Deputado do PT usa votação popular para escolher escolas para destinar verbas

deputado Maurici
Deputado estadual Maurici (PT-SP) Foto: Reprodução/Alesp

O deputado estadual por São Paulo Maurici (PT) realizou uma votação popular nas redes sociais para destinar R$ 400 mil de verbas públicas a instituições de ensino. O prazo para escolher as escolas, ETECs ou institutos federais se encerrou no dia 1º de outubro e o resultado final ainda não foi divulgado.

A consulta popular começou em 18 de setembro, quando o parlamentar publicou em seu perfil no Instagram: “Votação aberta! Chegou a hora de você decidir o destino de R$ 400 mil! Vote na escola (e Instituto Federal) de sua preferência até o dia 30 de setembro, às 23h59”.

Logo abaixo, Maurici estabeleceu algumas condições para a validação do voto. A maior controvérsia fica pela exigência dos votantes seguirem os perfis do presidente do diretório estadual do PT de São Paulo, deputado federal Kiko Celeguim, e do vereador Hélio Rodrigues (PT-SP).

Na publicação, o deputado acrescentou: “Comente o número da sua escola (e do seu Instituto Federal) na publicação oficial. Também é possível votar via WhatsApp. Dica: cada pessoa pode votar duas vezes: Instagram + WhatsApp = mais força para a sua escola (e IF)! Boa sorte!”.

Em 29 de setembro, o parlamentar divulgou o segundo balanço parcial da votação e informou que a participação popular havia sido estendida até 1º de outubro. No post, as instituições que lideravam a votação eram: o Instituto Federal de São Paulo – Campus Barretos, com 1.015 votos no total; a Escola Estadual Francisco de Assis Gonçalves, com 539 votos; e a ETEC de Esportes – Curt Walter Otto Baumgart, com 223 votos.

  • O levantamento parcial mostrou que a maioria dos votos se concentrou no WhatsApp, visto que não havia a exigência do Instagram de seguir os três perfis.

Segundo a plataforma ‘Not Just Analytics’, o perfil do deputado teve aumento de seguidores após a primeira publicação sobre a votação pública, passando 27.122, em 18 de setembro, para 34.416, em 2 de outubro.

Desvio de finalidade?

Em entrevista à IstoÉ, o advogado e coordenador da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (ABRADEP), Kaleo Dornaika Guaraty, explicou que a iniciativa de pedir à população que decida sobre a destinação de verbas públicas não é um problema. Na verdade, ele considera a prática positiva, pois aumenta a transparência e a participação da sociedade.

Para o especialista, no entanto, condicionar a validade do voto a seguir os três perfis caracteriza promoção pessoal. Ele também ressaltou que isso não configura propaganda eleitoral antecipada, já que a legislação eleitoral exige menção explícita ou implícita a voto para que a propaganda seja considerada extemporânea. O cargo de deputado estadual só estará em disputa nas eleições de 2026.

“O ponto mais delicado é o seguinte: o deputado está usando um instrumento legítimo do mandato — a destinação de verbas — para gerar engajamento em redes sociais. Isso pode caracterizar um desvio de finalidade do cargo e, em ano eleitoral, a conduta poderia até ser questionada como abuso de poder político e abuso dos meios de comunicação social”, pontuou Guaraty.

O advogado destacou que, no âmbito eleitoral, uma Ação de Investigação Judicial Eleitoral poderia ser aberta após denúncia do Ministério Público ou de algum partido político. Se comprovado o abuso, a consequência pode ser a cassação do mandato e a inelegibilidade por oito anos.

Bruno Rangel Avelino, advogado especialista em Direito Eleitoral e também membro da ABRADEP, concordou que a exigência pode indicar promoção pessoal com uso de recursos público, violando assim o artigo 37, parágrafo 1ª,  da Constituição Federal de 1988 que estabelece que a publicidade de atos públicos “deve ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, e não pode conter nomes, símbolos ou imagens que caracterizem a promoção de autoridades ou servidores públicos”.

“Não podemos afirmar que há afronta à legislação eleitoral. Nesse caso pode haver ilícito administrativo. No ano do pleito de 2026, podemos olhar para trás e observar se as publicações tiveram a intenção de converter seguidores em eleitores”, afirmou.

Fabio Andrade, doutor em Administração Pública e Governo e professor de Relações Internacionais da ESPM entende que a condição pode ser vista como uma “tentativa de engajamento forçado”, o que pode acabar afastando o público.

“No longo prazo, essa iniciativa poderia ser positiva, pois seria a continuidade da construção de audiências públicas, só que no ambiente digital. Mas, infelizmente, não é nesse sentido que a prática está migrando”, avaliou.

Procurado pela reportagem, o deputado Maurici explicou que o Edital de Emendas Populares foi inspirado no Orçamento Participativo, uma iniciativa que visa ampliar o exercício da cidadania e discutir a destinação de verbas públicas.

Segundo o parlamentar, o modelo funciona assim: qualquer instituição pode inscrever seus projetos em uma plataforma digital, onde são analisados para garantir que atendem aos requisitos legais. Depois, é aberta a votação popular, e os projetos mais votados recebem as verbas.

Sobre a exigência de seguir os perfis, o deputado explicou que se trata de uma medida “técnica” para “criar uma barreira contra o uso de robôs na votação, inibindo fraudes”. Ele ressaltou ainda que é possível deixar de seguir as páginas logo após votar, “sem qualquer tipo de prejuízo”.

Por fim, Maurici informou que o design das publicações é feito pela equipe de comunicação do gabinete e que não há qualquer impulsionamento pago dos posts.