com Sua Santidade sobre a difícil situação humanitária e o bloqueio dos corredores de resgate pelas tropas russas”, bem como sobre a resistência do povo ucraniano, “que se tornou exército quando viu o mal”.

“O papel mediador da Santa Sé para pôr um fim ao sofrimento humano seria bem-vindo. Agradeci-lhe por suas orações pela paz e pela Ucrânia”, escreveu Zelenski no Twitter após a ligação.

Francisco, por sua vez, declarou ao presidente ucraniano que está “rezando e fazendo todo o possível para acabar com a guerra”, escreveu no Twitter o embaixador ucraniano na Santa Sé, Andrii Yuash.

Discurso ao Parlamento italiano

Zelenski também falou nesta terça ao Parlamento italiano. Aos legisladores, ele cobrou maiores sanções e pressões à Rússia e alertou que a guerra é o caminho do presidente russo, Vladimir Putin, para chegar à Europa.

“A invasão já dura 27 dias, um mês, e precisamos de outras sanções e outras pressões para que a Rússia não possa se abastecer de reservas militares na Líbia ou Síria, e para que volte à paz”, afirmou Zelenski, que foi recebido de pé e com muitos aplausos por cerca de mil parlamentares italianos.

O presidente ucraniano ainda advertiu que o objetivo da Rússia é “influenciar a Europa” e “destruir seus valores, sua democracia e seus direitos humanos”. “A Ucrânia é a porta para o exército russo, porque querem entrar na Europa”, completou.

Zelenski também afirmou que o exército russo tomou as regiões costeiras, o que “representa um perigo para todos os países vizinhos”. Ele ponderou ainda que, com a exportação de gás e petróleo da Rússia, a guerra foi financiada nos últimos dez anos.

O líder ucraniano ainda agradeceu à Itália pelo acolhimento de mais de 70 mil ucranianos que chegaram ao país fugindo da guerra, entre os quais 25 mil crianças.

Tentativa de assassinato de Zelenski

A mídia ucraniana noticiou nesta terça-feira que a contra-inteligência do país impediu um possível atentado contra a vida de Zelenski.

A agência de notícias Unian informou que um homem pertencente a um grupo de sabotadores russos foi preso em Uzhhorod, no extremo oeste do país. O grupo de até 25 homens planejava fingir ser membro das forças armadas ucranianas em uma tentativa de chegar a Kiev.

Alemanha lembra sobrevivente do Holocausto morto na Ucrânia

O Bundestag (Parlamento alemão) prestou homenagem nesta terça-feira a Boris Romanchenko, um sobrevivente do Holocausto e de quatro campos de concentração nazistas morto em sua cidade natal de Kharkiv, na Ucrânia, por um bombardeio russo.

O ministro alemão das Finanças, Christian Linder, disse que o destino de Romanchenko, morto aos 96 anos, “mostra tanto o caráter criminoso da política russa como o motivo de a Alemanha estar demonstrando solidariedade à Ucrânia”.

Nascido em 1926 em uma aldeia próxima à cidade ucraniana de Sumy, Romanchenko foi feito prisioneiro pelos nazistas em 1941, quando o exército alemão lançou sua ofensiva contra a União Soviética.

Ele foi deportado para Dortmund, no oeste da Alemanha, para executar trabalhos forçados, e sobreviveu aos campos de concentração de Buchenwald, Peenemünde, Mittelbau-Dora e Bergen-Belsen. Ele relatou ter sido libertado por forças britânicas e americanas em 1945, pouco antes de seus algozes executarem um plano para envenenar muitos dos prisioneiros restantes.

Após a guerra, ele se dedicou a manter viva a memória das atrocidades nazistas, e desempenhava um papel ativo em instituições

Macron conversa com Putin

O presidente francês, Emmanuel Macron, e o presidente russo, Vladimir Putin, conversar por cerca de uma hora pelo telefone e discutiram um possível cessar-fogo, mas nenhum acordo foi alcançado.

Macron continua “convencido da necessidade de continuar seus esforços” em busco da paz, informou o Palácio do Eliseu. Macron também conversou com Zelenski nesta terça-feira.

Insegurança alimentar

O ministro da Agricultura da Ucrânia, Roman Leshchenko, disse que espera que a área de cultivo de primavera da Ucrânia possa ser reduzida pela metade este ano para apenas 7 milhões de hectares, o que poderia contribuir para a insegurança alimentar mundial.

A invasão da Ucrânia pela Rússia resultará em uma colheita reduzida neste outono europeu e os efeitos em cascata serão sentidos nas exportações até o próximo ano.

le (ots)