28/05/2024 - 7:31
Em 2023, o desmatamento no Brasil caiu. Na conta que considera todos os biomas nacionais – Amazônia, Cerrado, Mata Atlântica, Caatinga, Pampa e Pantanal – a redução foi de 11,6%. O cálculo faz parte do Relatório Anual do Desmatamento no Brasil (RAD), lançado nesta terça-feira (28/05) pelo Mapbiomas.
Isso não significa que o cenário seja positivo em todo o país. Enquanto o corte da Floresta Amazônica despencou 62,2% no ano passado, o do Cerrado disparou e, pela primeira vez, liderou o ranking da destruição. Foram 11,1 mil quilômetros quadrados perdidos deste bioma, o que representa 61% do total.
Desde que o RAD começou a ser compilado, em 2019, é a primeira vez que o desmatamento da vegetação nativa teve uma reversão de tendência, destaca Tasso Azevedo, coordenador da iniciativa. Mas a velocidade da destruição do Cerrado observada no ano passado preocupa.
“O desmatamento no Cerrado foi duas vezes e meia maior que o observado na Amazônia em 2023. Se você pensar que ele ocupa metade da área comparada à da Amazônia, proporcionalmente, é como se o Cerrado estivesse desaparecendo cinco vezes mais rápido”, afirma à DW Azevedo,
Em todo o Brasil, menos de 1% das propriedades rurais devidamente registradas no Cadastro Ambiental Rural (CAR) teve indício de desmatamento em 2023. Mas elas fazem um grande estrago: são responsáveis por 89% da área de vegetação suprimida no país.
O epicentro do desmatamento
Outro registro capturado pelo relatório é a frente de destruição que avança pelo Matopiba. A região, acrônimo para os estados de Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, é a fronteira agrícola em rápida expansão e respondeu por quase metade (47%) de toda perda de vegetação.
“É a primeira vez que um estado fora do bioma amazônico lidera o ranking do desmatamento. O Maranhão, embora tenha uma pequena área de Floresta Amazônica, é principalmente coberto por Cerrado”, comenta Azevedo.
De 2022 para 2023, o Maranhão saiu da quinta posição para a liderança entre os estados, com um aumento de 95,1% do corte de vegetação. A maior parte, 87% dos casos, não foi autorizada pelos órgãos ambientais responsáveis.
O estado do Piauí, por outro lado, foi o único do Matopiba a registrar queda de um ano para o outro. Segundo especialistas ouvidos pela DW, a explicação pode estar na nova política estadual de prevenção e combate ao desmatamento ilegal. Uma lei estadual obriga proprietários rurais a manterem 30% da vegetação de Cerrado como reserva legal, acima dos 20% estabelecidos pelo Código Florestal.
Mudança de foco
O aumento da fiscalização na Amazônia em 2023, promessa de campanha do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, é a principal causa apontada para a queda do corte de floresta. A retomada do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm), criado em 2004 e abandonado pelo governo de Jair Bolsonaro, prevê ainda em sua nova fase o incentivo a atividades produtivas sustentáveis e o ordenamento fundiário e territorial.
Uma das hipóteses é que a maior vigilância sobre a Amazônia pode ter empurrado a indústria ilegal para o Cerrado. “Desmatar custa caro. E como estamos neste momento de maior restrição na Amazônia, quem financia o desmatamento pode ter mudado o foco para o Cerrado”, analisa Azevedo.
Uma outra possível explicação para o cenário é a nova regulamentação ambiental europeia. Aprovada em abril último, a lei proíbe a importação de produtos vindos de áreas com desmatamento identificado até dezembro de 2020. A regra, que passa a valer no fim do ano, tem um outro componente: os produtores que desejam exportar para a União Europeia terão que estar de acordo com a legislação nacional.
Segundo o RAD, pelo menos 208 mil eventos de desmatamento aconteceram no Brasil após dezembro de 2020 totalizando 49 mil km2 – uma área maior que a da Bélgica, onde fica a sede do Parlamento Europeu. Se a regulamentação for levada ao pé da letra, 230 mil propriedades rurais brasileiras estariam impedidas de vender seus produtos ao bloco.
Caatinga e Pantanal
Na Caatinga, o desmatamento subiu 43,3% em 2023 em relação ao ano anterior. Um dado que chama a atenção é que cerca de 4 mil campos de futebol foram desmatados no bioma para a implantação de usinas de energias renováveis – eólica ou solar.
“No caso da energia eólica, há uma certa rigidez quanto ao local de sua implementação, que depende da existência de ventos. Mas para energia solar não tem desculpa, não dá para entender como alguém pode financiar um projeto de energia renovável, verde, limpa, com desmatamento”, critica Azevedo.
Em 2023 o Pantanal registrou um aumento de 59,2% no desmatamento em relação a 2022. A quase totalidade (99%) da destruição se deu dentro de áreas privadas registradas no CAR e principalmente na cidade de Corumbá (MS).
Os eventos extremos de seca no bioma são apontados como um dos vetores do desmatamento. Como uma área maior não tem sido mais alagada, terras do Pantanal têm sido convertidas em pasto plantado. Nos últimos 30 anos, o bioma perdeu 60% da cobertura de água.
“O desmatamento de florestas e savanas para a formação de pastagem exótica acontece em grande escala. A preservação dessas áreas florestadas e o manejo das pastagens são fundamentais para a manutenção da biodiversidade de fauna e flora, em conjunto com os sistemas tradicionais de pecuária do Pantanal”‘, explica Eduardo Rosa, coordenador da equipe do Pantanal do MapBiomas.