O coronavírus poupou a fauna e a flora. Essa seria uma excelente notícia de 2020 — afinal, o vírus é fatal somente para a espécie humana. Entretanto, queimadas foram para as florestas brasileiras uma verdadeira pandemia. Os principais biomas viram-se à beira de um colapso, o Pantanal e a Amazônia sofreram dias e noites de inferno. O meio ambiente foi assassinado: dois milhões e quinhentos mil hectares do Pantanal acabaram queimados em trinta dias, com mais de dez mil focos de fogo que fizeram da maior planície alagada do mundo um incêndio em proporções jamais vistas. A catástrofe aconteceu em outubro, quando o vice-presidente Hamilton Mourão criticou injustamente o conceituado Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe): “Alguém lá de dentro faz oposição ao governo. Quando o dado é negativo o cara divulga, quando é positivo, não divulga”. O mundo olhava com desesperança para o Brasil. E o governo injetava o negacionismo na população. Enquanto isso, as matas seguiam em chamas.

A falta de interesse dos governantes pelo desastre ambiental fez-se clara no imobilismo. O trabalho de voluntários e brigadistas tornou-se fundamental para que o fogo não destruísse tudo, ainda que tenha destruído muito. Animais que só podem viver no Pantanal ficaram a um passo da extinção, a exemplo de onças-pintadas e araras-azuis. Na linha de frente dessa guerra estava, entre outros, a médica veterinária do Grupo de Resgate de Animais em Desastres (GRAD), Carla Sassi. “O cenário é desolador. Um deserto cinza em muitos pontos”, declarou ela.

Muito embora as queimadas no Pantanal tenham sido para diversas nações a gota d’água na criminosa política anti-ambental do País, a resposta internacional ao descaso do governo com a preservação da fauna e flora começou em meados de setembro, quando o movimento “Defund Bolsonaro” (Desfinanciando Bolsonaro) ganhou corpo. Antes de o fogo atingir o Pantanal, a maior floresta tropical do mundo também entrou em chamas. O mês de agosto fez-se para a Amazônia o pior desde 1998: mais de vinte e nove mil focos de incêndios foram encontrados na região. A Amazônia ficou — e está — no risco de não se manter como floresta tropical: caso a mata queime mais 30%, a natural regeneração já não será possível e, então, ela irá se transformar em uma savana. Uma pandemia, que não a do coronavírus, matou em grandes proporções as matas brasileiras. O vírus dessa tal pandemia chama-se descaso e irresponsabilidade do governo federal, combinação que excluiu o Brasil da Conferência do Clima, da ONU, em 2021.

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