O programa do governo federal para a renegociação de dívidas (Desenrola) começará a valer a partir desta segunda-feira (17), e irá “limpar” o nome de 1.5 milhão de brasileiros com o crédito negativado por inadimplência de até 100 reais.

A medida é pra lá de positiva – e necessária! Mas não pode ser mero paliativo para uma situação caótica que se tornou, há muitos anos, uma componente perversa da economia brasileira. Hoje, são cerca de 70 milhões de consumidores com os nomes “sujos”.

O ciclo é conhecido: salário baixo, crédito restrito e caro, bens e serviços inacessíveis para compra e pagamento à vista, parcelamento, crise financeira (inflação e desemprego), juros extorsivos por atraso e… inadimplência.

A demanda é tão reprimida, sobretudo por bens duráveis (geladeira, fogão, TV, celular etc.), que, ao menor sinal de recuperação econômica e a mínima sobra no orçamento, a população busca o crediário e satisfaz a necessidade imediata de consumo.

Porém, como nossa economia é cíclica e frágil, desequilíbrios constantes e sucessivos no Brasil (eleições, impeachment, câmbio, commodities) e no mundo (guerras, pandemia, juros) abalam a capacidade de pagamento das dívidas contraídas.

Os governos Lula e o primeiro mandato da ex-presidente Dilma Rousseff foram generosos no estímulo e concessão de crédito aos mais pobres, justamente o estrato social mais carente de bens e serviços. Mas o que parecia benéfico se mostrou catastrófico.

O triênio mais recessivo da nossa história, durante o fim do primeiro mandato de Dilma e os dois anos seguintes, ceifou milhões de empregos, elevou a inflação às alturas e promoveu forte alta nos juros. Resultado: milhões de inadimplentes.

A breve recuperação no governo Temer teve o fim decretado, nessa ordem, pela sanha antidemocrática de Jair Bolsonaro, a pandemia do novo coronavírus, a invasão da Ucrânia pela Rússia e as eleições de 2022, em meio a ameaças explícitas de golpe de Estado.

Se antes, a população mais pobre estava alijada do mercado consumidor, ao menos tinha o “nome limpo”. Nos últimos 20 anos, dadas as razões acima, consumiu, se endividou, não quitou os débitos e se tornou, novamente, alijada do mercado de consumo.

É exatamente tal ciclo perverso que o País precisa evitar. O programa Desenrola não pode ser o começo, o meio e o fim para estes 1.5 milhão de velhos novos consumidores. Precisa ser a porta de entrada para uma nova vida, onde emprego e renda permitam o consumo sustentável.