Depois dos 40: há muito potencial, mas não aproveitamos

Nosso ensino superior é etarista, assim como o mercado de trabalho. A consequência é um gigante capital humano inutilizado e subestimado. Quem perde é o desenvolvimento do país."A engrenagem da sociedade é a juventude." Quem nunca ouviu isso? O ensino superior público, do acesso à infraestrutura, é focado nos jovens. A consequência é um mercado de trabalho altamente etarista. Poderia aqui focar minha discussão num juízo de valor sobre o preconceito e etarismo, mas prefiro ser mais prático.

Já pararam para pensar na imensa quantidade de capital humano ocioso que essa resistência e cultura do culto à juventude proporcionam?

Dificuldade começa na inserção

Primeiramente, quero trazer a preocupação com aqueles com maior idade que chegam à graduação. Como será a inserção deles no mercado de trabalho? Noto que, no caso dessas pessoas, ficamos muito felizes por terem chegado à graduação e por serem nossos colegas de sala, mas os tratamos com muito preconceito e condescendência.

"Que bonitinho, voltou a estudar. Seus filhos devem estar muito orgulhosos." De alguma forma, entendemos que já é uma grande glória estar ali, mas internamente entendemos, e aceitamos, que não vai muito além disso. É como se apenas a aprendizagem bastasse, mas e o mercado de trabalho? E a remuneração? E a mobilidade social? Só serve para os jovens?

Esse preconceito se estende para o mercado de trabalho. Sejamos honestos ao analisar o seguinte cenário: dois currículos com a exata mesma formação na mesma universidade. A única diferença é a idade. Um tem 48 anos e o outro 24. Quem a empresa irá preferir?

E se estende para o pós inserção

Infelizmente, quem já está no mercado de trabalho não está livre. Hoje peguei um carro de aplicativo cujo motorista era um senhor de 71 anos. Dedicou mais de 40 anos à Receita Federal e agora, para não ficar parado, faz corridas por aplicativo. Consigo, e os convido para essa provocação, claramente o ver preterido ou subestimado em uma conversa sobre sua própria área. É como se todo seu conhecimento e experiência, simplesmente já não valessem mais por ele não ser mais jovem.

O mercado de trabalho, cruelmente, não apenas desvaloriza seus profissionais a partir de uma certa idade, como também subestima e invalida todo o conhecimento tácito e prático que adquiriram por anos. Tudo isso por puro etarismo. Poxa, que desperdício.

A consequência não é trivial

Aqui estamos diante de uma consequência real: milhões de indivíduos totalmente subestimados e inutilizados. Alguns nem têm a oportunidade de ingressar no mercado de trabalho. Outros são cruelmente tirados do jogo e jogados fora, e, junto com eles, toda a bagagem e conhecimento. Quem perde é o desenvolvimento do nosso país.

O que pode ser feito? Acredito que a solução passa por políticas dentro de dois eixos: mercado de trabalho e educação.

Quanto ao mercado de trabalho, há a necessidade de incentivo para as empresas contratem pessoas mais velhas e alguma política que aproveite a riquíssima experiência e bagagem desses indivíduos pós ciclo tradicional de carreira. Talvez alguma utilidade prática para eles junto às universidades com quem está no início da carreira e ainda em formação.

No entanto, também precisamos de políticas educacionais. Seria incrível a criação de uma verdadeira formação continuada à nível federal. Formação essa que visa formar o profissional em todas as etapas de sua carreira. Isso, além de os munir de capacitação, também servirá como uma sinalização para o próprio mercado de trabalho.

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Vozes da Educação é uma coluna semanal escrita por jovens do Salvaguarda, programa social de voluntários que auxiliam alunos da rede pública do Brasil a entrar na universidade. Revezam-se na autoria dos textos o fundador do programa, Vinícius De Andrade, e alunos auxiliados pelo Salvaguarda em todos os estados da federação. Siga o perfil do programa no Instagram em @salvaguarda1.

Este texto foi escrito por Vinícius De Andrade e reflete a opinião do autor, não necessariamente a da DW.